Esse dinossauro tinha quatro asas e trocava de penas como as aves modernas
Em um estudo publicado no periódico Current Biology (1), pesquisadores trouxeram clara evidência de que os dinossauros não-aviários do gênero Microraptor - os quais possuíam quatro asas (membros dianteiros e traseiros) - trocavam suas penas de forma sequencial, como a maioria das aves modernas. Isso fortemente sugere que esses dinossauros eram realmente capazes de voar - não apenas planar como antes era proposto - e de manter essa habilidade de voo o ano inteiro.
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A troca de penas é essencial para as aves porque as penas velhas se tornam desgastadas ao longo do tempo - sofrem ataques de ectoparasitas, bactérias e fungos, abrasão mecânica, radiação solar, etc. -, o que pode comprometer a capacidade de voo (performance aerodinâmica) e outras funções associadas às penas, como termorregulação, comunicação visual e camuflagem. Ao contrário de estruturas como pelos, unhas e garras, as penas não conseguem ser renovadas de forma contínua a partir da base de crescimento, e as penas velhas precisam ser removidas completamente para que novas penas se desenvolvam.
As estratégias de troca de penas variam entre as várias espécies de aves modernas e podem ser de três tipos:
i) Troca sequencial. Aqui as penas de voo são substituídas de forma gradual e direcional em um processo geralmente lento e simétrico entre as duas asas.
ii) Troca simultânea. Aqui todas as penas de voo são trocadas de uma só vez.
iii) Troca gradual. Aqui as penas são trocadas de forma gradual mas não de forma ordenada. A substituição das penas é irregular, ou seja, não segue uma sequência previsível ou direcional.
Apesar desse processo de troca de penas ser bem conhecido e descrito na literatura acadêmica, pouco têm sido explorado como ele primeiro evoluiu ou como se relaciona com o nicho ecológico de cada espécie. Essa evolução inicial teria ocorrido ainda com os dinossauros não-aviários ou essa estratégia de manutenção emergiu de forma mais tardia, com os dinossauros aviários ou mesmo com as aves modernas?
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No novo estudo, os pesquisadores resolveram esclarecer melhor a questão, ao analisar dados englobando um total de 302 espécies de aves hoje existentes, e de um fóssil muito bem preservado encontrado na China, de um dinossauros não-aviário do gênero Microraptor. Entre as aves analisadas, 51 espécies não voavam, 61 espécies não voavam apenas durante o período de troca de penas, e 190 espécies voavam e mantinham a capacidade de voo o ano inteiro.
Primeiro, os pesquisadores encontraram uma forte relação entre estratégia de troca de penas e histórico de vida, habilidade de voo, e seleção de habitat durante o período de troca, corroborando evidências prévias. A troca não-sequencial de penas ocorre entre espécies sem capacidade de voo ou em espécies que trocam de penas em habitats protegidos (ex.: pântanos ou lagos) e que apresentam farta quantidade de alimento, enquanto a troca sequencial ocorre entre espécies voadoras na qual o voo é essencial para a busca de alimentos ou que habitam áreas que não fornecem proteção de predadores. Por exemplo, no caso das trocas não-sequenciais, aves aquáticas podem mergulhar para fugir de predadores, e aves vivendo em áreas com densa vegetação podem se esconder com facilidade, e ambos ambientes associados possuem farta quantidade de alimento.
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Na segunda parte do estudo, os pesquisadores encontraram forte evidência de troca de penas sequencial observada em um espécime fossilizado de Microraptor (um dromaessaurídeo volante de pequeno porte) altamente preservado e protegido no Instituto de Paleontologia Vertebrada e Paleoantropologia, em Pequim, China. Nesse espécime, uma distinta lacuna é visível na asa direita [entre as penas P(c) e P(g)] - como mostrado na imagem abaixo -, a qual caracteriza um claro padrão de troca de penas criado por três penas em crescimento [P(d)-P(f)] - muito menores do que as penas primárias restantes.
Como indicado na imagem acima, a pena P(f) está em um avançado estágio de crescimento comparado com P(e), e P(e) está em um avançado estágio de crescimento comparado com P(d). Isso claramente indica uma estratégia de troca sequencial, que provavelmente começou com a pena P(g) se movendo para a ponta da asa. Além disso, as novas penas [P(d)-P(g)] são mais escuras, mais largas e mais redondas do que as mais velhas [P(a)-P(c)], o que lembra as diferenças entre penas novas e velhas nas atuais aves.
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Juntando as evidências, o estudo fortemente sugere que a estratégia de troca de penas sequencial estava presente nos ancestrais não-aviários das aves, há pelo menos 120 milhões de anos (data relativa aos depósitos associados ao Microraptor). Somando-se a isso, enquanto que evidências prévias sugeriam que o Microraptor era apenas capaz de planar razoavelmente bem com suas quatro asas, o novo estudo traz robusta evidência suportando elaboradas habilidades aerodinâmicas nesse dinossauro, incluindo a possibilidade de manutenção de real voo durante todo o ano. Ainda segundo os autores do estudo, estruturas nas asas fossilizadas e habitat associado também suportam grande capacidade de voo para essa espécie.
(1) Publicação do estudo: Current Biology
Esse dinossauro tinha quatro asas e trocava de penas como as aves modernas
Reviewed by Saber Atualizado
on
julho 23, 2020
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