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Estudo traz evidência desafiando o conceito antropológico de "Homem caça, Mulher coleta"

- Atualizado no dia 16 de maio de 2024 -


Estudo publicado em 2023 na PLOS One (Ref.1) desafiou a narrativa do "Homem, o Caçador" como uma regra e questionou a existência de divisão de trabalho sexo-baseada em grupos de caçadores-humanos de humanos modernos (Homo sapiens). Pesquisadores encontraram que indivíduos do sexo feminino também caçam na maioria das sociedades modernas de caçadores-coletores analisadas.

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Atenção: Um estudo publicado recentemente no periódico Evolution and Human Behavior (Ref.3) contestou os achados e metodologias do estudo de 2023. Mais informações no final desta matéria (!).

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Analisando dados acumulados por etnógrafos e outros pesquisadores desde o início do século XIX, os autores do estudo encontraram que mulheres [sexo feminino] caçavam em ~80% das sociedades vivendo em um estilo de vida caçador-coletor (50 de 63 grupos na América, Eurásia, Austrália e Oceania). Os pesquisadores também descobriram diferenças de estratégia entre homens e mulheres. Por exemplo, entre o povo Agta, homens [sexo masculino] quase sempre carregavam arcos e flechas, enquanto algumas mulheres preferiam facas. Homens eram mais prováveis de conduzirem caças sozinhos ou em pares, enquanto mulheres geralmente caçavam em grupos e com cães. Apesar dessas diferenças, o estudo encontrou pouca evidência para regras rígidas relativas a divisões de tarefas (ex.: mulheres que quisessem caçar, caçavam).


O achado rejeita uma persistente ideia que durante a evolução humana sempre existiu uma clara divisão de tarefas entre os sexos ("homens caçam, mulheres coletam"). 


Com origem no início do século XX, essa ideia defende que "mulheres não podem caçar ou guerrear porque possuem bebês, menstruação [sangue de atraindo outros predadores], e uma natureza mais sedentária e menos agressiva". Segundo os autores do estudo, essa noção continua muito enraizada, mesmo com várias evidências contrárias acumuladas desde a década de 1970. Um estudo de 2019 (Ref.2), analisando imagens no Google resultantes para a busca "humanos pré-históricos", encontrou que 207 deles retratavam homens caçando, mas apenas 16 retratavam mulheres na mesma atividade.


Aliás, no novo estudo, os pesquisadores encontraram que bebês e crianças não eram empecilho para mulheres caçarem: mães carregavam os bebês ou deixavam estes com outros membros da comunidade; crianças mais velhas frequentemente acompanhavam caçadas, e ajudando na caça.


(!) MULHERES CAÇAM, ÀS VEZES...


Um recente estudo conduzido por um time internacional de especialistas em grupos de humanos [Homo sapiens] caçadores-coletores, e publicado no Evolution and Human Behavior (Ref.3), contestou a alegação no estudo de 2023 de que sociedades de caçadores-coletores não exibem ou possuem fracas divisões de trabalho entre os sexos masculino e feminino. Eles apontaram que abundante evidência empírica contradiz essas alegações e encontraram evidência de viés na seleção das amostras populacionais e outras numerosas falhas metodológicas. Por fim, eles alertaram para tentativas de revisionismo etnográfico que projeta relações Ocidentais modernas de trabalho em sociedades antigas e modernas de caçadores-coletores.


Por outro lado, os pesquisadores realçaram que a ideia de que existe uma rígida divisão de tarefas é errônea, visto que já é bem estabelecido na literatura acadêmica que indivíduos do sexo feminino da nossa espécie também ocasionalmente participam de caçadas em grupos de caçadores-coletores. Também concordaram com o fato de que, historicamente, existe ênfase excessiva de estudos nas atividades praticadas por homens nas sociedades de coletores-caçadores. Por fim, também condenaram o uso do conceito de "homem caçador" para alimentar misoginia e limitar o acesso de mulheres a oportunidades diversas de trabalho nas sociedades urbanas e industrializadas - ou seja, fora do contexto de grupos de caçadores-coletores.


Voltando às críticas ao paper de 2023, os autores do novo estudo reforçaram que um robusto corpo de evidências suporta que homens e mulheres realizam diferentes mas complementares contribuições de subsistência entre caçadores-coletores contemporâneos - algo provavelmente espelhando grande parte da nossa história evolutiva desde a emergência na África há cerca de 300 mil anos e fomentado por fatores ecológicos. Homens tendem a gastar a maior parte do tempo ativo caçando presas de médio a grande porte, mas frequentemente retornando de mãos vazias, enquanto mulheres passam a maior parte do tempo cuidando de crianças pequenas , coletando alimentos de origem vegetal e, às vezes, caçando pequenas presas de mais fácil captura.


Apesar dessa divisão de tarefas ser estável, ela não seria rigidamente determinística e variaria com o contexto cultural. Por exemplo, mulheres podem se tornar exímias caçadoras - especialmente com o uso de armas -, com reportes de participação de fêmeas em atividades de caça datando de séculos a milhares de anos atrás (1), assim como atividade regular de coleta e cuidados de filhos por parte dos homens (2). Porém, entre a maioria das populações de caçadores-coletores, mulheres caçam raramente e, às vezes, nunca participam desse tipo de atividade. 


Sugestão de leitura:


Os autores do novo estudo apontaram em especial que os pesquisadores do estudo de 2023 não deixaram claro os critérios para a escolha dos 63 grupos de caçadores-coletores contemporâneos para as análises, entre 391 grupos conhecidos, incorporando também pré-requisitos questionáveis e conflitantes no processo de escolha - implicando em provável viés de escolha e fraco conjunto de dados.


Outras falhas metodológicas críticas que tornariam o estudo impossível de ser replicado ou mesmo levado a sério foram realçadas. Por exemplo, apenas atividades de caça foram exploradas nas amostras, deixando de lado outras importantes atividades (ex.: coleta, processamento de alimentos, cuidado de crianças) muito comuns no dia-a-dia e com forte divisão sexo-baseada. Além disso, ao invés de analisarem a frequência e investimento de recursos nas caçadas conduzidas por mulheres, o estudo de 2023 apenas registrou a existência de qualquer número de eventos de caça para concluir que no grupo de caçadores-coletores em questão mulheres "participavam de atividades de caça".


> E afinal: mulheres participavam de guerras nas sociedades Nórdicas da Era Viking? Fica a sugestão de leitura: Vikings: A Era Subestimada da Sociedade Nórdica  


REFERÊNCIAS

  1. Anderson et al. (2023) The Myth of Man the Hunter: Women’s contribution to the hunt across ethnographic contexts. PLoS ONE 18(6): e0287101. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0287101
  2. Khorasani & Lee (2019). Women in Human Evolution Redux. Evaluating Evidence in Biological Anthropology The Strange and the Familiar , pp. 11-34. https://doi.org/10.1017/9781108569125.002
  3. Venkataraman et al. (2024). Female foragers sometimes hunt, yet gendered divisions of labor are real: a comment on Anderson et al. (2023) The Myth of Man the Hunter. Evolution and Human Behavior. https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2024.04.014

Estudo traz evidência desafiando o conceito antropológico de "Homem caça, Mulher coleta" Estudo traz evidência desafiando o conceito antropológico de "Homem caça, Mulher coleta" Reviewed by Saber Atualizado on julho 05, 2023 Rating: 5

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