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Células de gordura possuem memória de obesidade: epigenética parece explicar o "efeito ioiô", aponta estudo

Figura 1. Células adiposas humanas visualizadas através de microscopia eletrônica. 

 
Após prolongada redução no consumo calórico e drástico emagrecimento, seja por mudança nos hábitos alimentares seja por uso de fármacos ou cirurgia, um fenômeno comum e indesejado tende a acontecer: rápido reganho da massa adiposa. É, de fato, difícil para uma pessoa previamente obesa manter o corpo magro ou em um nível saudável. E um estudo recentemente publicado na Nature (Ref.1) pode ter encontrado parte da razão para esse fenômeno: mudanças epigenéticas "pró-gordura corporal" nas células adiposas do corpo, causadas pela obesidade, são estáveis e persistem após o emagrecimento. Essas mudanças no epigenoma alteram a atividade genética e fazem com que as células adiposas sejam incapazes de funcionar normalmente.


Os achados do estudo sugerem que pessoas tentando manter o emagrecimento corporal frequentemente irão requerer cuidados de longo prazo para evitar o reganho de massa adiposa. "Isso significa que você precisa de mais ajuda, potencialmente", disse em entrevista a bióloga e coautora do novo estudo, Laura Hinte, do Instituto Federal de Tecnologia (ETH) Zurich (Ref.2). "Não é sua culpa". 


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Atualmente, a prevalência global de sobrepeso e obesidade é de aproximadamente 39% (Ref.3). Obesidade e as comorbidades relacionadas representam significativos riscos à saúde, desde doenças metabólicas e cardiovasculares (1) até cânceres (2). Um objetivo clínico primário no tratamento da obesidade é alcançar apreciável perda de massa adiposa (emagrecimento), tipicamente através de intervenções na dieta e no estilo de vida, fármacos ou cirurgia bariátrica. Estratégias baseadas em mudanças comportamentais e alimentares frequentemente apenas resultam em emagrecimento de curto prazo e são suscetíveis ao famoso "efeito ioiô", no qual os indivíduos reganham a gordura corporal em excesso perdida ao longo do tempo - e geralmente de forma rápida. Além de fatores genéticos (3), esse padrão recorrente de "perda-reganho" pode ser parcialmente atribuível a uma memória metabólica (ou obesogênica) que persiste mesmo após notável emagrecimento.


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(3) De fato, existem diversos genes associados a funções e células no corpo ligados à predisposição à obesidade. No cérebro, as áreas afetadas controlam, por exemplo, o processamento de sinais associados ao trato gastrointestinal e a estímulos externos (ex.: visão ou cheiro de alimentos) que agem em conjunto para regular o comportamento alimentar e as reservas de energia. Mais de 1100 loci (locais genômicos) independentes associados com a obesidade já foram identificados, participando de caminhos metabólicos diversos e atuando com fatores ambientais no sentido de favorecer o acúmulo de gordura corporal. Diferenças genéticas ligadas aos receptores gustativos também têm sido ligadas ao desenvolvimento da obesidade. Defeitos genéticos, como observado nas Síndromes de Bardet-Biedl e de Prader-Willi, são outro importante fator contribuinte. Ref.4-7


Leitura complementar:


> Rápido reganho de gordura corporal também é observado em grande parte dos pacientes após uso de medicamentos como semaglutida. É um alerta para quem está pensando em investir caro nesses fármacos. Para mais informações: Ozempic [Semaglutida] é eficaz e seguro para o emagrecimento? 

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Evidências clínicas têm suportado a hipótese associada à memória obesogênica. Mudanças fenotípicas persistentes de estados metabólicos prévios já foram apontadas no tecido adiposo ou na fração vascular estromal de camundongos. Mudanças similares no sistema imune e em células endoteliais também têm sido apontadas. Essas mudanças parecem ser intermediadas por mecanismos e modificações epigenéticas, essenciais no desenvolvimento, diferenciação e manutenção da identidade de células adiposas (adipócitos). Alterações na cromatina e mudanças de metilação no DNA têm sido identificadas como aparentes contribuintes para a memória obesogênica. 


Leitura recomendada:


Epigenética são modificações no DNA que não mudam a sequência de DNA mas que podem afetar a atividade genética, ou compostos químicos que são adicionados a genes únicos (ex.: radicais metila) que podem regular suas atividades. Em outras palavras, o assim chamado epigenoma engloba fatores e processos moleculares ao redor do DNA que regulam a atividade genômica independentemente da sequência de DNA, e que são mitoticamente estáveis (persistem após divisões celulares). Fatores epigenéticos incluem metilação do DNA, modificações de histonas, mudanças na estrutura da cromatina e expressão de RNAs não-codificantes (ncRNA).


No novo estudo, pesquisadores resolveram explorar a hipótese da memória obesogênica através de sequenciamento de RNA de núcleo único (snRNA-seq) no tecido adiposo de indivíduos humanos vivendo com obesidade antes e depois de significativo emagrecimento - comparando-os também com um grupo de controle que nunca desenvolveram obesidade -, assim como de camundongos magros, obesos e ex-obesos.


Os resultados da análise em humanos mostraram que alguns genes estavam mais ativos nas células adiposas do grupo obeso do que no grupo de controle, enquanto outros genes estavam menos ativos. E, mesmo após cirurgia de redução de peso e grande emagrecimento ao longo de 2 anos, esse padrão diferenciado de atividade genética não mudou. Isso foi demonstrado também nos camundongos que passaram por intenso emagrecimento.


Tanto em humanos quanto em camundongos, os genes ativados durante o estado de obesidade estavam envolvidos em promover inflamação e fibrose, enquanto genes desativados estavam associados em manter o funcionamento normal e a identidade dos adipócitos. Análise de marcadores epigenéticos nos roedores mostraram que essas mudanças de atividade genética estavam, em especial, ligadas a modificações pós-transcricionais de histonas (hPTM). Mesmo meses após os camundongos obesos serem colocados sob rígida dieta de restrição calórica e passarem por intensa perda de massa adiposa, as mudanças no epigenoma dos adipócitos persistiram, como se essas células se lembrassem do corpo obeso. Camundongos carregando essa memória nos adipócitos mostravam acelerado reganho de gordura corporal e eram mais suscetíveis a desregulação nessas células quando expostos a uma dieta rica em gordura.


"As células adiposas lembram do estado de sobrepeso e podem retornar a esse estado mais facilmente", disse em entrevista Ferdinand von Meyenn, professor de nutrição e epigenética metabólica na ETH Zurich e um dos autores do novo estudo (Ref.8). "Isso significa que nós encontramos uma base molecular para o efeito ioiô".


Embora não forneçam prova final de causalidade, os achados do estudo apontaram uma forte relação entre memória obesogênica nos adipócitos e o efeito sistêmico ioiô de acelerado reganho de gordura corporal. E grande parte dessa memória parece ser determinada por mudanças estáveis no epigenoma. É incerto se outras células do corpo também são afetadas por essa memória obesogênica, como miofibrilas e neurônios. Além disso, estudos futuros são necessários para esclarecer por quanto tempo dura a memória obesogênica e se esse tipo de memória [com base epigenética] também afeta outras doenças, como transtornos de dependência química.


Adipócitos são células de longa vida no corpo. Na média, vivem por 10 anos antes de serem substituídas por novas células. Isso sugere que a memória obesogênica pode se estender por muito tempo, requerendo esforço extra de longo prazo do indivíduo para manter o emagrecimento. Isso também reforça a importância de evitar ficar obeso em primeiro lugar, especialmente na infância e na adolescência - um alerta em especial para os pais ou adultos responsáveis. Para voltar ao estado magro ou normal, tanto epigenética quanto genética parecem atuar como implacável resistência.


REFERÊNCIAS

  1. Hinte et al. (2024). Adipose tissue retains an epigenetic memory of obesity after weight loss. Nature. https://doi.org/10.1038/s41586-024-08165-7
  2. https://www.nature.com/articles/d41586-024-03614-9
  3. Welling et al. (2024). Treatment with liraglutide or naltrexone-bupropion in patients with genetic obesity: a real-world study. eClinicalMedicine, Volume 74, 102709. https://doi.org/10.1016/j.eclinm.2024.102709
  4. Vourdoumpa et al. (2023). The Genetic Basis of Childhood Obesity: A Systematic Review. Nutrients 15(6), 1416. https://doi.org/10.3390/nu15061416
  5. Won et al. (2024). Association of genetic risk, lifestyle, and their interaction with obesity and obesity-related morbidities. Cell Metabolism. https://doi.org/10.1016/j.cmet.2024.06.004
  6. https://www.frontiersin.org/journals/endocrinology/articles/10.3389/fendo.2023.1349582/full
  7. https://royalsocietypublishing.org/doi/full/10.1098/rstb.2022.0223
  8. https://ethz.ch/en/news-and-events/eth-news/news/2024/11/cause-of-the-yo-yo-effect-deciphered
Células de gordura possuem memória de obesidade: epigenética parece explicar o "efeito ioiô", aponta estudo Células de gordura possuem memória de obesidade: epigenética parece explicar o "efeito ioiô", aponta estudo Reviewed by Saber Atualizado on dezembro 06, 2024 Rating: 5

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