Cães escutam palavras da mesma forma que nós

Animais domesticados têm mostrado reconhecer informações fonêmicas básicas de sons da fala humana e também reconhecer falantes familiares a partir das suas vozes. No entanto, era incerto se animais não-humanos são também capazes de espontaneamente identificar palavras entre falantes não-familiares (normalização do locutor) ou espontaneamente discriminar entre falantes não-familiares entre diferentes palavras. Agora, um estudo publicado na Biology Letters (1) confirmou que os cães (Canis familiaris) conseguem reconhecer palavras humanas independentemente do indivíduo (familiar ou não-familiar), e sem necessidade de treino para isso.

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Donos de cães ao redor do mundo estão acostumados a proferir palavras-termos de comando para seus animais de estimação, como "senta!", "solta!" e "pega!", ou de elogio como "bom garoto!" ou "muito bem!". Os cães respondem muito bem a essas palavras, quando ditas por seus donos. Nesse sentido, será que eles responderiam corretamente se essas mesmas palavras fossem faladas por um estranho, ou por alguém com um sotaque muito carregado? Até o momento, era pensado que esse tipo flexível e sofisticado de percepção às palavras faladas era algo único dos humanos modernos (Homo sapiens) - e provavelmente de outras espécies do gênero Homo, como os Neandertais.

O modo como pronunciamos as palavras muda dependendo do nosso sexo, idade e mesmo status social. Mecanismos neurais no cérebro humano - ainda não muito bem esclarecidos - nos ajudam a filtrar diferenças nos sotaques e na pronunciação, possibilitando o entendimento de palavras faladas oriundas de diversos indivíduos. Animais como peixes-zebras, chinchilas e primatas não-superiores podem ser treinados para realizar essa tarefa de filtragem, mas, como já citado, apenas humanos eram conhecidos de espontaneamente realizá-la.

No novo estudo, pesquisadores da Universidade de Sussex, Reino Unido, filmaram 42 cães de diferentes linhagens enquanto permaneciam sentados juntos aos seus donos próximos de um alto-falante, este o qual emitia um total de seis palavras monossilábicas e de não-comando com sons similares (em inglês no caso), como "had", "hid" e "who'd". As palavas eram proferidas por vários estranhos ao cão, mulheres e homens, e de diferentes idades e sotaques.

Os vídeos gravados pelos pesquisadores mostraram que os cães moviam suas orelhas para frente ou se moviam na direção da fonte do áudio - ambos sinais de engajamento - sempre quando eles ouviam uma nova palavra que possuía um som de vogal levemente diferente. Isso implica que os cães estavam detectando a diferença. Por exemplo, no vídeo abaixo, o cão da linhagem collie, chamada Max, vira rapidamente e ouve atentamente quando ouve uma voz de mulher dizendo "had" pela primeira vez. Porém, quando outras mulheres com diferentes sotaques repetiam a palavra, o cão perdia o interesse, indicando que ele sabia que elas estavam dizendo a mesma palavra. E já quando o alto-falante soltava uma nova palavra - no caso "who'd" -, Max voltava a demonstrar interesse, mas sua atenção logo se esvaia quando uma nova voz retornava com a palavra "had".


           

O achado claramente demonstra que os cães estão nos ouvindo, mesmo quando nossa fala não é direcionada a eles, ou seja, eles absorvem nossa linguagem sonora assim como nós absorvemos. A habilidade de espontaneamente reconhecer o mesmo fonema entre diferentes falantes, familiares ou não-familiares, está portanto presente nos cães domésticos, não sendo um traço único dos humanos.


(1) Publicação do estudo: Biology Letters