Comportamento homossexual é muito comum em macacos Rhesus e está associado a componentes genéticos

Figura 1. Dois macacos Rhesus investigados no estudo em comportamento de monta. Ref.1

Comportamento homossexual é observado em várias espécies de animais, tão diversos quanto insetos, répteis, aves, felinos, morcegos, cetáceos e primatas, e valor adaptativo tem sido apontado nesse traço comportamental (1). Em um estudo publicado esta semana no periódico Nature Ecology & Evolution (Ref.1), pesquisadores conduziram o primeiro estudo de longo prazo do comportamento homossexual de machos dentro de uma única espécie selvagem, no caso macacos Rhesus em uma colônia insular. Os resultados do estudo mostraram que >70% dos macacos analisados exibiam comportamento homossexual no habitat natural e com tal prática envolvendo potenciais benefícios sociais. Além disso, componentes genéticos mostraram estar envolvidos em variações do grau de atividade homossexual desses primatas. Somados com evidências até o momento acumuladas, o estudo sugere que o comportamento homossexual evoluiu e pode ser uma característica comum do sistema reprodutivo de primatas.

(1) Para mais informações: Homossexualidade é biológica ou social?

"Nós encontramos que a maioria dos machos eram bissexuais em termos comportamentais, e que variação na atividade homossexual era hereditária. Isso significa que o comportamento pode ter uma assinatura evolucionária: por exemplo, nós também encontramos que machos montando uns aos outros eram também mais prováveis de se apoiarem em conflitos - talvez esse pode ser um de vários benefícios sociais da atividade homossexual," disse o autor principal do estudo, Dr. Jackson Clive, do Imperial College London (Ref.2). "Nossa pesquisa, portanto, mostra que comportamentos homossexuais podem ser comuns entre animais e podem evoluir."

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No estudo, os pesquisadores analisaram 236 macacos Rhesus (Macaca mulatta) machos dentro de uma colônia de 1700 membros vivendo livres na ilha tropical de Cayo Santiago, Puerto Rico (Fig.2). Além de observar o comportamento desses primatas ao longo de três anos e conduzir análises genéticas, dados de genealogia de cada indivíduo na ilha foram também acessados (rastreados até o ano de 1938). Todos os comportamentos de 'monta' (posicionamento e ações de copulação, como observado na Fig.1) foram registrados para os 236 machos, tanto envolvendo macho-com-macho (monta homossexual) quanto macho-com-fêmea (monta heterossexual).

Figura 2. (A) Ilha de Cayo Santiago. (B) Alguns macacos Rhesus habitando a ilha e investigados no estudo. Ref.1-2

Os resultados das análises mostraram que a monta homossexual era muito prevalente: 72% dos machos engajavam com comportamento homossexual, em comparação com 46% engajando em montas heterossexuais. O achado derruba a crença de alguns de que comportamento homossexual nos animais vertebrados não-humanos é o resultado apenas de condições ambientais anômalas (ex.: escassez de fêmeas) - algo já demonstrado ser incorreto para vários animais, como morcegos, ovinos e outros primatas.

Existem múltiplas hipóteses evolutivas sobre comportamento e orientação homossexuais, incluindo ideias sobre estabelecimento de dominância nos grupos, escassez de parceiros sexuais do sexo oposto (incluindo flexibilidade sexual com fins adaptativos) (2), seleção neutra ou positiva de um traço ancestral de bissexualidade associado à transição evolucionária sexualidade-assexualidade (3) e redução de tensão seguindo agressão.

Para mais informações:

Investigando diferentes hipóteses evolutivas no contexto dos dados acumulados no estudo, os pesquisadores encontraram que o comportamento homossexual nos macacos Rhesus estava fortemente correlacionado com 'ligações coalizionárias'. Isso significa que pares de machos que regularmente engajavam em comportamento homossexual eram mais prováveis de apoiarem uns aos outros em conflitos, fornecendo vantagem de sobrevivência e talvez reprodutiva dentro do grupo.

De fato, nesse último ponto, os pesquisadores também encontraram que os machos engajando em comportamento homossexual estavam associados com um maior sucesso reprodutivo, potencialmente devido aos benefícios fornecidos por mais ligações coalizionárias. Nesse mesma linha, foi também encontrado que 6,4% do comportamento homossexual nos machos era geneticamente herdado, trazendo a primeira evidência genética para o comportamento homossexual em um primata não-humano (4). E, relevante apontar, esse valor é similar a outros comportamentos geneticamente herdados em primatas, como catação (remoção de parasitas na pelagem) e socialidade. Essa é mais uma forte evidência contrária à ideia popular de que o comportamento homossexual "desafia a natureza e a evolução biológica" (o assim chamado 'Paradoxo Darwiniano').

(4) Leitura recomendada: Genética pode explicar até 25% do comportamento homossexual, mas não existe um "gene gay"

Por fim, os pesquisadores encontraram correlação genética entre machos que eram mais frequentemente 'montadores' (ativos) ou 'montados' (passivos) quando engajavam em comportamentos homossexuais, sugerindo que essas variações comportamentais podem ter uma base biológica comum. O status de ativo ou de passivo não influenciava no status hierárquico dos indivíduos dentro do contexto social do grupo - apontando que hierarquia/dominância não é um fator importante para o comportamento homossexual entre os macacos Rhesus.

Somados os achados, fica fortemente sugerido que parte do comportamento homossexual pode evoluir de forma adaptativa e pode ser uma característica comum da ecologia reprodutiva dos primatas. Mais estudos de grande porte, genéticos e de longo prazo em outras espécies de primatas podem reforçar evidências prévias limitadas nesse mesmo sentido.

REFERÊNCIAS