Caverna de Enxofre: Cientistas descobrem o que pode ser a maior teia de aranha já descrita
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| Figura 1. Aranha fêmea da espécie Tegenaria domestica na teia colonial da Caverna de Enxofre. Os adultos dessa espécie possuem 7-11 cm de comprimento. Ref.1 |
Em uma caverna na fronteira entre a Albânia e a Grécia, pesquisadores descobriram o que pode ser a maior teia de aranha já descrita. A teia gigante cobre uma superfície superior a 100 metros quadrados (m2) e era habitada por aranhas de duas espécies pertencentes a famílias bem distintas: Tegenaria domestica (Agelenidae) e Prinerigone vagans (Linyphiidae). Análise detalhada da teia colonial - publicada no periódico Subterranean Biology (Ref.1) - estimou mais de 111 mil aranhas habitando a estrutura. Na escuridão da caverna, a "megacidade de aranhas" mostrou ser sustentada por um ecossistema mantido por produtores primários que realizam quimiossíntese, oxidando enxofre como fonte de energia.
"O mundo natural ainda nos reserva inúmeras surpresas", disse em entrevista à Live Science o autor principal do novo estudo, Dr. István Urák, professor de biologia na Universidade Húngara de Sapientia da Transilvânia, na Romênia (Ref.2). "Se eu tentasse descrever em palavras todas as emoções que me invadiram [ao ver a teia], destacaria admiração, respeito e gratidão. É preciso vivenciar para realmente saber como é."
Ecossistemas subterrâneos sulfídicos são sustentados pela produção primária in situ (no local), predominantemente por microrganismos quimioautotróficos oxidantes de enxofre. Esses organismos utilizam o sulfeto de hidrogênio (H2S) como doador de elétrons e o gás oxigênio (O2) como aceptor final de elétrons. A grande quantidade de matéria orgânica resultante desse processo de quimiossíntese sustenta ricas comunidades aquáticas e terrestres de invertebrados, assim como algumas espécies de vertebrados, mesmo sem a presença de luz e fotossíntese.
A caverna em questão onde a teia colonial foi encontrada - chamada de Caverna de Enxofre - é constituída por redes subterrâneas hipogênicas com grandes "salões" e passagens, sendo cortada pelo Rio Sarandaporo. Nascentes localizadas nas profundezas da caverna alimentam um fluxo de água sulfurosa que percorre toda a extensão da passagem cavernosa principal e deságua no rio Sarandaporo, na entrada da caverna. As águas desse fluxo apresentam uma temperatura constante de 26 °C durante todo o ano e uma concentração de H2S de até 65 mg/L. E a atmosfera da caverna alcança concentrações de até 14 partes por milhão (ppm) de H2S.
Os sedimentos do fluxo sulfuroso na caverna são cobertos por biofilmes brancos abundantes e compostos por bactérias filamentosas oxidantes de enxofre (ex.: Beggiatoa spp. e Thiothrix spp.). A fauna aquática associada também é abundante e inclui oligoquetas, gastrópodes, larvas de quironomídeos, larvas e adultos de coleópteros e, ocasionalmente, alguns peixes.
A fauna terrestre na caverna é representada por várias centopeias, isópodes terrestres, pseudoescorpiões, ácaros, escorpiões, aranhas, colêmbolos, mosquitos quironomídeos e besouros. Em relação às aranhas, a enorme teia colonial cobre grande parte de uma parede distante ~50 metros da entrada da caverna, em uma zona permanentemente escura (Fig.2). Os pesquisadores estimaram um total de ~69,1 mil aranhas da espécie T. domestica (dominante) e 42,4 mil aranhas da espécie P. vagans (Fig.3) vivendo na teia, formando uma associação cooperativa de colonialidade. A área total estimada da teia foi de ~106 m2.
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| Figura 3. Fêmea (à esquerda) e macho (à direita) da espécie Prinerigone vagans. Os adultos possuem 2-3 mm de comprimento. Ref.1 |
A T. domestica é uma espécie cosmopolita com distribuição global. De hábitos noturnos, geralmente é encontrada perto de habitações humanas, sob pedras e em locais escuros, como armários e porões. Também é frequentemente encontrada em cavernas. Porém, é a primeira vez que é observado comportamento de agregação e formação de colônia nessa espécie.
A teia colonial na Caverna de Enxofre parece ser o resultado da junção de inúmeras teias individuais em forma de funil (Fig.1), cada uma estrategicamente posicionada em um local com abundante disponibilidade de recursos tróficos (alimentares). A colonização da caverna pelas aranhas T. domestica, e o comportamento de agregação dessas últimas, provavelmente foram fomentados pelos recursos alimentares abundantes representados pelos densos enxames de quironomídeos.
Já as aranhas Prinerigone vagans, coabitando a colônia, não pareciam evocar uma resposta predatória na T. domestica. Segundo especularam os pesquisadores, a ausência de luz prejudica a capacidade de detecção visual de T. domestica, tornando a pequena P. vagans discreta, especialmente considerando a estratégia predatória de emboscada estacionária da P. vagans, com movimentos breves quando as presas estão próximas na teia.
Análises genéticas e microbiológicas conduzidas pelos pesquisadores revelaram que as populações de P. vagans e T. domestica na comunidade colonial eram geneticamente distintas de outras populações típicas desses táxons e exibiam um microbioma distinto, apontando adaptações únicas ao ambiente da caverna.
Além das duas espécies citadas, outros táxons de aranhas também foram descritos habitando a caverna (ex.: Metellina merianae, Kryptonesticus eremita e Lepthyphantes magnesiae), mas construindo teias separadas.
Nas seções mais profundas da caverna, a teia alimentar - conjunto de várias cadeias alimentares interligadas - mostrou se basear na fixação quimiossintética de carbono em biofilmes microbianos terrestres cobrindo as paredes úmidas da caverna. Esses biofilmes são compostos por microrganismos oxidantes de enxofre - que exploram o H2S abundante na atmosfera local. Numerosos espécimes de Graeconiscus sp. (Isopoda, Trichoniscidae) e densas populações de colêmbolos parecem se alimentar desse microbioma das paredes da caverna. Esses animais, por sua vez, aparentemente são a base secundária de sustentação para os predadores diversos na caverna.
REFERÊNCIA
- Urák et al. (2025). An extraordinary colonial spider community in Sulfur Cave (Albania/Greece) sustained by chemoautotrophy. Subterranean Biology 53: 155-177. https://doi.org/10.3897/subtbiol.53.162344
- https://www.livescience.com/animals/spiders/worlds-biggest-spiderweb-discovered-inside-sulfur-cave-with-111-000-arachnids-living-in-pitch-black
Reviewed by Saber Atualizado
on
novembro 07, 2025
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