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Variante altamente patogênica do H5N1 está se alastrando em mamíferos, alertam cientistas

Representação artística de uma partícula viral de H5N1.

- Atualizado no dia 22 de outubro de 2023 -


No ano passado, uma grande fazenda de martas (mamíferos do gênero Martes) em uma região no noroeste da Espanha testemunhou um evento de enorme mortandade desses animais iniciado em outubro. Inicialmente, os veterinários pensaram que a causa podia ser o SARS-CoV-2, vírus responsável pela COVID-19 e que causou eventos similares de elevada mortalidade entre martas em outros países, como na Dinamarca (1). Porém, testes laboratoriais revelaram algo bem mais preocupante: uma variante altamente patogênica do vírus da gripe aviária (H5N1). Autoridades imediatamente colocaram os funcionários da fazenda sob restrições de quarentena, e quase 52 mil martas no local foram sacrificadas e suas carcaças e dejetos destruídos.  


(1) Para mais informações: Milhões de martas serão abatidas na Dinamarca: mutação do novo coronavírus


Enquanto que o episódio - descrito recentemente no periódico Eurosurveillance (Ref.1) - não resultou em nenhuma infecção humana com o H5N1, cientistas estão preocupados com a possibilidade do vírus engatilhar uma pandemia. Até o momento, o H5N1 não era conhecido de se espalhar bem entre mamíferos, mas agora o vírus ganhou pelo menos uma mutação fortemente favorecendo a transmissão nesse clado. O H5N1 está se espalhando rápido entre aves ao redor do mundo, pode potencialmente se disseminar em outras fazendas de martas - ou outros grupos de mamíferos com alta densidade populacional - e se tornar ainda mais transmissível.


"Isso é extremamente preocupante," disse em entrevista à Science o Dr. Tom Peacock, um virologista na Imperial College London (Ref.2). "Esse é um claro mecanismo para uma pandemia de H5N1 começar." 


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O vírus H5N1 foi primeiro detectado em uma fazenda de gansos na China, em 1996. Em 1997, um grande surto entre aves de criação levou às primeiras mortes documentadas em humanos e causou a primeira preocupação em relação ao risco de pandemia. Em torno de 2005, o vírus se espalhou para aves migratórias, levando a disseminações globais em várias grandes ondas. Uma nova variante chamada de 2.3.4.4b que emergiu em 2020 se disseminou ainda mais rápido e com maior alcance do que variantes prévias, causando grandes perdas econômicas na indústria avícola na Europa e na América do Norte antes de alcançar a América Central e Sul em 2022.


Devido ao fato dos receptores nas vias respiratórias superiores das aves utilizados pelo H5N1 para a entrada celular serem menos comuns nas vias respiratórias de mamíferos, infecção do vírus nesses últimos é dificultada, e tipicamente ocorre via contato direto com aves infectadas (ex.: predador mamífero consumindo carne de ave contaminada com alta carga viral).


Porém, a nova variante identificada e reportada no periódico Eurosurveillance, além de ser altamente patogênica, têm afetado vários mamíferos e sendo ativamente transmitida dentro da população desses animais. Na fazenda em Galícia, o vírus se alastrou de forma explosiva entre martas-Americanas (Neovison vison), alcançando um pico de mortalidade (4,3%) na segunda metade de outubro de 2022. Investigação pós-morte das martas afetadas revelou pneumonia hemorrágica ou hepatização vermelha dos pulmões caracterizando as lesões mais notáveis. Grandes cargas virais de H5N1 foram confirmadas em quase todas as amostras orofaríngeas ou retais e/ou pulmonares analisadas. Semanas antes do surto na fazenda de martas, várias aves selvagens foram encontradas doentes ou mortas na região. 


Além do surto na fazenda, várias espécies de mamíferos estão sendo encontradas enfrentando infecção com o H5N1, incluindo raposas, gatos, furões, focas e até golfinhos, aparentemente após contato com aves infectadas. No dia 17 de janeiro deste ano, autoridades de Montana, EUA, reportaram que três ursos-cinzentos foram eutanasiados no último outono após ficarem muito doentes, confirmando também que haviam sido infectados pelo H5N1. Em humanos, até o momento, 6 casos foram confirmados, incluindo uma morte.


Análises laboratoriais detalhadas do surto na fazenda de martas identificou que o vírus pertencia ao clado 2.3.4.4b, carregando entre 8 e 9 diferenças de aminoácidos em várias sequências genéticas (PB2, PB1, PA, NA, NS2, M2 e PB1-F2) em relação as outras variantes do H5N1 evolutivamente mais próximas. Em particular, todas as amostras virais analisadas possuíam uma alanina (A) na posição 271 do gene PB2 (mutação T271A), a qual já foi mostrada aumentar a atividade da enzima polimerase dos vírus Influenza A em células hospedeiras de mamíferos, ajudando na replicação viral em tecidos. Nesse sentido, essa anômala mutação pode ter sérias implicações de saúde pública - situação que pode piorar caso mais mutações de preocupação sejam acumuladas.


Existem sinais de que a nova variante é menos patogênica em humanos do que versões prévias do vírus H5N1, as quais levaram à morte de ~50% dos infectados. "Mas claro que isso pode ser uma má notícia também, porque pode também facilitar a disseminação silenciosa do H5N1, dando mais oportunidade para o vírus evoluir", alertou Thomas Mettenleiter, chefe do Instituto Friedrich Loeffler, um dos principais centros de controle de doenças em animais (Ref.2). "E quanto mais o vírus infecta mamíferos, maior o risco. É um jogo de números".


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ATUALIZAÇÃO: Um estudo publicado na Nature (Ref.4), explorando a evolução da variante altamente patogênica (HPAI) do H5N1, revelou que em meados de 2020, uma nova cepa de H5N1 evoluiu de uma variedade prévia, chamada de H5N8, a qual emergiu em galinhas no Egito entre 2016 e 2014 e causou surtos ao longo de 2020 e 2021. O novo H5N1 acumulou, então, mutações através de interações com variedades não-letais de gripe aviária, chamadas de vírus Influenza aviários de baixa patogenicidade (LPAI, na sigla em inglês; ex.: H9N2) que estava circulando entre aves selvagens na Europa desde 2019. Após essas interações (!), dois subtipos emergiram em 2021 e 2022: um se espalhando ao longo de regiões costeiras [norte] da Europa central e eventualmente carregado para a América do Norte por aves migratórias através do Oceano Atlântico; e a outra variante foi carregada ao redor do Mar Mediterrâneo e para dentro da África. Os resultados do estudo realçaram que o epicentro do HPAI H5 ultrapassou os limites da Ásia e indicam que crescente persistência do HPAI H5 em aves selvagens está facilitando expansão geográfica e de hospedeiros - e, consequentemente, o potencial de preocupante evolução.


(!) Quando existe coinfecção de dois ou mais vírus em uma mesma célula, esses patógenos podem misturar seus genes durante a formação de novas partículas virais no meio intracelular, "anabolizando" processos evolutivos. Aliás, essas interações virais dentro de células hospedeiras podem inclusive criar híbridos: em 2022, na Nature Microbiology (Ref.5), pesquisadores reportaram que o vírus da gripe (Influenza) e o vírus sincicial respiratório podem se fundir dentro das células, criando um híbrido capaz de evadir o sistema imune humano. Coinfecções por mais de um vírus representam entre ~10-30% de todas as infecções virais respiratórias e são comuns entre crianças. Isso sugere que esses eventos de hibridização parecem ser comuns e podem ter significativo impacto na progressão clínica das infecções virais.

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Além da ameaça para humanos, a disseminação da nova variante entre populações selvagens de mamíferos pode colocar várias espécies já em risco de extinção em sérios apuros.


REFERÊNCIAS

  1. Monne et al. (2023). Highly pathogenic avian influenza A(H5N1) virus infection in farmed minks, Spain, October 2022. https://www.eurosurveillance.org/content/10.2807/1560-7917.ES.2023.28.3.2300001
  2. https://www.science.org/content/article/incredibly-concerning-bird-flu-outbreak-spanish-mink-farm-triggers-pandemic-fears
  3. https://www.nature.com/articles/d41586-023-00201-2
  4. Xie et al. (2023). The episodic resurgence of highly pathogenic avian influenza H5 virus. Nature. https://doi.org/10.1038/s41586-023-06631-2
  5. https://www.nature.com/articles/s41564-022-01242-5

Variante altamente patogênica do H5N1 está se alastrando em mamíferos, alertam cientistas Variante altamente patogênica do H5N1 está se alastrando em mamíferos, alertam cientistas Reviewed by Saber Atualizado on janeiro 25, 2023 Rating: 5

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