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Milhões de martas serão abatidas na Dinamarca: mutação do novo coronavírus


- Atualizado no dia 12 de janeiro de 2021 -


Algo temido pode ter sido finalmente confirmado: o novo coronavírus (SARS-CoV-2) sofreu uma mutação que potencialmente pode comprometer a efetividade das vacinas sendo testadas, segundo anúncio do governo Dinarmaquês. Essa mutação emergiu entre martas (mamíferos comumente criados em fazendas para a produção de peles) infectadas por humanos e a nova variante do SARS-CoV-2 reinfectou 12 pessoas. Mas ainda faltam detalhes científicos sobre o reporte e os cientistas pedem para a população não entrar em pânico.


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À medida que o novo coronavírus continua se espalhando sem controle entre os humanos, outros mamíferos também suscetíveis ao SARS-CoV-2 e em contato próximo de humanos acabam sendo também infectados, com potencial epidêmico entre as populações desses animais e de retransmissão para a nossa espécie. E quanto mais animais não-humanos vão sendo infectados, maior a quantidade de reservatórios naturais para o SARS-CoV-2 e maior chance para novas mutações emergirem que podem aumentar a capacidade de replicação do vírus e/ou sua transmissibilidade.


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> Para mais informações sobre quais animais são comprovadamente suscetíveis ao novo coronavírus, acesse: Gatos e outros animais não-humanos podem ser infectados pelo novo coronavírus? 


> Teoricamente, inúmeras espécies de mamíferos podem ser infectados pelo SARS-CoV-2, por possuírem o receptor proteico ACE2 na superfície celular. Para mais informações, acesse: Afinal, o novo coronavírus foi criado em um laboratório da China?

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Nos últimos meses na Holanda, dezenas de milhares de martas (gênero Martes) têm sido abatidas. O SARS-CoV-2 se alastrou em várias fazendas que criam esses animais para a produção de peles (algo já bastante polêmico e amplamente criticado por grupos de proteção aos animais). O primeiro surto epidêmico de infecção pelo SARS-CoV-2 em martas a partir de humanos infectados foi reportado nos dias 23 e 25 de abril em fazendas Holandesas possuindo 12 mil e 7,5 mil animais respectivamente.


O vírus vem se alastrando com fúria desde então entre esses mamíferos. A transmissão parece ocorrer via gotículas contaminadas em superfícies ou via poeira contendo matéria fecal de animais infectados. Assim como humanos, martas infectadas podem ser assintomáticas, ou desenvolver problemas severos, incluindo pneumonia. Em algumas fazendas a taxa de mortalidade alcança valores pouco significativos, mas em outras a taxa têm alcançado quase 10%. Ainda é um mistério essas discrepantes taxas de mortalidade.


Além da Holanda, infecções de martas têm sido documentadas em outros países, como Dinamarca e Espanha. A Espanha abateu cerca de 100 mil martas em julho após a detecção de casos na província de Aragón. Em agosto, o vírus também começou a se alastrar pelas fazendas de martas dos EUA, as quais somam um total de pelo menos 245 em 22 estados.


Em um estudo de setembro apresentado na Conferência ECCVID (!), pesquisadores encontraram forte evidência dando suporte para a transmissão de animais não-humanos para humanos do novo coronavírus, após a análise de 16 fazendas de martas na Holanda afetadas pela disseminação do SARS-CoV-2. Os pesquisadores analisaram cuidadosamente as fazendas (comportando mais de 720 mil martas) e seus funcionários - usando também técnicas de sequenciamento genômico inteiro - para esclarecer as dinâmicas de infecção. No total, 66 de 97 (68%) pessoas diretamente associadas à fazenda testaram positivo para o SARS-CoV-2 (PCR ou teste sorológico). E entre os infectados analisados via sequenciamento genômico inteiro, as amostras virais isoladas mostraram assinatura de sequências dos vírus circulando nas martas, fornecendo sólida evidência de retransmissão zoonótica. Além disso, os pesquisadores encontraram que o SARS-CoV-2 circulando entre as martas está evoluindo de forma expressiva, aumentando o conteúdo de uracilas no RNA viral e sugerindo adaptação ao novo hospedeiro.


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(!) ATUALIZAÇÃO (10/11/20): O paper final e revisado por pares foi publicado na Sciencehttps://science.sciencemag.org/content/early/2020/11/09/science.abe5901


ATUALIZAÇÃO (12/01/21): Outro estudo publicado na Science confirmou, através de ampla análise genômica, a retransmissão zoonótica do SARS-CoV-2 das martas para humanos, sugerindo também que os mustelídeos podem ser um potencial reservatório natural do vírus: https://science.sciencemag.org/content/371/6525/172

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Agora, o governo da Dinamarca anunciou o abatimento de 15-17 milhões de martas em mais de 1000 fazendas do país, o qual é o maior exportador do mundo de pele desses animais (1), especialmente para a China e Hong Kong. A Primeira-Ministra Dinamarquesa, Mette Frederiksen, fez o anúncio ontem (quarta-feira, 4 de novembro), e o abatimento em massa já foi iniciado em 400 fazendas e será realizado com o auxílio das forças armadas. A indústria de martas no país será eliminada, cenário que pode persistir por vários anos. Até o final deste mês, é esperado que 80% da população de martas em fazendas seja eliminada.


Já são 207 fazendas de martas afetadas - e pelo menos 5 casos da nova variante viral já foram encontrados. E, segundo o Ministro da Saúde, Magnus Heunicke, cerca de metade dos 783 casos de infecção humana reportados no norte da Dinamarca estão relacionados com uma cepa viral com origem dessas fazendas.


Em uma conferência, Kare Molbak, líder do setor de saúde pública do governo Dinamarquês, alertou que uma nova mutação no SARS-CoV-2 emergiu entre as populações de marta, e a qual pode interferir com a efetividade de futuras vacinas. O governo notificou a Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre a mutação viral, e também afirmou que 12 pessoas na região de Jutland foram infectadas com a nova variante, esta a qual mostrou enfraquecer a capacidade do corpo humano de produzir anticorpos contra o vírus - o que potencialmente pode tornar as vacinas em desenvolvimento inefetivas. 


Bares, restaurantes, transportes públicos e esportes em espaços internos serão também fechados em sete municípios de Jutland. As restrições serão iniciadas amanhã (sexta-feira, 6 de novembro) e durarão até 3 de dezembro. Reuniões envolvendo 10 ou mais pessoas serão banidas e habitantes locais estão sendo orientados a permanecerem nos municípios afetados até serem testados. Desde o início da pandemia, a Dinamarca reportou 52265 casos de infecções pelo SARS-CoV-2 em humanos e 733 mortes associadas, segundo dados da Universidade Johnhs Hopkins.


O governo também anunciou que irá conduzir uma investigação para esclarecer os significados epidemiológicos e virológicos dos novos achados. Por enquanto, nenhuma informação mais detalhada dessa nova mutação foi publicada. Cientistas - especialmente Biólogos Evolucionários especializados no novo coronavírus - ao redor do mundo já estão pedindo mais detalhes, incluindo as sequências genéticas de interesse.


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No Twitter, a geneticista da Universidade de Basel, Emma Hodcroft, que vem rastreando a disseminação do SARS-CoV-2, pediu que a população não entrasse em pânico. "Se você está vendo tweets sobre a mutação do SARS-CoV-2 de martas na Dinamarca: essas informações estão vindo de conferências de imprensa, nós não temos o contexto/detalhes científicos ainda; detalhes importam quando são sobre esse tópico. Não entrem em pânico. Cientistas irão atualizar a questão quando nós tivermos mais informações." [Segue a mensagem original na imagem abaixo] (!!)



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(!!ATUALIZAÇÃO (11/11/20):  Um preprint curto trazendo os dados científicos divulgados na conferência de imprensa foi publicado. No trabalho reportado, os pesquisadores revelaram que entre as martas infectadas, o SARS-CoV-2 havia sofrido um número de mutações, dando origem a várias mudanças de aminoácidos na proteína Spike (S). A mais notável, que também foi identificada na Holanda, foi a substituição de uma tirosina para uma fenilamina no aminoácido 453 (YA53F), este o qual está presente no domínico de ligação ao receptor (RBD) que diretamente liga o receptor proteico ACE2 na superfície celular do hospedeiro no aminoácido 34. Como a posição de contato difere entre humanos e martas, isso sugere que o YA53F é uma mutação de adaptação ao ACE2 das martas. E importante: o 453F aumenta a afinidade pelo ACE2 humano, o que pode ajudar a explicar a retransmissão para humanos. Outras três mutações na proteína S foram identificadas: 


i) 69-70deltaHV (deleção de uma histidina e de uma valina nas posições 69 e 70 do domínio N-terminal da subunidade S1);


ii) I692V (substituição na posição 692 localizada na furina presente no local de clivagem);


iii) S1147L (substituição na posição 1147 na subunidade S2);


iv) M1229I (substituição localizada dentro do domínio da transmembrana)



Duas cepas carregando um variado número dessas mutações foram isoladas até o momento de pessoas na Dinamarca associadas com essas fazendas: uma trazendo a mutação 453F (F-spike) e a outra trazendo as mutações 69-70deltaHV, 453F, 692V, e 1229I (ΔFVI-spike).


Em culturas de células VeroE6, os pesquisadores mostraram que, apesar da cepa ΔFVI-spike inicialmente replicar de forma bem mais lenta do que outras cepas do SARS-CoV-2 em circulação na pandemia e laboratoriais, entre 24 horas e 94 horas pós-inoculação, a quantidade de partículas virais aumentou em 54,7 vezes, comparado com uma média de 4 vezes para outras cepas. De fato, indivíduos infectados com essa cepa mostraram ter uma significativa maior carga viral na garganta.


Na etapa final do estudo, os pesquisadores analisaram a capacidade dos anticorpos do plasma convalescente de indivíduos (humanos) recuperados da COVID-19 de  neutralizar a cepa mutante ΔFVI-spike. Foram analisadas 9 amostras de plasma convalescente contendo três diferentes níveis de anticorpos neutralizantes: baixo (4), intermediário (3) e alto (2). Em todas as amostras, os anticorpos mostraram uma significativa redução na capacidade neutralizante frente à cepa ΔFVI-spike. Enquanto que nas amostras de alto nível de anticorpos neutralizantes essa redução foi moderada, em duas amostras de nível baixo a redução foi acima de 4 vezes, limite de resistência à neutralização.


Apesar do estudo ser preliminar, seus resultados preocupam, porque as vacinas sendo desenvolvidas e testadas são baseadas essencialmente no reconhecimento da proteína S. Mutações nessa proteína podem tornar inefetivas essas vacinas. E, segundo o reporte do estudo, já estamos observando resistência aos anticorpos neutralizantes.


Além disso, todas as cepas analisadas transmitidas pelas martas continham também a mutação D6146 na proteína S, a qual se tornou prevalente ao longo da pandemia e com evidências de estar associada a uma maior capacidade de infecção e de transmissibilidade. Para mais informações, acesse: Mutação tornou o novo coronavírus mais infeccioso e potencialmente mais transmissível 

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Essa é uma das razões que reforçam a importância do controle epidêmico do SARS-CoV-2. Além de proteger o sistema de saúde e a vida das pessoas, quanto menos pessoas infectadas, menor as chances de contaminação de outros animais. É bom lembrar que o SARS-CoV-2 é uma variante que primeiro evoluiu de coronavírus de morcegos, e provavelmente pulou para humanos a partir de outro mamífero intermediário. Deixar o SARS-CoV-2 circular sem controle entre outros animais pode criar um novo e perigoso vírus com capacidade de também infectar humanos e para o qual as atuais vacinas sendo desenvolvidas podem ser pouco efetivas. 


(1) REFERÊNCIAS

Milhões de martas serão abatidas na Dinamarca: mutação do novo coronavírus Milhões de martas serão abatidas na Dinamarca: mutação do novo coronavírus Reviewed by Saber Atualizado on novembro 05, 2020 Rating: 5

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