Hipótese evolucionária de 100 anos atrás é ilustrada em detalhes a nível genético
Em 1896, o pesquisador James Mark Baldwin apresentou uma hipótese evolucionária que ficou posteriormente conhecida como 'efeito Baldwin'. Agora, um novo estudo publicado na Current Biology demonstrou esse efeito a nível genético em uma população de lagartos de coloração escura habitantes de áreas desérticas de solo vulcânico.
O lagarto-comum (Uta stansburiana) na maior parte do Deserto Mojave, Califórnia, possui marcas cor de canela e marrons que se misturam bem com o ambiente típico dessa região. No entanto, na área leste desse deserto, na região de Pisgah, existe uma população bem distinta de lagartos-comum, tão pretos quanto as rochas vulcânicas sobre as quais eles vivem.
Nesse sentido, como alguns animais invadem novos ambientes muito diferentes daqueles onde antes eles tinham evoluído e conseguem adaptações tão rapidamente? No caso dos lagartos-comuns com colorações mais claras, como estes conseguiram migrar e sobreviver em um ambiente de rochas e solo bem escuros e escaparem dos predadores - os quais os veriam facilmente, especialmente aves voadoras - por tempo suficiente antes de evoluírem uma coloração e padrões que os camuflassem bem?
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Uma explicação para isso é que vários traços do fenótipo de um animal não são fixos, podendo mudar ao longo do tempo de vida do animal. Essa 'plasticidade fenotípica' permite que espécimes alterem sua aparência ou comportamento o suficiente para sobreviverem no novo ambiente. Eventualmente, novas adaptações promovendo sobrevivência surgem na população a partir de mudanças/mutações genéticas e seleção natural, os quais agem sobre a população ao longo de gerações. Em outras palavras, a plasticidade fenotípica têm sido hipotetizada de preceder e facilitar adaptação em novos ambientes. Esse fenômeno caracteriza o efeito Baldwin. Até o momento, exemplos desse mecanismo de evolução biológica em populações selvagens eram raros e apenas sugestivos, deixando a ideia ainda no campo das hipóteses.
Agora, no novo estudo, pesquisadores documentaram em detalhes anatômicos e genéticos esse processo na população escura de lagartos-comuns habitando o Pisgah, e que estavam vivendo sobre um fluxo de lava solidificada que se formou há cerca de 22500 anos. Eles encontraram que os lagartos vivendo naquela região e fora dela exibiam uma plasticidade fenotípica na coloração e também pareciam ter diferenças hereditárias na pigmentação. No sequenciamento dos exomas de 104 espécimes (indivíduos), foram identificados dois conhecidos reguladores de produção de melanina - PREP e PRKAR1A - que tinham notavelmente aumentado de nível de divergência entre essas duas populações de lagartos (escuros e claros). As variantes derivadas em PREP e PRKAR1A só foram encontradas na população vivendo sob o solo vulcânico e estavam associadas com um aumento de nível de pigmentação em um cohort experimental de lagartos filhotes colocados para se desenvolverem em diferentes ambientes.
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No geral, os resultados do estudo fortemente sugerem que a plasticidade ancestral para a coloração facilitou a sobrevivência inicial no ambiente de solo vulcânico, sendo seguida posteriormente por mudanças genéticas que modificaram o fenotípico na direção de uma resposta plástica induzida, possivelmente através de mutações de novo (1). Essas observações geram sólidas evidências de suporte à hipótese do efeito Baldwin, implicando também que esse processo de plasticidade fenotípica seguida de um refinamento evolutivo via mutações genéticas e seleção natural pode ser um importante e amplamente presente mecanismo de surgimento de novos fenótipos ao longo da diversificação dos animais.
(1) Para entender esse e outros processos de criação de novos genes, acesse o artigo: Como nova informação genética é gerada durante o processo evolutivo?
OBS.: Ainda é incerto o que causa a plasticidade na coloração desses lagartos a partir das informações do ambiente, mas sabe-se que a proteína alfa-MSH possui um papel nesse processo. Isso indica que um possível mecanismo é que sinais visuais são processados no tecido cerebral desse réptil para afetar a produção na glândula pituitária de proopiomelanocortina, a qual é o precursor da alfa-MSH.
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Publicação do estudo: Current Biology
Hipótese evolucionária de 100 anos atrás é ilustrada em detalhes a nível genético
Reviewed by Saber Atualizado
on
setembro 12, 2018
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