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Pessoas completamente paralisadas voltam a andar e ratos paralisados são curados com novos implantes


Dois importantes e pioneiros estudos foram publicados hoje no campo da medicina que tenta devolver movimentos para pessoas que perderam a capacidade de sentir os membros inferiores por causa de lesões na medula espinhal. No primeiro, publicado na Nature Medicine (Ref.1), pesquisadores otimizaram um implante baseada em estimulação elétrica epidural (EES) e o testaram em três pessoas com completa paralisia sensorimotora: dentro de um dia, a nova estratégia neurotecnológica permitiu aos três indivíduos movimentarem as pernas e dar alguns passos e, em alguns meses, a se levantarem por conta própria, andar livremente em ambiente externo com apoios, andar de bicicleta, nadar e controlar movimentos do tronco. No segundo estudo, publicado no periódico Advanced Science (Ref.2), pesquisadores usaram células humanas pluripotenteS induzidas para criar tecido tridimensional (3D) da medula espinhal; quando o tecido geneticamente engenhado foi implantado em ratos usados como modelos humanos de paralisia crônica, 80% deles recuperaram a habilidade de andar. 


ASSISTÊNCIA NEUROTECNOLÓGICA


Lesão traumática na medula espinhal possui um impacto imediato e catastrófico no controle de movimentos e em todos os aspectos da saúde e da qualidade de vida do paciente. A medula espinhal é uma estrutura longa, fina e tubular constituída de tecido nervoso que se estende da medula oblongata no cerebelo até a região lombar da coluna vertebral. A função desse longo tubo nervoso - com uma extensão média de 43-45 cm - é primariamente a transmissão de sinais nervosos do córtex motor para o corpo, e das fibras aferentes dos neurônios sensoriais para o córtex sensorial, além de controlar vários movimentos automáticos de reflexo.


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Três décadas de pesquisa clínica e pré-clínica têm mostrado que estimulação elétrica epidural (EES) aplicada sobre medula espinal lombossacral pode restaurar a capacidade de andar após uma lesão espinhal. Alguns dos indivíduos tratados com completa paralisia motora podem até mesmo andar de forma livre, com a ajuda de EES, após vários meses de intenso treino quando auxiliados por múltiplos terapeutas físicos. Porém, para tornar esse tipo de neurotecnologia uma realidade na prática clínica, são necessários melhoramentos que permitam a rápida recuperação de numerosas atividades motoras com o mínimo de recursos humanos e aplicação universal, englobando pacientes diversos com necessidades diversas.




Os implantes EES recrutam fibras aferentes de grande diâmetro a partir da entrada na medula espinhal através das raízes dorsais. O recrutamento dessas fibras leva à ativação de neurônios motores embebidos no segmento espinhal enervado pela raiz onde essas fibras residem. Nesse sentido, o recrutamento de raízes dorsais individuais permitem a modulação de conjuntos específicos de neurônios motores. Esse princípio biológico guia o desenvolvimento de programas computacionais EES que visam as raízes dorsais individuais com um tempo de resposta pré-definido para reproduzir os padrões naturais de ativação espaço-temporal de neurônios motores durante o processo de andar. Esses programas de estimulação biomiméticos têm promovido superior recuperação motora após lesão na medula espinhal  em relação ao simples uso de EES. Porém, esse ganho de funcionalidade ainda limita seu uso na prática clínica.


No novo estudo, os pesquisadores desenvolveram um dispositivo EES-baseado com um novo arranjo de eletrodos visando todo o conjunto de raízes dorsais envolvidas nos movimentos das pernas e parte inferior do tronco. Eles hipotetizaram que essa estratégia resultaria em uma eficácia superior, restaurando mais atividades motoras diversas em indivíduos com severas lesões na medula espinhal. Para otimizar o implante cirúrgico do dispositivo nos pacientes, os pesquisadores também desenvolveram modelos computacionais combinando imagens de alta resolução estrutural e funcional. Por fim, eles também desenvolveram um software para suportar rápida, simples e previsível configuração de programas de estimulação biomimética. 


Para testar o novo dispositivo, os pesquisadores recrutaram três indivíduos com completa paralisia sensorimotora crônica (de longo prazo) - causada por severa lesão espinhal em acidentes com moto - como parte de um teste clínico ainda em andamento. Dentro de 1 dia, programas de estimulação atividade-específicos permitira.m que esses três indivíduos realizassem várias atividades motoras complexas antes impossibilitadas pela paralisia, como ficar de pé a partir de esforço próprio e dar alguns passos com apoios fixos e móveis; dentro de 6 meses, eles já eram capazes de andar livremente com o auxílio de muletas, controlar movimentos do tronco, andar de bicicleta e até mesmo nadar. No vídeo abaixo, produzido pela BBC (Ref.3), um dos participantes recuperados com o novo implante EES pode ser observado realizando atividades diárias diversas.

 

Apesar dos três participantes terem sido capazes de andar com esforço próprio e sem auxílio de outras pessoas, os pesquisadores apontaram que eles não reganharam movimentos naturais. A ativação de movimentos é feita de forma discreta, sendo necessários comandos via Bluetooth a partir de um aparelho colocado ao redor da cintura, próximo de um "gerador de pulsos" implantado no abdômen, os quais, então, ativam os eletrodos no implante espinhal. Para cada tipo de movimento (andar, levantar, nadar, etc.), comandos específicos devem ser selecionados manualmente no aparelho, um processo que leva de 5 a 10 minutos para ser estabelecido. A próxima geração de dispositivos está sendo desenvolvida para permitir comandos de voz a smartwatchs, agilizando e tornando mais prático o processo (Ref.4).


De qualquer forma, a recuperação observada foi suficiente para a realização de várias atividades por extensivos períodos de tempo. Além disso, dois participantes conseguiram modular movimentos das pernas não dependentes dos programas EES, sugerindo que o implante estimulou e recuperou sinais de caminhos nervosos residuais ainda preservados na região de lesão espinhal (fibras nervosas que sobreviveram à lesão mas que permaneceram sem funcionalidade devido à hipoatividade abaixo da região lesionada); a recuperação de ativação muscular volicional sem o EES seguindo os esforços de neuro-reabilitação também reforçaram essa sugestão.


O novo implante EES otimizado já foi testado em 9 indivíduos até o momento, exibindo grande sucesso de reabilitação. Segundo os pesquisadores, para escalar esses implantes a nível global será necessário ainda auxílio de inteligência artificial para fornecer suporte nas intervenção neurocirúrgicas em diferentes clínicas ao redor do mundo independentemente de grupos de pesquisa mais especializados nesse tipo de neurotecnologia. Avanços sendo testemunhados em algoritmos de aprendizado e computação de nuvem podem, em breve, permitir essa transição.


Importante também lembrar que os implantes EES-baseados não representam uma cura para as lesões de medula espinhal. São uma ferramenta de auxílio para melhorar a vida dos pacientes e torná-los mais independentes, devolvendo movimentos e sensações antes impossíveis. Cura nesse sentido seria provavelmente através do uso de células pluripotentes para regenerar a medula espinhal danificada. 



UM PASSO PARA A CURA


Nesse último ponto, vários grupos de pesquisa têm explorado estratégias baseadas em terapia celular visando a regeneração da medula espinhal, devolvendo controle natural e completo de movimentos e sensações em pacientes paralisados.


O trauma primário de lesões espinhais causa dano direto, o qual frequentemente leva à morte de células, disrupção da barreira sangue-medula espinhal, e degradação da matriz extracelular. Esses processos iniciam uma cascata de danos pró-inflamatórios secundários, os quais levam a um progressivo dano tecidual resultando na formação de uma cicatriz glial. Apesar de tecido neural saudável ao redor do local da lesão conter pistas que podem promover o reparo tecidual, a falta de um microambiente permissivo para o crescimento celular na cicatriz, junto com a ausência de moléculas axonais guias secretadas pela matriz extracelular - como netrinas e proteínas de fenda - resulta em um potencial muito baixo de regeneração intrínseca e em permanente disfunção neural.


Para piorar, com o tempo, a área lesionada se expande, complicando a habilidade para uma regeneração natural ou via intervenção. Esse processo crônico de degradação é observado na maioria dos pacientes que vivem hoje paralisados.


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Visando regenerar a medula espinhal lesionada, pesquisadores têm sugerido uma variedade de estratégias terapêuticas, incluindo em particular o transplante de diferentes tipos celulares ou biomateriais para o local da lesão na fase aguda (pouco tempo depois do acidente), e o implante de células de Schwann, células-tronco neurais, células neurais progenitoras ou células-tronco mesenquimais. No entanto, essas estratégias possuem dois grandes obstáculos: a resposta imune contra células alogênicas ou xenogênicas - o que pode promover rejeição celular - e a implantação de células dissociadas, não organizadas em uma rede funcional (ex.: células-tronco diferenciadas em células nervosas no local da lesão mas dispostas de forma a não estabelecer coerente sinalização nervosa).


Para superar o risco de rejeição e unir as duas estratégias terapêuticas, células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs) têm sido empregadas. Nessa alternativa terapêutica, células somáticas (diferenciadas) de um paciente são reprogramadas para se tornar pluripotentes (capazes de se transformarem em qualquer tecido) e então diferenciadas para a linhagem celular desejada.


No novo estudo publicado na Advanced Science, pesquisadores da Universidade de Tel Aviv, Israel, desenvolveram um protocolo iPSCs-baseado de diferenciação neuromotora em um microambiente dinâmico 3D, fornecendo às células não apenas pistas de diferenciação mas também sinais para a formação natural e apropriada de tecido nervoso, ou seja, simulando um desenvolvimento embrionário da medula espinhal. 


A neurotecnologia proposta, na prática, é baseada na biópsia de um pequeno pedaço de tecido gorduroso da barriga do paciente alvo. Esse tecido, como todos os tecidos do nosso corpo, consistem de células agrupadas com uma matriz extracelular (englobando substâncias como colágenos e açúcares). Após separar as células da matriz extracelular, os pesquisadores usaram engenharia genética para reprogramar as células, revertendo-as para um estado lembrando células-tronco embrionárias, capazes de ilimitado potencial de diferenciação. A partir da matriz extracelular, foi produzido um hidrogel personalizado, o qual não é capaz de evocar respostas imunes ou rejeição após o implante. As células-tronco foram, então, encapsuladas nesse hidrogel, com subsequente formação de redes neuronais contendo neurônios motores (células-tronco já diferenciadas), em um processo que imita o desenvolvimento embriônico da medula espinhal e evita desorganização celular.


Os implantes espinhais 3D foram então colocados em modelos laboratoriais (ratos modificados) de humanos com lesões na medula espinhal, divididos em dois grupos: aqueles que estavam apenas recentemente paralisados (modelo agudo) e aqueles já paralisados por um longo tempo (modelo crônico), equivalentes a humanos paralisados por um ano. Seguido o implante, 100% dos ratos no modelo agudo e 80% dos ratos no modelo crônico - e de maior interesse clínico - reganharam a habilidade de andar.



Após um rápido processo de reabilitação, os ratos que receberam o novo implante já eram capazes de andar relativamente bem e sem qualquer auxílio mecânico. É o primeiro exemplo no mundo de tecidos humanos geneticamente engenhados capazes de recuperar modelos crônicos de paralisia espinhal. Se traduzido bem para humanos, o novo avanço pode reabilitar milhões de pessoas que estão há anos ou décadas paralisadas, permitindo a regeneração de tecido espinhal danificado sem risco de rejeição. Os pesquisadores envolvidos no estudo já estão em tratativas com o FDA Norte-Americano para iniciar testes clínicos em humanos.


REFERÊNCIAS

  1. Rowald et al. (2022). Activity-dependent spinal cord neuromodulation rapidly restores trunk and leg motor functions after complete paralysis. Nature Medicine. https://doi.org/10.1038/s41591-021-01663-5 
  2. Dvir et al. (2022). Regenerating the Injured Spinal Cord at the Chronic Phase by Engineered iPSCs-Derived 3D Neuronal Networks. Advanced Science, 2105694. https://doi.org/10.1002/advs.202105694
  3. https://www.bbc.com/news/science-environment-60258620
  4. https://www.science.org/content/article/next-generation-spinal-implants-help-people-severe-paralysis-walk-cycle-and-swim


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