Pela primeira vez microevoluções são registradas em fósseis de ancestrais da linhagem humana
Em um estudo publicado no periódico Nature Ecology & Evolution (1), pesquisadores descreveram o fóssil de um dos nossos primitivos ancestrais Africanos e pela primeira vez registraram uma microevolução em uma antiga espécie hominini. No caso, foi descrito um crânio fossilizado descoberto em uma caverna do Sul da África e pertencente a um adulto macho da espécie Paranthropus robustus datado de aproximadamente 2,04-1,95 milhões de anos atrás. Até o momento, acreditava-se que significativas diferenças morfológicas observadas nos fósseis dessa espécie previamente descritos eram indicativo de dismorfismo sexual. Porém, o crânio entra em substancial contraste morfológico com o crânio de outros P. robustus adultos e também machos escavados de depósitos cronologicamente mais jovens na mesma região, trazendo uma mistura de traços fenotípicos primitivos e derivados.
Após análises comparativas com outros espécimes fossilizados, os pesquisadores mostraram que diferenças morfológicas nessa espécie antes pensadas serem devido ao sexo eram, na verdade, uma série inter-populacional de mudanças morfológicas de pequena escala representando um processo microevolutivo, algo raro de ser registrado em fósseis - e o primeiro registro do tipo na nossa linhagem evolutiva. A população anatomicamente derivada associada ao DNH 155 representa, portanto, o estágio evolutivo mais avançado de populações ancestrais associadas, por exemplo, aos espécimes previamente descritos DNH 7 e DNH 152, com o DNH 7 (mais antigo) separado por um período de 200 mil anos do DNH 155, e o DNH 152 trazendo traços intermediários entre os dois. Esse processo evolutivo coincide com turbulentas mudanças climáticas na região habitada por essa espécie, entre 2,2 milhões e 2 milhões de anos atrás, trazendo uma maior flutuabilidade nos níveis de água e episódios mais secos.
O DNH 155 era menos robusto do que espécimes anteriores e trazia traços esqueléticos sugerindo músculos e dentes de mastigação com dimensões e posicionamento visando tornar a mordida e o ato de mastigar mais poderosos. Nesse sentido, os pesquisadores acreditam que um clima mais seco provavelmente levou a seleção natural a favorecer a evolução de um aparato mastigatório mais eficiente e poderoso no P. robustus. Essa adaptação poderia permitir o processamento de alimentos mecanicamente mais difíceis de serem mastigados, em uma época onde as opções alimentares poderiam estar mais escassas. Porém isso não exclui outros processos evolutivos, como deriva genética.
O P. robustus é posterior aos australopitecos (Australopithecus), vivendo no mesmo período do Homo erectus, nosso ancestral humano (gênero Homo) direto. Apesar de ser tradicionalmente sugerido que o P. robustus evoluiu diretamente do Australopithecus africanus, os pesquisadores no novo estudo não encontraram evidência de suporte para esse cenário. Para mais informações sobre os australopitecos, acesse: Little Foot: Nosso ancestral com cérebro metade humano metade chimpanzé
> O fóssil foi datado usando a técnica de datação radioativa urânio-chumbo e ressonância de spin eletrônico. Para mais informações sobre esses e outros métodos de datação geológica, acesse: Como calcular a idade dos fósseis e da Terra?
> Microevoluções, em um sentido mais amplo, caracterizam mudanças morfológicas/genéticas dentro de uma mesma espécie, como subespeciação ou processos adaptativos. Um exemplo de microevolução nos humanos modernos (Homo sapiens) são as diferentes cores de pele dependendo da localização geográfica. Para mais informações, acesse: Cor da pele, Vitamina D, Ácido Fólico e Evolução
(1) Publicação do estudo: https://www.nature.com/articles/s41559-020-01319-6
Referência adicional: https://australian.museum/learn/science/human-evolution/paranthropus-species/