Enviar mensagens de texto com abreviações faz o mensageiro parecer insincero, concluiu estudo
Segundo os resultados de um estudo publicado no periódico Journal of Experimental Psychology: General (Ref.1), se você quer parecer mais sincero e receber mais atenção às suas mensagens, evite usar abreviações. Por exemplo, ao invés de escrever "vc" ou "pq" no texto, prefira "você" ou "por que". O estudo analisou um total de 5300 participantes através de vários métodos e oito experimentos. Ao longo desses experimentos, indivíduos que usavam abreviações textuais eram percebidos como menos sinceros e eram menos prováveis de receber respostas pelo fato de serem vistos como alguém empregando menos esforço na mensagem ou conversa.
"Nós ficamos surpresos ao descobrir que abreviações elicitavam percepções negativas sobre as pessoas que as usam," disse em entrevista o autor principal do novo estudo, David Fang, um pesquisador de marketing comportamental na Universidade de Stanford, EUA (Ref.2).
À medida que o mundo rapidamente adota tecnologias digitais, nossas interações sociais cada vez mais migram para o domínio digital. Nesse contexto, enviar mensagens de texto através de aplicativos e redes sociais diversas se tornou parte comum do cotidiano de grande parte da população ao redor do mundo nas últimas duas décadas, e a forma dominante de comunicação digital. Apenas nos EUA, é estimado que 1 trilhão de mensagens de texto foram enviadas em 2020. E, assim como outras modalidades de comunicação, a construção das mensagens de texto evoluiu ao longo do tempo, dando origem a um dialeto linguístico distinto caracterizado por abreviações textuais.
As abreviações textuais afetam palavras e frases (ex.: blz = beleza; plmdds = Pelo amor de Deus) e se tornaram parte comum da escrita no meio digital da maioria ou quase todas as pessoas durante conversações diárias em aplicativos como WhatsApp ou em comentários nas redes sociais. As abreviações podem ser usadas tanto para agilizar a escrita quanto por simples costume. E escolhas linguísticas - como seleção de palavras ou tom - durante comunicação podem influenciar sutilmente como outros percebem o comunicador.
Apesar da abreviação textual e da sua contraparte não-abreviada representarem termos semanticamente idênticos, a mudança estrutural associada pode levar os indivíduos a interpretar as mensagens de forma diferenciada (conscientemente ou inconscientemente). Nesse sentido, dois cenários hipotéticos emergem sobre os efeitos da abreviação textual:
- o uso de abreviação pode ser percebido como uma falta de esforço, impactando negativamente percepções interpessoais como predito pela teoria da troca social;
- alternativamente, o uso de abreviação pode promover maior senso de proximidade interpessoal, à medida que esse método casual espelha uma comunicação mais informal e "entre amigos", impactando positivamente avaliações interpessoais.
Buscando evidências que corroborassem ou rejeitassem essas hipóteses, os pesquisadores no novo estudo conduziram análises de réplicas em grupos do Discord, cenários de namoro, e de conversas de usuários do Tinder englobando 37 países. Outras análises experimentais incluíram participantes que avaliaram suas conversações textuais com pessoas usando abreviações e com pessoas que não usavam abreviações.
Os resultados mostraram, e de forma consistente, que pessoas usando abreviações em mensagens de texto recebiam respostas mais curtas ou menos respostas e eram menos prováveis de receber informação de contato dos receptores das mensagens. Enquanto pessoas mais jovens tendiam a usar abreviações textuais com mais frequência, esse grupo ainda assim não percebia esse recurso linguístico de forma positiva, apesar desse achado em particular ter se mostrado inconsistente em alguns experimentos. A aversão às abreviações variou com a idade, mas, no geral, não eram bem percebidas. Nenhuma evidência suportou a hipótese de que a abreviação aumenta o sentimento positivo de proximidade.
Os achados apontam que as pessoas, em geral, valorizam a qualidade conversacional independentemente do meio, preferindo mensagens que entregam conexão pessoal e também esforço de construção linguística.
Com base nos resultados do estudo, abreviações podem ser aceitáveis em certos contextos como mensagens rápidas e objetivas (ex.: lembretes, apontamentos) que visam economizar tempo, mas deveriam ser evitadas se a pessoa quer parecer mais sincera ou está buscando fortalecer laços sociais - como no começo de um relacionamento amoroso ou se existe interesse em fazer uma boa impressão (ex.: busca de emprego). Os autores do estudo inclusive sugeriram que abreviações textuais podem contribuir para solidão ao enfraquecer laços sociais ao longo do tempo caso as pessoas passem a receber respostas com menos frequência ou de forma menos positiva em certos contextos.
Interessante mencionar que as conclusões do estudo não se mostraram intuitivas para o público. Após as principais análises experimentais, os pesquisadores conduziram uma análise subsequente com questionário envolvendo 120 participantes. Do total de participantes, 99% reportaram que usavam abreviações textuais e 84% não acreditavam que outras pessoas se incomodariam com o uso dessas abreviações (80% acreditavam que seria algo tratado com indiferença e ~4% acreditavam que seria algo percebido como positivo).
Importante também ressaltar que o grupo principal de participantes analisados no estudo eram falantes da língua Inglesa, e, nesse sentido, existe a possibilidade dos achados não serem generalizáveis para outras linguagens ou culturas (ex.: falantes de línguas que não são derivadas do Latim). Além disso, o estudo focou especificamente em diálogos (conversas entre duas pessoas).
> A teoria da troca social é baseada na noção de que o relacionamento entre duas pessoas é criado através de um processo de análise custo-benefício, e, nesse sentido, é uma métrica determinando o quanto de esforço alguém investe em uma relação com outra pessoa e que não necessariamente depende de fatores emocionais. Ref.3
Leitura recomendada:
REFERÊNCIAS
- Fang et al. (2024). Shortcuts to Insincerity: Texting Abbreviations Seem Insincere and Not Worth Answering. Journal of Experimental Psychology: General. https://doi.org/10.1037/xge0001684
- https://www.apa.org/news/press/releases/2024/11/texting-abbreviations-insincere
- https://socialwork.tulane.edu/blog/social-exchange-theory/
