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Terapia com popular droga ilegal parece ser efetiva no tratamento de Transtorno de Estresse Pós-Traumático


- Atualizado no dia 6 de outubro de 2023 -

Uma das principais drogas combatidas pela polícia e muito popular em "baladas" é um promissor tratamento farmacológico de pacientes com PTSD (Transtorno de Estresse Pós-Traumático, na tradução do inglês, ou, na sigla em português, TEPT) - muito comum em soldados que atuaram em guerras. Atenção nesse sentido ganhou robusta força em 2017, quando o FDA (Agência de Drogas e Alimentos dos EUA) determinou que a molécula 3,4 - metilenedioximetanfetamina (MDMA) - mais conhecida como a perigosa droga ilegal ´Ecstasy´ - representa um grande avanço terapêutico para o tratamento de PTSD, algo que pode garantir uma rápida aprovação de uso (Ref.1).
Estrutura molecular do ecstasy (MDMA), uma anfetamina sintética anel-substituída. Tornou-se uma droga popular por induzir fortes sentimentos de euforia, empatia e conexão com outras pessoas.

Evidências acumuladas nas últimas 4 décadas têm apontado que o ecstasy pode ser usado como um medicamento, mas o pesado combate à substância tem historicamente dificultado testes clínicos in vivo (humanos e outros animais). Em pessoas com TEPT, quaisquer pequenos gatilhos sensoriais, como um som ou um cheiro, podem trazer traumáticas memórias na forma de vívida experiência, tomando completo controle do corpo e do cérebro. Estudos têm sugerido que o ecstasy pode amenizar a resposta emocional ativada por memórias traumáticas, facilitando o alívio do trauma e recuperação saudável do paciente.

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Em tratamentos sendo conduzidos com o ecstasy, são realizadas várias sessões de psicoterapia e algumas com o paciente sob uso da substância. O MDMA em especial é usado para permitir o terapeuta investigar o trauma associado ao TEPT sem causar estresse emocional no paciente. Antes do sinal verde preliminar do FDA, entre 2011 e 2017, 107 participantes, com TEPT há 17,8 anos na média, foram submetidos à terapia com ecstasy e, 12 meses depois, 61 dos 90 no grupo inicial que ainda estavam disponíveis para análise de resultados primários e secundários não mais exibiam o transtorno (Ref.1). Desde 2017, vários estudos clínicos avaliando o uso de MDMA para o tratamento de TEPT resistente têm trazido resultados muito positivos em vários parâmetros, particularmente remissão durável dos sintomas e prevalência do transtorno. Estudos mais recentes têm indicado que a expansão do uso de terapia MDMA-assistida em pacientes com TEPT crônico e severo forneceria substanciais benefícios de saúde e financeiros (Ref.2-3). 

Sessão terapêutica auxiliada com o uso de MDMA.

Uma revisão sistemática e meta-análise publicada em 2022 no periódico The Journal of Clinical Pharmacology (Ref.4) concluiu que o tratamento de TEPT assistido por MDMA é eficaz e com um razoável perfil de segurança. Enquanto terapia com MDMA mostrou-se, no geral, segura e bem tolerada, bruxismo, ansiedade, nervosismo, dor de cabeça e náusea foram efeitos colaterais comumente reportados. Porém, os pesquisadores alertaram que o uso indiscriminado de MDMA ou uso na ausência de um ambiente psicoterapêutico fortemente controlado possui consideráveis riscos (!).

Um estudo clínico randomizado placebo-controlado e duplo-cego, publicado em 2022 no periódico Journal of Psychiatric Research (Ref.5), incluindo 90 adultos (homens e mulheres), demonstrou que terapia MDMA-assistida reduziu significativamente os sintomas de transtornos alimentares em pacientes com TEPT - duas classes de transtornos psiquiátricos fortemente inter-relacionados - em comparação com o uso de placebo concomitante a psicoterapia.

Resultados de um estudo clínico de Fase 3, reportados em 2022 (Ref.6), mostrou que terapia MDMA-assistida estava associada com uma maior redução no consumo alcoólico de indivíduos com TEPT e não estava associado com um aumento no risco de uso ilícito de substâncias. O estudo de alta qualidade envolveu 90 adultos com TEPT severa. Co-ocorrência de abuso alcoólico e de substâncias ilícitas é comum em pacientes com TEPT, com estimativas de prevalência entre 17% e 46%. Essa co-ocorrência é frequentemente atribuída a automedicação, já que os sintomas do transtorno tipicamente precedem o uso de substâncias visando alívio dos sintomas.

O estudo mais recente, duplo-cego, placebo-controlado e randomizado, e publicado no Nature Medicine (Ref.10), envolveu 104 indivíduos com PTSD moderado a severo: 71% das pessoas recebendo ecstasy (MDMA) junto com terapia perderam o diagnóstico de PTSD, comparado com 48% no grupo de controle [placebo + terapia]. A terapia auxiliada por ecstasy também mostrou funcionar bem para indivíduos com outras doenças mentais concomitantes (ex.: depressão), assim como naqueles com PTSD por muito tempo. Não foi reportadas mortes ou efeitos adversos sérios, e apenas 9% dos participantes abandonaram o estudo (e a maioria no grupo de placebo). Com essa nova evidência clínica, pesquisadores acreditam que o FDA pode aprovar o MDMA para fim terapêutico já em 2024.

A neurofarmacologia do MDMA é complexa, com potentes efeitos sobre a serotonina (5-hidroxitriptamina, 5-HT), dopamina e norepinefrina, assim como a liberação de cortisol, oxitocina, prolactina e vasopressina arginina. No entanto, os mecanismos moleculares e celulares específicos pelos quais a psicoterapia MDMA-assistida reduz os sintomas de TEPT não são ainda bem esclarecidos.

Um estudo clínico de 2022 conduzido em modelos de TEPT (ratos no caso) mostrou que o tratamento com MDMA, pareado com pista-de-trauma, pode modificar ou atualizar a memória traumática original através de processos cerebrais de reconsolidação - e parecem envolver o eixo hipotalâmico-pituitário-adrenal (HPA) e sobre transmissão serotonérgica (Ref.7). O estudo também indicou que o MDMA não possui valor "terapêutico" intrínseco, exceto se administrado pouco antes da indução de memórias traumáticas de gatilho durante o tratamento, trazendo uma atenuação de subsequente sequela comportamental - pelo menos em roedores.

Análise de atividade cerebral em humanos através de MRI funcional mostra que a conectividade insular funcional é fortemente implicada na manifestação do TEPT e da ansiedade, e que ambas as regiões são impactadas pela administração do MDMA (Ref.8). Isso indica que a conectividade funcional na amígdala, hipocampo e ínsula é um potencial alvo da terapia MDMA-assistida. E evidência mais recente apontou que mudanças na metilação de DNA [mecanismo epigenético] no gene NR3C1 estão associadas com os efeitos positivos de terapia MDMA-assistida em pacientes com TEPT severa (Ref.9); esse gene está ligado ao eixo HPA.

Com base nas evidências acumuladas, alguns pesquisadores sugerem que o MDMA atua como um "lubrificante de comunicação" que ajuda as pessoas a recapitularem eventos traumatizantes e conversar sobre esses eventos com os terapeutas sem experienciar vergonha ou horror (Ref.11). Outras evidências apontam que o MDMA aumenta a conectividade social do usuário com outros indivíduos ao redor; no contexto terapêutico, o MDMA pode aumentar a conexão entre um paciente e seu terapeuta, facilitando conversação e ajudando o paciente a se sentir mais confortável sobre se abrir e explorar suas emoções (Ref.12).

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(!) ALERTA: Obviamente, ninguém deve usar ecstasy por conta própria para tratar quaisquer transtornos, já que é uma droga muito perigosa. O tratamento deve ser acompanhado e orientado por profissionais de saúde especializados. Além disso, o uso da substância para fins terapêuticos ainda não foi aprovado, e testes clínicos ainda estão sendo conduzidos para avaliar a segurança (balanço de riscos e benefícios) e doses terapêuticas ótimas.

CRÍTICAS: Existem preocupações em relação aos placebos sendo usados nos estudos clínicos, os quais não são capazes de enganar a maior parte dos pacientes nos testes clínicos (acima de 70% sabem que estão recendo o psicodélico ou o placebo), fato que questiona também a validade do parâmetro "duplo-cego". Outros pesquisadores rebatem alegando que muitos pacientes diferenciam corretamente entre o placebo e o MDMA porque esse último é terapeuticamente muito eficaz, ou seja, os pacientes estariam percebendo uma robusta melhora no quadro de PTSD. Muitos cientistas pedem por melhores controles e avaliações clínicas nos estudos clínicos. Ref.11

CURIOSIDADE: Um estudo publicado em 2018 trouxe fortes evidências para uma possível ligação evolutiva entre o comportamento social de polvos e de humanos. Análises genômicas e experimentos com o MDMA mostraram que certos neurotransmissores responsáveis pelo envio de sinais entre neurônios parecem ter sido conservados no percurso evolucionário. Para mais informações: A "droga de balada" ecstasy produz os mesmos efeitos em humanos e polvos
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REFERÊNCIAS
  1. http://www.sciencemag.org/news/2017/08/all-clear-decisive-trial-ecstasy-ptsd-patients
  2. Avanceña et al. (2022). The Costs and Health Benefits of Expanded Access to MDMA-assisted Therapy for Chronic and Severe PTSD in the USA: A Modeling Study. Clinical Drug Investigation 42, 243–252. https://doi.org/10.1007/s40261-022-01122-0
  3. Marseille et al. (2022). Updated cost-effectiveness of MDMA-assisted therapy for the treatment of posttraumatic stress disorder in the United States: Findings from a phase 3 trial. PLoS ONE 17(2): e0263252. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0263252
  4. White et al. (2022). MDMA-Assisted Psychotherapy for Treatment of Posttraumatic Stress Disorder: A Systematic Review With Meta-Analysis. The Journal of Clinical Pharmacology, Volume 62, Issue 4, Pages 463-471. https://doi.org/10.1002/jcph.1995 
  5. Brewerton et al. (2022). MDMA-assisted therapy significantly reduces eating disorder symptoms in a randomized placebo-controlled trial of adults with severe PTSD. Journal of Psychiatric Research, Volume 149, Pages 128-135. https://doi.org/10.1016/j.jpsychires.2022.03.008
  6. Nicholas et al. (2022). The effects of MDMA-assisted therapy on alcohol and substance use in a phase 3 trial for treatment of severe PTSD. Drug and Alcohol Dependence, Volume 233, 109356. https://doi.org/10.1016/j.drugalcdep.2022.109356
  7. Arluk et al. (2022). MDMA treatment paired with a trauma-cue promotes adaptive stress responses in a translational model of PTSD in rats. Translational Psychiatry 12, 181. https://doi.org/10.1038/s41398-022-01952-8
  8. Singleton et al. (2022). Altered brain activity and functional connectivity after MDMA-assisted therapy for post-traumatic stress disorder. Frontiers in Psychiatry, Volume 13. https://doi.org/10.3389/fpsyt.2022.947622
  9. Lewis et al. (2023). Pilot study suggests DNA methylation of the glucocorticoid receptor gene (NR3C1) is associated with MDMA-assisted therapy treatment response for severe PTSD. Frontiers in Psychiatry, Volume 14. https://doi.org/10.3389/fpsyt.2023.959590
  10. Mitchell et al. (2023). MDMA-assisted therapy for moderate to severe PTSD: a randomized, placebo-controlled phase 3 trial. Nat Med (2023). https://doi.org/10.1038/s41591-023-02565-4 
  11. https://www.nature.com/articles/d41586-023-02886-x
  12. Molla et al. (2023). Drug-induced social connection: both MDMA and methamphetamine increase feelings of connectedness during controlled dyadic conversations. Scientific Reports 13, 15846. https://doi.org/10.1038/s41598-023-43156-0
Terapia com popular droga ilegal parece ser efetiva no tratamento de Transtorno de Estresse Pós-Traumático Terapia com popular droga ilegal parece ser efetiva no tratamento de Transtorno de Estresse Pós-Traumático Reviewed by Saber Atualizado on agosto 28, 2017 Rating: 5

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