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Estudo genômico revelou uma história de intensa mistura genética, violência e racismo no Brasil

Figura 1. O DNA da população brasileira é um grande mosaico marcado em especial por ancestralidade indígena, europeia e africana


Na média, os Brasileiros possuem aproximadamente:


- 59% de ancestralidade Europeia;

- 27% de ancestralidade Africana;

- e 13% de ancestralidade Indígena.


É o que revelou um recente, compreensivo e robusto estudo genômico publicado na Science (Ref.1).


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O estudo sequenciou e analisou o genoma de 2723 indivíduos saudáveis ao longo do Brasil, incluindo habitantes de centros urbanos, áreas rurais e comunidades ribeirinhas nas cinco regiões geográficas do país.

 

Figura 2. Diversidade genética do Brasil. O mapa mostra a predominância de ancestralidade em diferentes regiões do país, realçando também a grande e subestimada contribuição genética dos indígenas no DNA do brasileiro. Ref.1

Além do padrão de ancestralidade - determinado através de marcadores genéticos específicos -, os pesquisadores encontraram mais de 8,7 milhões de variantes genéticas antes desconhecidas e únicas dos brasileiros! Mais de 36 mil dessas variantes foram consideradas "potencialmente deletérias" e possivelmente atuantes em várias doenças. Sinais de seleção natural em alguns genes ligados à fertilidade, imunidade e metabolismo também foram identificados (1).


Com uma população que ultrapassa 212 milhões de habitantes, o Brasil ao longo da história sofreu uma dramática redução no número de indígenas, é marcado pela chegada forçada de pelo menos 5 milhões de Africanos durante o tráfico de escravos entre as décadas de 1540 e de 1860, e testemunhou a imigração de ~5 milhões de europeus entre os séculos XV e XX - incluindo colonizadores. Mais recentemente na história brasileira, imigrantes da Ásia e do Oriente Médio foram adicionados. 


Analisando os padrões de fluxo genético ao longo dos últimos 250 anos, o novo estudo mostrou que a mistura genética entre diferentes grupos no Brasil alcançou seu pico entre os séculos XVIII e XIX. 


Esse período de pico - particularmente entre 1750 e 1875 - foi marcado por importantes eventos demográficos no Brasil. Primeiro, a Corrida do Ouro (1690-1750) intensificou de forma abrupta a migração portuguesa para o Brasil a um ponto que o reino de Portugal restringiu o acesso livre de portugueses ao território brasileiro. Seguindo a descoberta de ouro, o interior do país sofreu uma grande expansão urbana ao longo do século XVIII como resultado da alta taxa migratória. Nesse mesmo período, mercenários Bandeirantes exploraram regiões do Brasil afastadas dos centros urbanos na busca por ouro e pedras preciosas, e também visando capturar e escravizar indígenas; isso resultou no extermínio e migração forçada de milhares de nativos, e na expansão das fronteiras no sentido oeste além dos limites estabelecidos pelo Tratado de Tordesilhas (1494).


Ainda no período de pico, a família real portuguesa fugiu para o Brasil em 1808, como resultado das Guerras Napoleônicas (2) e a invasão de Portugal, estabelecendo o Rio de Janeiro como a capital do Império Português, o qual contribuiu para uma expansão do tráfico de escravos. Dessa época até a abolição da escravidão no país, mais de 2 milhões de africanos escravizados foram trazidos ao território brasileiro para trabalhar nas plantações, marcando o pico do tráfico Atlântico de escravos no Brasil, e em acordo com os resultados genômicos do novo estudo.


Combinações únicas de genomas africanos foram também reveladas no estudo. Isso porque grupos de diferentes regiões subcontinentais na África - especialmente do leste e do oeste no continente, mas também do sul e do norte - só parecem ter se misturado no Brasil, mantendo isolamento prévio no continente africano.


À medida que esses dois grupos estrangeiros (africanos e europeus) cresciam no país, o número de indivíduos entre os povos originários caiu dramaticamente como resultado de exposição a novas doenças, conflitos violentos e migração forçada - e continuou caindo desde então. Os Tupis eram o grupo predominante na Costa Atlântica e no nordeste do Brasil antes da invasão europeia. Essas regiões eram também onde os colonizadores e os africanos escravizados se concentravam, especialmente durante o período inicial de colonização. Portanto, é plausível que os eventos de fluxo genético entre indígenas, europeus e africanos envolveram primariamente os nativos Tupis.


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> Povos originários brasileiros são os indígenas ou nativos que habitavam o país antes da chegada dos portugueses. 


> A população indígena do território brasileiro chegou a somar mais de 10 milhões de pessoas falantes de >1000 línguas. Esse total foi reduzido entre 83% no interior do país e 98% na costa Atlântica.


> Existem hoje 56 línguas ou dialetos europeus oficialmente em uso no Brasil, com o Alemão sendo a segunda língua mais falada (após o Português), somando 3 milhões de falantes em 2022. Existem também 274 línguas indígenas. Para mais informações: Aprender novas línguas vai além da carreira profissional: Pode otimizar o cérebro e prevenir doenças neurodegenerativas 

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A população brasileira como um todo passou por um declínio no tamanho efetivo populacional (Ne) - para uma definição do conceito, acesse a Ref.3 - após o início do período de colonização e para todas as ancestralidades. Segundo os pesquisadores, isso provavelmente está relacionado ao efeito de gargalo (bottleneck) causado pelo extermínio de populações indígenas e ao efeito fundador produzido pela migração de colonizadores europeus e africanos escravizados trazidos ao Brasil - ambos processos de deriva genética (4). Em geral, e com exceção do estado do Amazonas, o Ne começou a aumentar há aproximadamente 294 anos, indicando que o tamanho e a diversidade genética dessas populações têm se expandido desde então. Esse período coincide com o início do ciclo de exploração de diamantes no Brasil, seguido pelo ciclo do ouro. Esses eventos começaram com um massivo influxo de portugueses ao Brasil e intensificou o tráfico de africanos escravizados em mais de 10x. 


Durante o período imperial (1822-1889), o governo brasileiro implementou políticas encorajando imigração, particularmente do norte europeu para o sul e sudeste do Brasil. Entre outras razões, o objetivo era tornar o país "mais branco" e prevenir que a população preta continuasse predominante ou crescente no país. Aliás, existe evidência história de que a população preta [afro] e seus descendentes já formavam maioria (~62%) da população brasileira no final do século XVIII, concentrados na região sudeste. Após a abolição da escravidão, o plano governamental racista solucionaria também o "problema social" de reconhecer pretos e mulatos como cidadãos assalariados - considerados humanos menos civilizados pelos europeus (Ref.4). Essa tentativa de "clareamento" - e associada elevação no fluxo genético europeu - também mostrou estar espelhada na história genética do país.


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> É estimado que, entre 1880 e 1930, ~4 milhões de imigrantes europeus, com origem predominantemente da Itália, Espanha, Alemão e Portugal, entraram no Brasil.


> O pico de mistura genética também coincidiu com um período de aumento das revoltas sociais, incluindo várias disputas políticas e de terra (ex: Guerra dos Farrapos, entre 1835 e 1845; e Guerra do Paraguai, de 1864 a 1870), conflitos internos (ex.: Guerra Guaranítica em 1756; e Revolta dos Malê em 1835), junto com desastres climáticos severos, como a Grande Seca de 1877-1878. Esses eventos tiveram um grande impacto na estrutura demográfica do Brasil, resultando em deslocamentos de larga escala ao longo de regiões e considerável número de mortes.

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Além disso, os pesquisadores encontram evidência de provável coerção sexual por homens europeus contra mulheres nativas e de descendência africana durante o período colonial, entre os séculos XVI e XIX: 71% dos cromossomos Y, passados pelo sexo masculino, eram de origem europeia, enquanto a maior parte do DNA mitocondrial, passado pelo sexo feminino (3), mostrou ser derivado de indivíduos de hereditariedade africana (42%) ou indígena (35%). A maioria dos colonizadores europeus eram homens, especialmente na América Latina, e a colonização foi marcada por uma história de intensa violência, provavelmente levando a uma taxa elevada de morte entre homens indígenas e africanos junto com violência sexual contra mulheres desses grupos.


No geral, a maior parte da contribuição de ancestralidade europeia mostrou ter origem de populações no sul da Europa. No entanto, indivíduos do Rio Grande do Sul mostraram ter uma ancestralidade mais relacionada às populações no norte da Europa. Esses resultados do estudo são consistentes com registros históricos sugerindo que imigração ao Brasil teve origem predominante de Portugal e da Itália, e também ao fato de que estados no sul do país receberam imigrantes da Alemanha e do norte da Itália durante o final do século XIX e início do século XX.


Portanto, populações brasileiras historicamente foram formadas por múltiplos ou contínuos eventos de mistura genética entre nativos americanos, africanos e europeus, um mosaico global de genomas. Isso reforça que o Brasil é um dos países geneticamente mais diversos do planeta e aquele com maior mistura genética.


> O padrão revelado de ancestralidade Brasileira é notavelmente distinto daquele observado em outros países da América Latina. Na Cidade do México, por exemplo, um estudo estimou que a população possuía ancestralidade 66% indígena, 31% europeia e 3% africana (Ref.2).


> O novo estudo foi liderado pela geneticista populacional Tábita Hünemeier, da Universidade de São Paulo (USP). 


> O estudo é parte de um projeto multimilionário - e financiado pelos Ministérios da Ciência e da Saúde do Brasil - que pretende sequenciar o genoma completo de 100 mil brasileiros antes de 2030 para avanços na medicina aqui do país.


Leitura recomendada:


REFERÊNCIAS

  1. Nunes et al. (2025). Admixture’s impact on Brazilian population evolution and health. Science, Vol. 388, No. 6748. https://doi.org/10.1126/science.adl3564
  2. https://www.science.org/content/article/massive-dna-sequencing-effort-reveals-how-colonization-shaped-brazil-s-genetic
  3. Waples, R. S. (2022). "What Is Ne, Anyway?". Journal of Heredity, Volume 113, Issue 4, Pages 371–379. https://doi.org/10.1093/jhered/esac023
  4. https://library.fes.de/libalt/journals/swetsfulltext/12558053.pdf
  5. https://bndigital.bn.gov.br/dossies/povos-originarios/indios-indigenas-e-povos-originarios/
  6. https://www.ibge.gov.br/

Estudo genômico revelou uma história de intensa mistura genética, violência e racismo no Brasil Estudo genômico revelou uma história de intensa mistura genética, violência e racismo no Brasil Reviewed by Saber Atualizado on maio 16, 2025 Rating: 5

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