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Unicef e mais de 50 sociedades científicas emitem notas de repúdio contra o homeschooling

 

A denominada homeschooling ou educação no lar, ou mesmo educação doméstica, é um movimento por meio do qual pais de família, alegando insatisfação com a educação escolar ofertada nos estabelecimentos públicos ou privados, pleiteiam transmissão dos conhecimentos a ser dada em casa. As razões alegadas para tal apontam, em geral, insuficiência da oferta formal de educação escolar, seja por conta de uma baixa qualidade, seja pela violência que ronda ou penetra nos estabelecimentos, seja na liberdade de ensino, enfim, por pressupostos religiosos ou morais. Esse movimento já possui vários adeptos no Brasil e seus seguidores têm pressionando há muito tempo os poderes públicos, em especial os Tribunais, no sentido de legitimar tal opção, inclusive por meio de uma legislação regulamentadora.


Pela atual legislação infraconstitucional Brasileira (Diretrizes e Bases da Educação, lei n. 9.394/96, art. 6º), o maior "dever da família" é o de matricular "as crianças na educação básica a partir dos 4 anos". E a liberdade de ensino da iniciativa privada não se realiza senão em instituições escolares, consoante o artigo 7º da LDB, em razão do art. 209 da Constituição. Nesse mesmo caminho, a prática de educação domiciliar não é permitida no Brasil inclusive por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).


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O movimento pela educação domiciliar ganhou maior força no atual governo Bolsonaro apoiado pela errônea, ignorante e preconceituosa bandeira da "ideologia de gênero" (!), englobada na suposta "doutrinação" da "esquerda comunista" que estaria sendo conduzida em grande parte das escolas. De fato, a educação domiciliar é uma das bandeiras do presidente Jair Bolsonaro e de seus apoiadores, visando provavelmente institucionalizar o 'cabresto político e ideológico' nos filhos de militantes do governo. Nesse contexto, O plenário da Câmara dos Deputados - hoje favorável à base governista - aprovou nesta semana um projeto de lei (PL  3179/12) que autoriza o ensino domiciliar (homeschooling) no Brasil. O PL ainda precisa ser analisado pelo Senado.


(!) Leitura recomendadaO que é a tal da Ideologia de Gênero?


Como resposta à manobra puramente política em uma tema tão importante como a educação básica, várias entidades acadêmicas Brasileiras e o próprio Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) emitiram notas repudiando a aprovação do PL  3179/12 na Câmara.


NOTA DA SBPC (Ref.3)


Em documento, divulgado no dia 19 de maio, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) apelou aos membros do Congresso para que REJEITEM o PL  3179/12. Mais de 50 sociedades científicas subscreveram a carta contra o homeschooling.


Documento na íntegra:


A SBPC apela aos membros do Congresso para que REJEITEM o projeto de lei que autoriza a EDUCAÇÃO DOMICILIAR, também conhecida como “homeschooling”, pelas razões que se seguem:


1) Um dos principais papéis da educação, como se constata da própria etimologia da palavra (ex+ducere = guiar ou conduzir de dentro para fora), é o de preparar crianças e adolescentes para viverem em sociedade e desenvolverem condições de conviver harmoniosa e frutiferamente com seus semelhantes. 


2) Ora, o homeschooling justamente nega, às crianças e adolescentes, essa possibilidade de serem conduzidas para um mundo mais amplo e diverso que a família. 


3) Não restam dúvidas sobre a importância da família na formação dos valores, da autoconfiança e da busca honesta da felicidade. Mas a educação requer uma série de conhecimentos e valores que foram sendo desenvolvidos ao longo dos últimos séculos por profissionais qualificados, em ambientes que permitem a vivência coletiva de crianças e adolescentes. 


4) Além disso, trata-se de uma demanda de relativamente poucos pais. Reportagem do Jornal Nacional, poucos anos atrás, falava em 5 mil pais. A associação dos mesmos alegava que seriam 20 mil. Mesmo assim, num contingente de mais de 35 milhões de matriculados no ensino fundamental e médio, 5 ou 20 mil constituem uma minoria extremamente pequena. Melhor fariam o Governo, e o Congresso, em se debruçarem sobre as agendas que realmente afetam o conjunto inteiro daqueles que, dos 4 aos 17 anos, têm o direito à educação. 


Por estas razões, apelamos pela rejeição do projeto cuja urgência foi ontem aprovada na Câmara de Deputados.


São Paulo, 19 de maio de 2022.


DIRETORIA DA SBPC


Também subscrevem a carta até às 12h30 do dia 20/5:


Associação Brasileira de Antropologia (ABA)


Associação Brasileira de Centros e Museus de Ciência (ABCMC)


Associação Brasileira de Ciência Ecológica e Conservação (ABECO)


Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC Brasil)


Associação Brasileira de Educação em Engenharia (ABENGE)


Associação Brasileira de Educação Musical (ABEM)


Associação Brasileira de Enfermagem – Nacional (ABEN)


Associação Brasileira de Ensino de Biologia (SBenBio)


Associação Brasileira de Estudos Sociais das Ciências e das Tecnologias (ESOCITE.BR)


Associação brasileira de Limnologia (ABLimno)


Associação Brasileira de Literatura Comparada (ABRALIC)


Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (ABRAPEC)


Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial (ABPEE)


Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE)


Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO)


Associação de Linguística Aplicada do Brasil (ALAB)


Associação de Mutagênese e Genômica Ambiental (MutaGen-Brasil)


Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia (ANPEPP)


Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Turismo (ANPTUR)


Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ANPAD)


Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED)


Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Letras e Linguística (ANPOLL)


Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (ANPUR)


Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia (ANPOF)


Federação de Arte Educadores do Brasil (FAEB)


Federação de Sociedades de Biologia Experimental (Fesbe)


Sociedade Astronômica Brasileira (SAB)


Sociedade Brasileira de Biociências Nucleares (SBBN)


Sociedade Brasileira de Biofísica (SBBf)


Sociedade Brasileira de Bioquímica e Biologia Molecular (SBBq)


Sociedade Brasileira de Ecotoxicologia (Ecotox Brasil)


Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM Nacional)


Sociedade Brasileira de Eletromagnetismo (SBMAG)


Sociedade Brasileira de Engenharia Biomédica (SBEB)


Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos (SBEC)


Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual (SOCINE)


Sociedade Brasileira de Física (SBF)


Sociedade Brasileira de Fisiologia Vegetal (SBFV)


Sociedade Brasileira de Genética (SBG)


Sociedade Brasileira de Geologia (SBGeo)


Sociedade Brasileira de Geoquímica (SBGq)


Sociedade Brasileira de História da Ciência (SBHC)


Sociedade Brasileira de Mastozoologia (SBMz)


Sociedade Brasileira de Matemática (SBM)


Sociedade Brasileira de Microbiologia (SBMicro)


Sociedade Brasileira de Paleontologia (SBP)


Sociedade Brasileira de Protozoologia (SBPz)


Sociedade Brasileira de Química (SBQ)


Sociedade Brasileira de Telecomunicações (SBrT)


Sociedade Brasileira de Zoologia (SBZ)


NOTA DO UNICEF (Ref.4)


Brasília, 20 de maio de 2022 – Crianças e adolescentes são sujeitos de direito – e não objetos de propriedade dos pais. Por isso, o UNICEF expressa preocupação com a aprovação pela Câmara de Deputados, na última quarta-feira, 18 de maio, do texto-base do projeto de lei 3179/12, que regulamenta a educação domiciliar. A proposta permite que a educação básica seja oferecida em casa, sob a responsabilidade dos pais ou tutores, excluindo estudantes da escola regular e afastando-os do convívio com educadores e colegas. O projeto segue para avaliação do Senado Federal e, se aprovado, vai à sanção presidencial. O UNICEF pede aos senadores que priorizem o direito de crianças e adolescentes de estar na escola em seus votos.


Passados dois anos de pandemia, torna-se ainda mais urgente garantir que cada criança, cada adolescente volte para a escola e permaneça nela, aprendendo. As consequências da pandemia, e do fechamento das escolas, foram profundas, impactando a aprendizagem, a saúde mental, a nutrição e a proteção contra a violência de milhões de meninas e meninos. Mais de 1,4 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade estão fora da escola (Pnad, 2021), e a eles se somam outros milhões que não conseguiram aprender em casa e voltam para as salas de aula com sérias defasagens de aprendizagem, precisando ainda mais do apoio de bons professores e da escola.


Autorizar a educação domiciliar significa privar crianças e adolescentes do seu pleno direito de aprender. Família e escola têm deveres diferentes e complementares na vida de meninas e meninos. A família é o lugar do cuidado e de aprendizagens não curriculares, dentro de um ambiente privado. A escola é o lugar da aprendizagem curricular e é o principal espaço público em que o estudante interage com outras pessoas, socializa e aprende.


A participação das famílias na escola é fundamental. Pais, mães e responsáveis podem – e devem – participar da construção do projeto pedagógico da escola, participar dos conselhos escolares e contribuir com as principais decisões que impactam a aprendizagem e o dia a dia escolar. Mas não devem substituir a escola na vida dos filhos.


“A escola é fundamental para garantir o direito de crianças e adolescentes à aprendizagem de qualidade, à socialização e à pluralidade de ideias, além de ser um espaço essencial de proteção de meninas e meninos contra a violência. Tirar deles o direito de estar na escola trará prejuízos importantes para crianças e adolescentes”, explica Mônica Dias Pinto, chefe de Educação do UNICEF no Brasil.


O projeto de lei 3179/12 é de autoria do deputado Lincoln Portela (PL-MG) com relatoria da deputada Luisa Canziani (PTB-PR).


Escola como espaço de aprendizagem


A escola é o lugar da educação formal e da aprendizagem – e é organizada para isso. Por mais que as famílias se esforcem, elas não conseguem reproduzir em casa toda a estrutura de uma escola – incluindo educadores formados em didática, metodologias e nos conhecimentos específicos da disciplina, que acompanham a aprendizagem do estudante, trocam entre si, são supervisionados por uma coordenação pedagógica e seguem um currículo conjunto.


A “educação domiciliar” difere do ensino remoto ou híbrido, que foi implementado em parte das escolas durante a pandemia da covid-19. Isso porque, no ensino remoto, famílias apoiam os estudantes em casa, mas a partir de atividades pedagógicas preparadas pelos professores, seguindo o currículo da escola alinhado às referências da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), promulgada em 2017/2018. Na educação domiciliar, a criança não faz mais parte da escola e são os pais que decidem o quê e como ela vai aprender, baseado no conteúdo da BNCC.


Outro aspecto importante é a avaliação do progresso da aprendizagem, que ocorre periodicamente na escola. A lei de educação domiciliar prevê apenas avaliações parametrizadas, que não são capazes de mensurar todas as dimensões do desenvolvimento de competências indicado pela BNCC. Sem um acompanhamento e uma avaliação qualificada próxima e constante, feita por educadores, crianças e adolescentes correm o risco de deixar para trás muitas oportunidades de aprender e desenvolver muitas novas habilidades e competências, comprometendo o presente e o futuro de cada um.


A isso soma-se a fiscalização do ensino domiciliar. O projeto repassa aos conselhos tutelares a responsabilidade de fiscalizar se e como os estudantes estão aprendendo em casa. A medida preocupa, uma vez que coloca a responsabilidade em profissionais que não têm formação para esse tipo de avaliação, e já têm uma série de outras atribuições.


Escola como espaço de socialização


Além da aprendizagem curricular, a escola é o lugar da socialização. Essa socialização com outras crianças e outros adolescentes acontece prioritariamente na escola e é fundamental ao desenvolvimento infantil e adolescente.


A escola é o principal espaço público que a criança e o adolescente frequentam semanalmente e onde podem interagir com uma variedade de meninas e meninos da mesma idade. Por mais que a criança tenha irmãos, esse convívio com colegas faz com que a criança desenvolva a capacidade de dialogar, conviver, respeitar em uma sociedade diversa e plural.


Alguns pais argumentam ter medo do ambiente escolar, de que os filhos sofram bullying, ou tenham que lidar com situações difíceis. Mas não é excluindo a criança do ambiente escolar que esses problemas vão se resolver. Estar na escola, com apoio de educadores e da família, é fundamental para que a criança aprenda a lidar com os conflitos e desenvolva ferramentas para enfrentá-los. Em casos graves, a criança deve ser apoiada pelos professores e outros profissionais de educação, que por sua vez podem acessar outros serviços públicos do Sistema de Garantia de Direitos.


A escola representa um lugar de interações sociais e aprendizagens pela convivência com a diversidade e o respeito à diferença; é ainda o lugar de formação da cidadania, de ampliação de experiências, de encontro com o outro. O fechamento prolongado das escolas durante a pandemia demostrou o impacto negativo de separar as crianças de seus amigos e amigas, e do convívio escolar, causando problemas de saúde mental em milhares de crianças.


Escola como proteção contra a violência


Por fim, a escola é, sempre, um espaço de proteção contra as diversas formas de violência. Grande parte da violência contra crianças e adolescentes acontece dentro de casa, com agressores conhecidos. A escola é parte essencial da rede de proteção, sendo um ambiente seguro em que a criança está em contato com adultos em que confia, que podem ajudá-la. Com a retorno das aulas presenciais, houve um aumento do número de denúncias de violência contra crianças e adolescentes, pois os educadores puderam ter contato com os estudantes e reportar as violências que eles vinham sofrendo fora da escola.


Estar na escola, aprendendo, é um fator crucial de proteção. Crianças e adolescentes fora da escola ou com menos anos de estudo se tornam mais vulneráveis e vítimas da violência.


Escola como espaço de pluralidade de visões


A escola é, também, o lugar da pluralidade de pensamentos. A criança e o adolescente se deparam com diferentes opiniões e visões sobre um mesmo tema, o que é fundamental para que aprendam a refletir e desenvolvam o pensamento crítico.


Para aprender, é necessário que a criança se torne um pensador autônomo, capaz de analisar situações, fatos, argumentos, e tirar as próprias conclusões. Esse desenvolvimento é um direito, e ocorre prioritariamente na escola. Ela possibilita espaços de diálogo, em que a criança coloca seus conhecimentos em xeque, faz experimentos, discute, chega a conclusões e tem liberdade para debatê-las.


Ao deixar a responsabilidade do ensino apenas com a família, a criança não terá acesso a visões e opiniões diversas, não desenvolvendo as habilidades para lidar com elas de uma maneira construtiva e pacífica. Em casa, corre-se ainda o risco de expor a criança e o adolescente a práticas autoritárias e abusivas, visões distorcidas e imprecisas sobre temas mais complexos e possíveis casos de doutrinação.


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> O Unicef é um braço da Organização das Nações Unidas (ONU) que trabalha pela garantia dos direitos das crianças e adolescentes pelo mundo, dando foco aos mais vulneráveis, especialmente aos que são vítimas de violência extrema. 


OBSERVAÇÃO: Vários países adotam o homeschooling como a Noruega, os Estados Unidos, a França, o Canadá, entre outros, e esse modelo pode ser coordenado por instruções de uma escola ou até por diretrizes curriculares oficiais sob a supervisão do Estado. Porém, nesses países existe amplo amparo e fiscalização efetiva do Estado no sentido de garantir que as crianças e adolescentes estejam recebendo ensino de boa qualidade em casa, algo que especialistas consideram utópico no Brasil visto nossa ainda precária situação de desenvolvimento sócio-econômico (Ref.5). A adoção do modelo no nosso país, sem mínimo planejamento e infraestrutura, visando apenas satisfazer interesses políticos, pode agravar nosso já sofrido desempenho educacional. 

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REFERÊNCIAS

  1. Cury, Carlos Roberto Jamil (2019). Homeschooling ou Educação no Lar. Educação em Revista, 35. https://doi.org/10.1590/0102-4698219798
  2. https://g1.globo.com/educacao/noticia/2022/05/19/homeschooling-entenda-o-que-diz-o-projeto-de-lei-aprovado-pela-camara-sobre-ensino-domiciliar.ghtml
  3. http://www.jornaldaciencia.org.br/mais-de-50-sociedades-cientificas-subscrevem-carta-contra-o-homeschooling/
  4. https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/unicef-alerta-para-os-riscos-da-educacao-domiciliar
  5. Follone & Heringer (2021). Homeschooling no Brasil: Realidade ou Utopia?. VI Congresso Internacional de Direitos Humanos de Coimbra, v. 6, n. 1 (Simpósio Temático 29)

Unicef e mais de 50 sociedades científicas emitem notas de repúdio contra o homeschooling Unicef e mais de 50 sociedades científicas emitem notas de repúdio contra o homeschooling Reviewed by Saber Atualizado on maio 22, 2022 Rating: 5

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