Primeiro medicamento reportado efetivo para casos leves e moderados de COVID-19
- Atualizado no dia 19 de janeiro de 2021 -
A pandemia do novo coronavírus (SARS-CoV-2) continua avançando, e já acumula quase 100 milhões de casos confirmados ao redor do mundo. Sua doença associada (COVID-19) é responsável por mais de 2,1 milhões de mortes registradas. E esses números provavelmente estão subestimados. Tratamentos específicos efetivos para casos leves e moderados ainda não existem, e por isso a importância de frear ao máximo a disseminação do vírus através de intervenções não-farmacológicas, como isolamento social, uso universal de máscaras, distanciamento social, aplicação de testes em massa e rastreamento dos casos, e rápida adoção das vacinas comprovadamente eficazes.
Intervenções farmacológicas relativamente efetivas até o momento se limitam a casos graves (sob ventilação mecânica), incluindo anticoagulantes derivados da heparina e corticoesteroides (especialmente a dexametasona) (1). Agora, a empresa farmacêutica Eli Lilly reportou resultados preliminares (ainda não publicados em periódico científico) de um estudo clínico randomizado, duplo cego, placebo-controlado de grande porte de que um medicamento a base de anticorpos monoclonais, chamado LY-CoV555, reduz o risco de hospitalização em torno de 72% para pacientes com COVID-19 leve ou moderada (2).
O anticorpo monoclonal testado (LY-CoV555) - também conhecido como LY3819253 ou bamlanivimab - é um anticorpo neutralizante SARS-CoV-2-específico isolado do sangue (plasma convalescente) de pacientes recuperados da COVID-19, e que foi geneticamente modificado (!).
> (!) Para mais informações sobre os anticorpos monoclonais e o potencial dessas proteínas no combate ao SARS-CoV-2, acesse: Descoberto anticorpo especial com o potencial de tratar e prevenir a COVID-19
No teste clínico reportado (BLAZE-1) (!), foram avaliados 452 voluntários com COVID-19 confirmada, divididos em quatro grupos: um recebendo placebo e os outros três recebendo diferentes doses do medicamento (700 mg, 2800 mg e 7000 mg). Até 11 dias após a administração do medicamento ou do placebo, a maioria dos pacientes em todos os grupos se recuperaram, se livrando totalmente da carga viral, como já esperado. Porém, enquanto apenas 1,7% dos 302 pacientes tomando o medicamento precisaram ser hospitalizados, 6% dos 150 pacientes no grupo de controle (placebo) precisaram de hospitalização. Isso se traduz para uma redução de 72% no risco de ser hospitalizado com o uso do anticorpo monoclonal em relação ao placebo.
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(!) ATUALIZAÇÃO (21/01/21): O estudo agora foi publicado após revisão por pares no periódico The New England Journal of Medicine, confirmando os resultados reportados com leves alterações: 1,6% dos pacientes tomando o medicamento precisaram ser hospitalizados, e 6,3% dos pacientes no grupo de controle precisaram de hospitalização.
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Análises adicionais mostraram que a eliminação do vírus foi substancialmente facilitada pelo LY-CoV555, com o medicamento também reduzindo a proporção de pacientes com persistentes altas cargas virais além do terceiro dia.
Nenhum sério efeito colateral foi reportado e o medicamento mostrou-se bem tolerado. Os pesquisadores responsáveis pelo estudo - ainda em andamento - esperam publicar o mais rápido possível os resultados em um periódico após submissão para revisão por pares.
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LY-CoV555: O LY-CoV555 é um potente anticorpo monoclonal (mAb) neutralizante IgG1 direcionado contra a proteína Spike (S) do SARS-CoV-2 - crucial para a entrada do vírus na célula hospedeira. O LY-CoV555 foi engenhado para bloquear a anexação viral do novo coronavírus e sua entrada nas células humanas, portanto neutralizando o vírus e potencialmente prevenindo e tratando a COVID-19. O anticorpo natural associado foi primeiro identificado na amostra de sangue extraída de um dos primeiros pacientes dos EUA que se recuperou da COVID-19.
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PACIENTES HOSPITALIZADOS
Em um estudo clínico randomizado publicado no periódico The New England Journal of Medicine (3), pesquisadores administraram via infusão intravenosa LY-CoV555 (dose única de 7000 mg ao longo de 1 hora) ou placebo em 314 pacientes (razão 1:1) hospitalizados com COVID-19 sem falha em órgãos (ou seja, com uma doença menos severa). Todos os pacientes estavam recebendo também remdesivir e, quando indicado, oxigênio suplementar e glucocorticoides. Cinco dias após a administração dos anticorpos ou do placebo, não houve diferença clínica entre os dois grupos, e a terapia com LY-CoV555 foi considerada fútil e interrompida para um total visado de 1000 pacientes. Eventos adversos graves (incluindo morte) foi similar em ambos os grupos, mas maior para a terapia com LY-CoV555 (19% vs 14%).
As razões para a falta de eficácia do LY-CoV555 - são desconhecidas e podem incluir lenta ou inefetiva penetração do anticorpo no tecido infectado, potência intrínseca mínima, rápida seleção para mutações de evasão imune (variantes do vírus selecionadas - evolução viral via seleção natural - para driblar o anticorpo neutralizante), e efeitos deletérios do anticorpo. Nesse último caso, tem sido hipotetizado que o uso desse tipo de terapia (anticorpo monoclonal) pode estar associado com um aumento da replicação viral ou inflamação exagerada ("otimização anticorpo-dependente").
O estudo foi preliminar e com certas limitações (como número não tão grande de pacientes e uso concomitante de outros medicamentos), e mais estudos são necessários para melhor esclarecer a questão.
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(1) Leitura recomendada: Dexametasona é comprovadamente eficaz no tratamento da COVID-19, aponta estudo Britânico
(2) Publicação do reporte: Lilly
(3) Publicação do estudo: https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2033130
Referência adicional: Science Magazine
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