Cientistas reportam os mais antigos fósseis descritos de morcegos
Figura 1. Fóssil de Icaronycteris gunnelli (FM.145747A). |
- Atualizado no dia 20 de junho de 2024 -
Em um estudo publicado em 2023 no periódico PLOS One (Ref.1), pesquisadores descreveram os dois mais antigos fósseis completos de morcego conhecidos, encontrados na formação Green River, em Wyoming, EUA.Os fósseis foram datados em ~53 milhões de anos - próximo de quando os morcegos primeiro evoluíram de mamíferos não-voadores - e representam uma nova espécie (Icaronycteris gunnelli).
Os espécimes possuíam próximo de 4 cm de comprimento e uma massa estimada em ~22-29 gramas (maior do que a média dos atuais morcegos = 12 g). Além disso, traziam garras nos primeiro e segundo dedos das asas - algo não observado como regra nos morcegos modernos. As características do I. gunnelli sugerem grande proximidade com a espécie Icaronycteris index, cujos fósseis foram descobertos na mesma região na década de 1960.
Figura 2. Fóssil de Icaronycteris gunnelli (ROM: 52666). |
Figura 3. Ilustração de um morcego Icaronycteris. Ref.2 |
Morcegos (ordem Chiroptera) são os únicos mamíferos com voo verdadeiro (autossustentado). O novo achado ajuda a jogar luz na evolução desse clado e traz evidência de suporte para a hipótese de rápida radiação desses animais em múltiplos continentes durante o início do Eoceno. Como os morcegos são tipicamente pequenos e seus esqueletos são constituídos por ossos frágeis, processos de fossilização são dificultados, a maior parte dos fósseis encontrados são fragmentos ósseos e análises filogenéticas se tornam limitadas. Alguns estudos estimam que até 88% do registro fóssil dos morcegos é atualmente desconhecido. Enquanto é provável que os ancestrais dos morcegos atravessaram diferentes estágios no caminho do voo (ex.: pequenos mamíferos que primeiro planavam), fósseis desses intermediários precisam ainda ser encontrados (!). Uma hipótese de 2020 sugere que múltiplas linhagens de morcego evoluíram voo de forma convergente a partir de um ancestral comum com membranas interdigitais (Ref.4).
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> É incerto se os morcegos evoluíram a partir de um intermediário que planava. Planar é um modo de locomoção que parece ter evoluído pelo menos 7 vezes no percurso evolucionário dos mamíferos. Mamíferos que planam - como os famosos colugos (arborícolas escaladores do gênero Dermoptera) - possuem até três membranas de pele [pro-, plagio- e uropatágio] entre o corpo e membros que agem juntas como um aerofólio. Todas essas três estruturas estão presentes nos morcegos, além da "mão-asa" (dactilopatágio). Porém, notavelmente, os pés dos morcegos não exibem membranas interdigitais e nem são alongados, algo único no Reino Animal.
> Diferente das aves voadoras que conseguem planar e também bater as asas para voar, morcegos modernos não conseguem planar. Diferente das aves, planar e voo autossustentado parecem ser aerodinamicamente divergentes em mamíferos: ou é apenas autossustentado (ex.: morcegos) ou é apenas o modo planar (ex.: colugos). Tem sido sugerido que a evolução do voo intermediado por batidas de asas em organismos diversos pode ter geralmente ocorrido em uma paleoatmosfera hiperdensa (maior massa de ar em um determinado volume atmosférico), incluindo a fase inicial e crítica de voo dos morcegos, no início do Eoceno.
(!) Um estudo recentemente publicado no periódico Communications Biology (Ref.5) demonstrou, a partir de análise fóssil e premissa de uma atmosfera hiperdensa, que o gênero Onychonycteris era capaz de bater as asas e também de planar, confirmando uma continuidade aerodinâmica e trazendo importante evidência de suporte para o cenário de transição 'planar → voo autossustentado' na evolução dos morcegos. Isso também torna os espécimes descritos de Onychonycteris importantes fósseis de transição evolutiva.
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Com mais de 1400 espécies conhecidas de morcegos, esses mamíferos são encontrados em todo o mundo com exceção das regiões polares e algumas poucas ilhas remotas. Ecologicamente muito diversos, ocupam uma ampla variedade de habitats e nichos ecológicos, e oferecem vários serviços econômicos importantes para as atividades humanas, como controle de pestes, polinização e dispersão de sementes.
Leitura recomendada:
- Morcegos conseguem nadar?
- Asas de morcegos funcionam como um segundo "pulmão"?
- Existem moscas sem asas?
REFERÊNCIAS
- Rietbergen et al. (2023). The oldest known bat skeletons and their implications for Eocene chiropteran diversification. PLoS ONE 18(4): e0283505. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0283505
- https://www.nhm.ac.uk/discover/news/2023/april/oldest-bat-skeletons-ever-found-described-new-species.html
- https://royalsocietypublishing.org/doi/10.1098/rsbl.2021.0185
- Anderson & Ruxton (2020). The evolution of flight in bats: a novel hypothesis. Mammal Review, Volume 50, Issue 4, Pages 426-439. https://doi.org/10.1111/mam.12211
- Giannini et al. (2024). Palaeoatmosphere facilitates a gliding transition to powered flight in the Eocene bat, Onychonycteris finneyi. Communications Biology 7, 365. https://doi.org/10.1038/s42003-024-06032-9