Medicamento da Pfizer reduz em 89% o risco de hospitalização ou morte por COVID-19, anuncia empresa
Em anúncio dado hoje (05/11) (Ref.1), a Pfizer reportou alta eficácia de um medicamento oral antiviral combinado (PAXLOVID) contra o novo coronavírus constituído de dois fármacos: PF-07321332 e ritonavir. Análise interina de um teste clínicos de Fase 2/3, envolvendo pacientes de alto risco para a COVID-19 não-hospitalizados, mostrou que o medicamento reduziu o risco de hospitalização ou morte em 89% quando comparado com placebo. Na população geral do estudo clínico, ao longo de um período de acompanhamento de 28 dias, nenhuma morte foi registrada naqueles tomando o PAXLOVID, enquanto que 10 mortes foram registradas nos pacientes que receberam placebo. Devido à alta eficácia do medicamento, a Pfizer agora planeja submeter os dados à Agência de Drogas e Alimentos dos EUA (FDA) para autorização o mais rápido possível de uso emergencial.
PAXLOVID (Mecanismo farmacológico)
As organizações genômicas do novo coronavírus (SARS-CoV-2) e do MERS-CoV (responsável pela doença respiratória MERS) são similares e ambos os vírus possuem dois polipeptídeos, pp1 e pp1ab. Esses polipeptídeos são processados em proteínas não-estruturais que atuam como parte fundamental na replicação desses vírus, e todo o processo é mediado por dois tipos de essenciais proteases: protease similar à 3-quimotripsina (3CLpro) e proteases similares à papaína. Proteases são enzimas que promovem a clivagem - através de hidrólise - de ligações peptídicas presentes em proteínas e polipeptídeos.
A 3CLpro, também chamada de protease principal, consiste de 306 resíduos de aminoácidos, e é conhecida de clivar em 11 locais suas poliproteínas alvos. O local substrato-ligante da 3CLpro contém quatro sublocais (S1′, S1, S2, e S4), é altamente conservado entre todos os coronavírus e é essencial para a multiplicação do SARS-CoV-2 dentro do hospedeiro. Um antagonista da 3CLpro será altamente específico ao SARS-CoV-2 e terá mínimos efeitos colaterais devido ao fato dessa protease não compartilhar homologia com nenhuma protease humana. Devido ao papel essencial da 3CLpro na transcrição e na replicação do genoma viral e forte conservação dos resíduos de ligação associados, essa protease é considerada um alvo ideal de medicamentos contra o SARS-CoV-2 e outros coronavírus.
Nesse sentido, no dia 6 de abril deste ano, durante um encontro da Sociedade Americana de Química, a Pfizer revelou a estrutura da molécula PF-07321332, representando um promissor inibidor da protease 3CLpro e uma ferramenta farmacológica para prevenir o desenvolvimento progressão da COVID-19 em pessoas expostas ao SARS-CoV-2 (Ref.2). O PF-07321332 é o primeiro inibidor de protease oral visando o SARS-CoV-2 e com potente ação antiviral demonstrada in vitro. Os inibidores de protease atuam interagindo com a protease alvo e bloqueando sua habilidade de clivar polipeptídeos.
O PF-07321332 é administrado em combinação com baixas doses do antiviral ritonavir como um reforço para aumentar os níveis sanguíneos do primeiro.
ANÚNCIO DA PFIZER
No teste clínico de Fase 2/3 (!) conduzido pela Pfizer para avaliar a eficácia do PAXLOVID (PF-07321332 + ritonavir) em humanos infectados, indivíduos foram recrutados da América do Sul, América do Norte, Europa, África e Ásia, 45% deles oriundos dos EUA. Os participantes (1219 adultos na análise primária dos dados interinos) tinham um diagnóstico confirmado em laboratório de infecção com o SARS-CoV-2, dentro de um período de 5 dias com sintomas leves a moderados, e tinham pelo menos uma característica ou condição médica associada com um aumento de risco para o desenvolvimento de COVID-19 severa. Cada participante-paciente foi aleatoriamente (1:1) colocado ou em um grupo para receber o PAXLOVID ou em um grupo para receber um placebo.
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(!) EPIC-HR (Evaluation of Protease Inhibition for COVID-19 in High-Risk Patients, "Avaliação da inibição de Protease para a COVID-19 em Pacientes de Alto Risco") é um estudo clínico randomizado, duplo-cego, placebo-controlado, ou seja, de alta qualidade.
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Analisando os dados clínicos interinos do teste clínico para pacientes tratados dentro de 3 dias seguindo a manifestação de sintomas, os pesquisadores encontraram uma redução de 89% no risco de hospitalização ou de morte por qualquer causa no grupo recebendo o PAXLOVID em comparação com o grupo recebendo placebo. Ao longo de 28 dias de acompanhamento, 0,8% dos pacientes que receberam PAXLOVID foram hospitalizados (3 de 389, sem nenhuma morte) comparado a 7,0% dos pacientes que receberam placebo (27 de 385 foram hospitalizados, com 7 mortes subsequentes). A significância estatística dos resultados foi alta (p<0.0001).
Para pacientes tratados dentro de 5 dias seguindo a manifestação de sintomas, os resultados foram similares. No caso, 1,0% dos pacientes que receberam o PAXLOVID foram hospitalizados ao longo de 28 dias de acompanhamento (6 de 607 hospitalizados, sem nenhuma morte) comparado a 6,7% dos pacientes que receberam um placebo (41 de 612 hospitalizados, com 10 mortes subsequentes). Na população geral de pacientes analisados ao longo de 28 dias, nenhuma morte foi reportada nos pacientes que receberam o PAXLOVID, comparado a 10 mortes (1,6%) nos pacientes que receberam placebo.
O estudo clínico planejava recrutar 3 mil pacientes, mas devido aos notáveis resultados positivos, a Pfizer decidiu interromper os testes clínicos e apresentar os dados clínicos interinos ao FDA visando uma autorização de uso emergencial nos EUA.
Em relação à segurança do PAXLOVID (riscos à saúde), os pesquisadores analisaram dados clínicos de 1881 pacientes do EPIC-HR. Os resultados mostraram que a taxa de eventos adversos foi similar entre o grupo placebo (21%) e o grupo PAXLOVID (19%), a maior parte leve em intensidade. No geral, o medicamento foi bem tolerado e parece seguro à saúde humana, como era teoricamente esperado.
Caso os resultados sejam corroborados por outros estudos clínicos de alta qualidade, existe potencial no uso de PAXLOVID para evitar a hospitalização de até 9 de 10 casos de infecção pelo SARS-CoV-2 e para salvar inúmeras vidas, independentemente das variantes de preocupação circulantes (já que o alvo do medicamento é altamente conservado nos coronavírus). Aliás, o medicamento pode ser crucial em um incerto cenário futuro de evolução viral do SARS-CoV-2.
REFERÊNCIAS
- https://www.pfizer.com/news/press-release/press-release-detail/pfizers-novel-covid-19-oral-antiviral-treatment-candidate
- Ahmad et al. (2021). Exploring the Binding Mechanism of PF-07321332 SARS-CoV-2 Protease Inhibitor through Molecular Dynamics and Binding Free Energy Simulations. International Journal of Molecular Sciences, 22(17), 9124. https://doi.org/10.3390/ijms22179124
- Moro et al. (2021). Supervised Molecular Dynamics (SuMD) Insights into the mechanism of action of SARS-CoV-2 main protease inhibitor PF-07321332. Journal of Enzyme Inhibition and Medicinal Chemistry, Volume 36, Issue 1. https://doi.org/10.1080/14756366.2021.1954919
- Procacci et al. (2021). Characterization of the non-covalent interaction between the PF-07321332 inhibitor and the SARS-CoV-2 main protease. Journal of Molecular Graphics and Modelling, Volume 110 (January 2022). https://doi.org/10.1016/j.jmgm.2021.108042