Sociedades mais igualitárias fomentam a homofobia entre os homens
Antes da revolução feminista na década de 1960, os homens geralmente construíam uma masculinidade com base em esteriótipos conservadores amplamente colocados em prática em quase todas as sociedades ao redor do mundo. Papeis de gênero eram bem estritos, onde mulheres só podiam fazer algumas atividades - em geral, afazeres domésticos - e os homens tinham liberdade exclusiva para atuar em setores diversos da política, economia e relações sociais. Ao longo das últimas décadas, porém, as mulheres começaram a ganhar cada vez mais liberdade, rompendo ideologias conservadores de papéis de gênero e abraçando ideologias mais igualitárias. Várias das atividades antes exclusivas dos homens passaram a serem conquistadas pelas mulheres, incluindo cargos de liderança e rédeas no planejamento familiar. Aliás, uma reação de grupos conservadores e Cristãos para essa 'mudança de valores' acabou dando fruto à distorcida noção de um suposto movimento de subversão taxado de 'Ideologia de gênero' (1).
(1) Para entender a falaciosa noção de 'Ideologia de Gênero', acesse: O que é a Ideologia de Gênero?
Nesse sentido, um novo estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Genebra, Suíça, revelou que alguns homem reafirmam sua masculinidade realçando o status heterossexual, em ordem de compensar a perda de funções exclusivas na sociedade. Essa auto-afirmação, consequentemente, parece estar levando a uma maior rejeição e repúdio da homossexualidade, esta a qual é vista como uma forma de feminização dos homens. Em outras palavras, o aumento da homofobia em alguns homens seria uma tentativa de estabelecer uma clara definição do que é ser um "real homem" em uma sociedade mais igualitária. Os resultados do novo estudo foram publicados no periódico Sex Roles.
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Nas sociedades Ocidentais, onde existe um maior avanço no sentido de ideologias mais igualitárias de papeis de gênero, mulheres agora focam mais em suas carreiras e frequentemente são auto-suficientes e fortes. Ao mesmo tempo, os homens estão sendo permitidos mais a expressarem suas emoções e cuidar mais das suas famílias. Homens mais conservadores - criados ou não em famílias mais conservadoras - acabam perdendo muitos dos esteriótipos típicos usados no passado para diferenciar homens e mulheres na sociedade, algo cunhado por alguns como "crise de masculinidade". De fato, isso leva muitos a acreditarem que os homens estão se tornando mais "femininos".
Nesse sentido, os pesquisadores no novo estudo usaram um questionário para testar os efeitos do enfraquecimento da norma anti-feminista. Nele, foram incluídos itens avaliando a concordância com características chaves do conceito de masculinidade: aversão à feminidade, restrição de emoções, auto-confiança, agressividade, dominância, atração à atividade sexual e homofobia. Três grupos de homens heterossexuais, então, tinham que dizer se concordavam ou discordavam com os itens relacionados a essas normas. O primeiro grupo era um controle, significando que seus membros tinham que completar o questionário sem qualquer informação influente prévia. Com o segundo grupo, os pesquisadores realçaram a masculinidade e a anti-feminidade dos homens nas sociedades de hoje através da apresentação de vários estudos antes do questionário. Para o terceiro grupo, os pesquisadores comentaram que os homens de hoje nunca estiveram tão femininos (expressando suas emoções, dividindo tarefas com as mulheres, etc.).
Já para a segunda parte desse estudo, os pesquisadores apenas mantiveram os dois últimos grupos (sem o controle), com os participantes respondendo outro questionário que media suas atitudes a respeito dos homossexuais (seus direitos, senso de moralidade, as emoções que eles sentiam e seus comportamentos) e a respeito da própria masculinidade deles.
No final, contrário a todas as expectativas, os resultados consistentemente indicaram que, em geral, a homofobia e a reafirmação da heterossexualidade eram muito mais fortes no grupo exposto ao comentário de maior e crescente presença da feminidade entre os homens de hoje.
"É um sistema interconectado", explica Juan M. Falomir, líder do novo estudo e professor na Faculdade de Psicologia da Universidade de Genebra, em entrevista para o jornal da Universidade (2). "Ao se diminuir a significância da norma anti-feminista, os homens compensam via enfatização da importância da norma heterossexual. Homofobia é o caminho alternativo para a reafirmação da masculinidade."
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Os pesquisadores também notaram que o aumento da homofobia não é causado diretamente pelo desejo de reafirmar a oposição macho-fêmea ou a dicotomia de gênero. Feminidade não é mais considerado de ser uma característica única nas mulheres desde que os homens estão expressando uma maior sensibilidade e emoções. Mas a aceitação dessa "feminização" dos homens parece estar ocorrendo a custa dos homossexuais, porque a masculinidade estaria sendo agora afirmada mais pela heterossexualidade, mesmo que a orientação sexual não esteja dependente da expressão-comportamento de gênero (nesse caso, está ligada ao esteriótipo de que homossexuais homens são indivíduos mais femininos).
Porém, os pesquisadores reforçaram que esse aumento da homofobia foi visto entre os homens mais tradicionais, conservadores. Os assim chamados "homens modernos" possuem uma melhor percepção dos homossexuais e são menos resistentes a uma sociedade mais igualitária entre homens e mulheres.
Portanto, nesse cenário, a disseminação de ideologias e práticas mais igualitárias de papéis de gênero marcam um progresso de um lado mas podem estar fomentando a homofobia de outro, como vêm sendo visto uma crescente resistência no mundo Ocidental à garantia de direitos aos homossexuais e transgêneros, com grupos conservadores e religiosos subindo ao poder com bandeiras distorcidas contra supostos movimentos que estariam tentando transformar as crianças em gays e forçando-as a mudarem de sexo - a "ameaça" à família imposta por doutrinadores subversivos.
"Quanto mais nós igualamos os gêneros, mais difícil se torna para os 'homens tradicionais' lidarem com essa igualdade e continuarem construindo suas masculinidades. À medida que eles não mais conseguem diferenciar a si mesmos das mulheres [em termos de papéis de gênero], eles passam a ver a homofobia como um caminho para restaurar a virilidade," conclui o professor Falomir.
Publicação do estudo: Sex Roles
(2) Referência adicional: Université de Genève
Sociedades mais igualitárias fomentam a homofobia entre os homens
Reviewed by Saber Atualizado
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janeiro 26, 2019
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