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Animais nas savanas Africanas sentem mais medo da presença humana do que de leões, revela estudo

Figura 1. Imagem de um registro em vídeo mostrando um elefante próximo de uma fonte de água e sendo exposto a sons de humanos. Ref.2


- Atualizado no dia 21 de junho de 2024 -


Leões (Panthera leo) são comumente percebidos como os predadores terrestres mais temidos na África, matando e inspirando medo (respostas comportamentais anti-predatórias) em grande parte da fauna Africana desde elefantes até pequenos antílopes (1). Outros grandes carnívoros e mesocarnívoros também são percebidos com grande temor em ecossistemas diversos. Porém, apesar de humanos modernos (Homo sapiens) não serem comumente percebidos como predadores, somos também "máquinas de matar" e em um nível muito maior do que qualquer outro predador no planeta devido ao uso de tecnologia letal e à nossa ecologia única. Humanos têm sido inclusive caracterizados como "super predadores" (2). Aliás, como predadores, humanos e leões têm sido há muito tempo competidores diretos, e a caça excessiva promovida por nossa espécie inclusive tem contribuído para significativos declínios populacionais desses felinos. A pergunta que fica: dada a extrema letalidade da humanidade, somos menos temidos por outros animais do que leões e outros grandes predadores?


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(1) Esse medo possui importantes impactos ecológicos, alterando taxas de crescimento populacional e causando cascatas tróficas. Por exemplo, a presença [medo, intimidação] de predadores de grande porte no ambiente freia a ação de predadores de menor porte que são também potenciais presas, impedindo que esses últimos [intimidados] saiam devorando tudo que encontram pelo caminho.


(2) Relevante apontar que humanos (Homo) são considerados animais carnívoros, e isso inclui a nossa espécie (H. sapiens). Entenda: Humanos foram hipercarnívoros durante a maior parte da nossa linhagem evolutiva 

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Em um estudo de 2016, publicado no periódico Behavioral Ecology (Ref.1), pesquisadores haviam mostrado que predadores de pequeno porte, como texugos,  guaxinins e raposas, percebem humanos como predadores muito mais perigosos do que outros típicos predadores de grande porte. Especificamente, no estudo experimental, a exposição de texugos (espécie Meles meles) no ambiente natural a sons de humanos mostrou ter um efeito intimidatório muito maior do que os sons de ursos (espécie Ursus arctos), lobos (espécie Canis lupus) e cães (Canis familiaris). Enquanto ouvir ursos e cães mostrou algum efeito de medo, a simples percepção de humanos conversando, ou lendo passagens de livros, prevenia a maior parte dos texugos analisados de se alimentarem, e dramaticamente reduzia o tempo gasto para alimentação por aqueles texugos corajosos o suficiente para entrar no ambiente inundado com a voz de humanos (Fig.2).


Figura 2. Texugo-europeu (M. meles) intimidado pela voz humana. Em ambientes selvagens dominados pela influência humana e onde taxas de predação por humanos são muito maiores do que outras espécies de grandes predadores, nossa espécie é muito mais temida. Ref.1

Agora, o mesmo grupo de pesquisa do estudo de 2016 (Zanette et al.) mostrou que humanos são também muito mais temidos pela fauna na savana Sul-Africana do que leões. No estudo, publicado no periódico Current Biology (Ref.2), eles analisaram animais no Parque Nacional de Greater Kruger, na África do Sul, uma das principais áreas protegidas no países e com uma das maiores populações remanescentes de leões. Apesar de protegida, caça ilegal e legal conduzida por humanos ainda ocorre, comumente empregando cães (para desviar presas) e grupos armados de caçadores. Humanos e leões tipicamente matam presas nessa região ao redor de corpos de água.


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Na parte experimental do estudo, os pesquisadores instalaram câmeras e alto-falantes próximos de corpos de água (~10 metros), com emissão de sons ou de leões (ex.: rosnados), humanos (mulheres e homens conversando em linguagens locais), sons de caça (armas de fogo e latido de cães), ou sons de controles (animais não-predadores) (Fig.3). Vocalizações de humanos e de leões usados no experimento eram diretamente comparáveis entre si. Todos os sons foram emitidos com o mesmo volume (60 dB) e os pesquisadores observaram como 19 espécies de mamíferos, incluindo elefantes, rinocerontes e girafas, reagiam aos sons. No final do experimento, 15 mil vídeos registrados foram analisados.


Figura 3. Sistema com câmera e alto-falante usado no experimento. (Foto: Liana Zanette / Western University).


Os pesquisadores encontraram que os animais eram duas vezes mais prováveis de correr e abandonar corpos de água em resposta aos sons humanos comparado com sons de leões ou sons de caça. Do total de espécies analisadas, 95% delas, incluindo girafas, leopardos, hienas, zebras, elefantes, rinocerontes, facoceros-comuns (suíno da espécie Phacochoerus africanus) e impalas, fugiam ou abandonavam mais frequentemente as áreas de hidratação em resposta aos sons humanos do que aos sons de leões, como mostrado no vídeo abaixo. Elefantes são fortemente dependentes de água, geralmente bebendo água diariamente, e o abandono de fontes de hidratação representa um considerável custo para esses animais; assim como no caso dos rinocerontes, a forte pressão de caça de humanos sobre esses animais - visando os supervalorizados chifres (3) e presas (4) - pode ser responsável pela notável resposta de medo. Aliás, em resposta aos sons de leões, elefantes exibiam formação de defesa ou desferiam ataques agressivos, algo não observado em resposta a sons de humanos. 


          


Para mais informações:


Enquanto leões podem matar elefantes imaturos, elefantes adultos são capazes de se defender contra leões. Contra ataques coordenados de humanos com armas de fogo, elefantes são indefesos. E, nesse sentido e como demonstrado no experimento, elefantes temem muito mais humanos do que leões. Aliás, elefantes adultos são dificilmente intimidados por leões, agindo de forma cooperativa e efetiva contra esses predadores.


Os resultados do estudo corroboram outros estudos observacionais e experimentais apontando que a fauna terrestre em geral - mesmo em áreas de conservação - teme muito mais os humanos do que outros predadores, e traz suporte para o uso do termo "super predador" descrevendo a letal e histórica atuação da nossa espécie em ecossistemas diversos. Aliás, o próprio Darwin discutiu o medo de humanos em animais selvagens na sua obra The Voyage of the Beagle (1839).


"Existe essa ideia de que os outros animais vão se habituar aos humanos caso não sejam caçados. Mas nós mostramos que esse não é o caso," disse em entrevista um dos coautores do novo estudo, o biólogo Michael Clinchy (Ref.3). "O medo de humanos é entranhado e pervasivo, portanto isso é algo que nós precisamos começar a seriamente levar em conta para propósitos de conservação." 


Os achados do estudo também suportam que o uso de sistemas de áudio emitindo sons humanos no ambiente em locais visados por caçadores pode ajudar a proteger animais diversos, afastando-os de áreas perigosas. De fato, estratégias do tipo já vêm sendo empregadas com sucesso para proteger rinocerontes.


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Atualização: Em um estudo similar, conduzido na Austrália, o mesmo time de pesquisadores (Zanette et al.) colocaram sistemas de câmera e auto-falantes ativados quando um animal passava próximo (aproximadamente 10 metros), registrando a resposta para falantes humanos (voz calma), latido de cães (Canis familiaris), grunhidos de demônios-da-Tasmânia (Sarcophilus harrisii), uivos de lobos (Canis lupus) ou controles não-ameaçadores, como balidos de ovelhas (vídeo abaixo). Os resultados do experimento mostraram que cangurus e outros marsupiais eram >2,4 vezes mais prováveis de fugir ao ouvir vozes humanos quando comparado com cães, demônios-da-Tasmânia ou lobos. E cada espécie na comunidade de marsupiais demonstravam o mesmo padrão, fugindo ~2x mais de humanos do que o segundo mais temido predador (cães). O estudo traz mais evidência de suporte de que os animais selvagens percebem os humanos como os mais temidos predadores do planeta. Ref.4


          


> Quatro espécies nativas de marsupiais (Macropus giganteus, Notamacropus rufogriseus, Thylogale billardierii e Trichosurus vulpecula) e uma espécie introduzida de cervídeo (Dama dama), em uma região da Tasmânia, Austrália, foram analisadas no estudo. Evidências arqueológicas indicam que todas essas quatro espécies de marsupiais foram caçadas por humanos há milênios no território Australiano. O canguru-cinza-Oriental (Fig.4) foi quase levado à extinção na década de 1950 devido à intensa caça para carne visando consumo humano e de cães, e hoje são protegidos na Tasmânia. Caça comercial e esportiva é ainda permitida para as outras espécies de marsupiais, com 1 milhão de mortes anuais. 


Figura 4. Canguru-cinza-Oriental (Macropus giganteus).

> Nos últimos 50 mil anos, é provável que o único grande mamífero predador que conviveu com os marsupiais na Austrália foram humanos modernos (Homo sapiens).


> Leitura recomendada: 


REFERÊNCIAS 

  1. Zanette et al. (2016). Fear of the human “super predator” far exceeds the fear of large carnivores in a model mesocarnivore, Behavioral Ecology, Volume 27, Issue 6, Pages 1826–1832. https://doi.org/10.1093/beheco/arw117
  2. Zanette et al. (2023). Fear of the human “super predator” pervades the South African savanna. Current Biology. https://doi.org/10.1016/j.cub.2023.08.089
  3. https://www.eurekalert.org/news-releases/1003161
  4. McGann et al. (2024). Fear of the human ‘super predator’ in native marsupials and introduced deer in Australia. Proceedings of the Royal Society B, Volume 291, Issue 2023. https://doi.org/10.1098/rspb.2023.2849
Animais nas savanas Africanas sentem mais medo da presença humana do que de leões, revela estudo Animais nas savanas Africanas sentem mais medo da presença humana do que de leões, revela estudo Reviewed by Saber Atualizado on outubro 07, 2023 Rating: 5

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