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Estudo confirma que esse estranho parente das estrelas-do-mar pode ver sem olhos


Quase todos os animais podem sentir luz (interação com os fótons, via energia térmica por exemplo), mas apenas aqueles com visão espacial podem realmente "ver". Convencionalmente, isso era restrito a animais possuindo órgãos discretos de visão (olhos), mas nas últimas décadas visão extraocular foi comprovada em um animal e sugerida em outro, ambos espécies de equinodermos (animais exclusivamente marinhos e bentônicos). Agora, cientistas da Universidade de Oxford, em um estudo publicado na Current Biology (1), confirmaram a existência de visão nesse outro equinodérmico - Ophiocoma wendtii, parente evolutivo próximo das estrelas-do-mar - e detalharam como essa espécie usa a visão para guiá-la através de coloridos recifes de corais, envolvendo em particular um truque de mudança epidérmica de cor.

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Animais têm usado a luz para a navegação, coleta de alimentos, e outras complexas tarefas desde, no mínimo, o Cambriano (542-488 milhões de anos atrás), e olhos têm evoluído de forma independente dezenas de vezes, frequentemente através de caminhos genéticos e de desenvolvimento similares (evolução convergente). A maioria dos olhos bilaterais são discretos, pareados, anteriores, e cerebralmente inervados, mas alguns sistemas visuais passam longe do convencional. Os equinodermos (estrelas-do-mar, ouriços-do-mar e clados próximo associados) são notáveis por não possuírem uma cabeça, eixo anteroposterior, e uma simetria bilateral na fase adulta. Várias espécies nesse grupo respondem à luz ambiente (mudança de cor, camuflagem e busca por abrigo) e alguns a estímulos localizados (navegação e até mesmo estabilização do 'olhar', contemplação). Algumas estrelas-do-mar possuem pequenos olhos compostos derivados dos tubos terminais dos pés - usados para caçar de forma ativa - e alguns pepinos-do-mar pode ter ocelli (órgãos simples de detecção de luz) bem simplificados.

No entanto, ouriços-do-mar (classe Echinoidea) e ofiúros (classe Ophiuroidea) carregam milhares de células fotorreceptoras espalhadas ao longo do corpo: dentro dos poros esqueléticos, espinhas, nervos radiais e tubos dos pés. Essas estruturas facilitam foto-comportamentos e, têm sido sugerido, visão extraocular: a habilidade de resolver cenas sem olhos discretos. Nos ouriços-do-mar, visão foi proposta há mais de uma década, mas apenas recentemente foi explicitamente confirmada, e possivelmente mediada por essas células fotorreceptoras, mas os mecanismos funcionais permanecem elusivos.

Em particular, a espécie de ofiúro Ophiocoma wendtii capturou a atenção da comunidade científica há mais de 30 anos graças à sua dramática mudança de cor entre o dia e a noite e da sua forte aversão à luz. Apesar da descoberta de extensivas células fotorreceptoras (r-opsinas) ao redor de estruturas de calcita em seu corpo - interpretadas previamente como micro-lentes - associadas com cromatóforos responsivos, o exato comportamento que elas controlam permaneciam um mistério. Assim como ouriços-do-mar, essa espécie busca áreas de sombras, mas isso somente requer foto-eixo direcional (discriminação entre áreas mais escuras e áreas mais claras) e não visão espacial (formação de imagens). Outra espécie do mesmo gênero que também possui uma extensiva rede de r-opsinas é o O. pumila, mas é também incerto se esse último possui visão extra-ocular.






Para esclarecer a questão, pesquisadores do Museu de História Natural da Universidade de Oxford, Reino Unido, realizaram uma série de experimentos com as duas espécies (O. wendtii e O. pumila). Os resultados forneceram a primeira sólida e conclusiva evidência de que qualquer ofiuroide (estrela-frágil) é capaz de 'ver', o segundo exemplo conhecido de visão em um grupo de animais que não possuem olhos (o primeiro são os já citados ouriços-do-mar). Enquanto que ambas as espécies analisadas são fortemente aversivas à luz, o O. wendtii se orienta por estímulos necessitando de visão espacial para detecção, mas o O. pumila não. No entanto, a resposta do O. wendtii desaparece quando os cromatóforos são contraídos dentro do esqueleto. Ambos os animais foram capazes de buscar áreas de contraste, as quais os pesquisadores acreditam imitarem estruturas que podem oferecer abrigo contra predadores. Apesar da visão desses animais parecer ser bastante grosseira e funcionar bem apenas a distâncias muito curtas (~40 cm), no ambiente em que vivem - abarrotado de potenciais abrigo - isso é suficiente. Sequenciamento de RNA também identificou candidatos de opsinas nas duas espécies, incluindo múltiplas r-opsinas e caminhos de transdução constituintes.

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Outra descoberta, dessa vez inesperada, era que as respostas visuais observadas durante o dia completamente desapareciam durante a noite, mesmo com as células fotossensíveis, aparentemente, ainda ativas. Tentando encontrar uma explicação para esse estranho comportamento, os pesquisadores só não conseguiram eliminar uma possível associação entre a característica mudança de cor do O. wendtii - de um profundo vermelho durante o dia para uma cor beje durante a noite. Porém, o O. pumila não mostra esse curioso fenótipo.

Para resolver o novo mistério, os pesquisadores combinaram técnicas de imune-histoquímica, histologia, e microtomografia síncrotron (2), visando reconstruir os fotorreceptores in situ e extrair ângulos de sensibilização da visão para ambas as espécies. Eles demonstraram que o pigmento visto durante o dia para o O. wendtii restringia a luz alcançando os sensores para um estreito ângulo que corresponde à resolução visual estimada para essa espécie. Sem esse pigmento - no O. pumila, ou durante a noite para o O. wendtii - a luz consegue alcançar os fotossensores de um ângulo muito mais amplo, tornando a visão impossível.

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(2) Leitura recomendada: Acelerador de Partículas Sirius: Orgulho Brasileiro!

Apesar desse ser o primeiro sistema visual proposto de trabalhar usando mudanças de cor em todo o corpo, os pesquisadores também acreditam que um sistema cromatóforo similar também pode estar funcionando nos ouriços-do-mar. Os cromatóforos no O. wendtii, aliás, podem facilitar a resolução espacial via exaptação ao filtrar fotorreceptores pré-existentes, algo que parece basear a visão dos ouriços-do-mar. Estudos futuros irão esclarecer esse possível paralelo.


(1) Publicação do estudo: Cell

Estudo confirma que esse estranho parente das estrelas-do-mar pode ver sem olhos Estudo confirma que esse estranho parente das estrelas-do-mar pode ver sem olhos Reviewed by Saber Atualizado on janeiro 03, 2020 Rating: 5

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