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Cientistas argumentam que encontraram a primeira planta eussocial, vivendo como formigas e cupins

- Atualizado no dia 28 de fevereiro de 2024 -


Em um estudo publicado em 2021 no periódico Ecology (1), pesquisadores encontraram que uma espécie de samambaia nativa da Australásia (região que inclui a Austrália, a Nova Zelândia, a Nova Guiné e algumas ilhas menores da parte oriental da Indonésia) pode ser o primeiro exemplo conhecido de uma planta que exibe um tipo de organização social, no caso, uma planta exibindo eussocialidade assim como formigas e cupins.


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Epifitismo é uma relação de inquilinismo entre duas plantas ou algas, na qual uma planta (epífita) vive sobre a outra (forófito), explorando apenas apoio -  sem relação de parasitismo (retirada de nutrientes) - e sem estabelecer contato com o solo. É uma relação ecológica bem comum em florestas tropicais e um dos exemplos mais conhecidos são as samambaias (plantas vasculares pteridófitas). As plantas epífitas estão sujeitas regularmente a forte estresse nutricional e severa escassez de água, e como resposta adaptativa essas plantas expressam uma variedade de traços fenotípicos para mediar a baixa oferta de água e de nutrientes, incluindo folhas na forma de copo (Bromeliaceae) e raízes com tecidos especializados (Orchidaceae).


Eussocialidade é uma notória transição evolutiva de individualidade para comunidade, e descreve espécies que (I) vivem em colônias englobando gerações sobrepostas de adultos, (II) dividem o trabalho em grupos reprodutivos e não-reprodutivos, e (III) cuidam de forma cooperativa dos filhotes. A eussocialidade tem evoluído de forma independente em crustáceos, insetos e até mesmo mamíferos (!). No entanto, fora do Reino Animal, não é conhecido nenhum outro exemplo de eusocialidade, ou qualquer outro tipo de organização social.


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No novo estudo, os pesquisadores resolveram investigar se a espécie de samambaia Platycerium bifurcatum - a qual vive em colônias, e onde notavelmente diferentes indivíduos realizam diferentes tarefas para a coleta mais eficiente de recursos - resolveu o problema da escassez de nutrientes e água ao formar uma relação cooperativa de eussocialidade. Para isso, espécimes da Ilha de Lord Howe - uma pequena ilha vulcânica localizada a 600 km ao leste da Austrália, no Mar da Tasmânia - foram analisadas, em especial quanto à história de vida da espécie.


Em (A-B), Platycerium bifurcatum adulto sobre uma árvore (Melia azedarach), em Mount Eden, Nova Zelândia. Em (C), plantas juvenis naturalmente estabelecidas sobre uma M. azedarach em Sandringham, Nova Zelândia, e (D) sobre uma parede de escoria em Mount Eden. A P. bifurcatum é uma das 15 espécies do gênero Platycerium e é distinta por formar colônias clonais através de reprodução assexual (a maioria das espécies do gênero são solitárias). Densas colônias são efetivas em superar os vários fatores de estresse do habitat epifítico - aumentando também potencial de invasão - e rametas individuais exibem diferentes morfologias e funções. Colônias podem se estabelecer em superfícies verticais de árvores diversas (com tronco fissurado ou cascas  com rachaduras) e sobre paredes de escória. Ref.3


Nas florestas secas da ilha, a P. bifurcatum - popularmente conhecida aqui no Brasil como chifre-de-veado - cresce em colônias penduradas no tronco de árvores, variando em tamanho de 6 a 58 indivíduos (média em torno de 25). As plantas adultas dentro das colônias produzem dois tipos de folhagem. "Folhagem de armadilha", com folhas longas, estreitas, de longa vida, e fotossinteticamente ativas, e cuja crucial função é canalizar água e nutrientes para o núcleo do grupo. Algumas dessas folhas são também reprodutivamente ativas. Por outro lado, "folhagem de ninho" são sempre reprodutivamente inativas e mais circulares no formato, com uma superfície cerosa e aversiva a água (hidrofóbica), e parecem defletir água e resíduos das folhas para o 'ninho' abaixo.


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As análises mostraram que as colônias da P. bifurcatum claramente compartilham características com as colônias de animais eussociais. Essas colônias eram compostas de indivíduos próximo-relacionados que formam castas morfologicamente distintas com diferentes funções. Quando os pesquisadores quantificaram a absorbência de folhagens de ninho de 10 diferentes colônias, eles encontraram que aquelas crescendo no fundo possuíam tecidos mais grossos e mais absorventes do que aqueles no topo. Nesse sentido, samambaias no topo pareciam ser capturadoras de água e nutrientes, e, aquelas embaixo, pareciam armazenar água. Uma forte evidência de separação de tarefas.


Ao analisarem de forma aleatória as colônias, os pesquisadores encontraram que aproximadamente 40% das folhagens de armadilha eram completamente inativas em termos reprodutivos, fornecendo uma forte evidência de divisão do trabalho reprodutivo. Essa divisão do trabalho reprodutivo - tipicamente uma rainha reprodutiva, e trabalhadores e soldados não-reprodutivos - é um clássico critério de eusocialidade. Análise de DNA das 10 colônias mencionadas confirmaram que a maioria delas continha indivíduos geneticamente idênticos, apesar de duas terem apresentado mais de um genótipo.


E como temos samambaias individuais mais velhas e seus clones mais novos ("filhotes") vivendo juntas compartilhando água e nutrientes, temos duas outras exigências atendidas: sobreposição de gerações e cuidado dos filhotes.


Somados todos os achados, nos deparamos com mais uma surpresa na Biologia Evolutiva: primitiva eussocialidade em plantas, uma complexa organização social antes pensada existir apenas em animais. Os pesquisadores agora planejam estudar um número maior de colônias da samambaia eussociável para confirmar a hipótese e melhor entender os processos evolutivos envolvidos (!). Mas os autores do estudo reforçam que, claramente, existe uma relação eussocial em algum sentido da palavra nessa espécie.


(!) ATUALIZAÇÃO 


Em um paper subsequente publicado também em 2021 no periódico Plant Signaling & Behavior (Ref.), o autor principal do estudo prévio sobre a eussocialidade da Platycerium bifurcatum, Dr. Kevin C. Burns, da Universidade de Wellington, Nova Zelândia, explorou potenciais vantagens seletivas da evolução de eussocilidade nessa samambaia.


Sem acesso ao solo da floresta, plantas epifíticas são regularmente sujeitas a estresses envolvendo escassez de água e nutrientes. A samambaia P. bifurcatum parece ter resolvido esse problema ao evoluir características eussociais, permitindo o armazenamento comunitário de água e nutrientes. E, segundo a análise de Burns, essas características parecem ser uma amálgama de traços especializados observados em outras espécies solitárias de Platycerium, otimizando o sistema de captura de água e nutrientes. De fato, enquanto as espécies solitárias podem ser facilmente classificadas em dois tipos morfológicos gerais (Tipo I e Tipo II) que lidam de forma diferente com o estresse de água, a P. bifurcatum desafia essa classificação simples. Combinações de diferentes morfologias de folhagens e de especializações visando o mesmo fim (maior disponibilidade de água e/ou nutrientes) eventualmente resultaram em um táxon com características mistas amarradas por um modo colonial de desenvolvimento.


Isso sugere que a evolução organismos vivos organizados em colônias (animais e plantas) pode estar ligada a especializações únicas observadas em diferentes espécies e que podem ser otimizadas para o mesmo objetivo caso sejam agrupadas.


REFERÊNCIAS 

  1. Burns et al. (2021). "Primitive eusociality in a land plant?" Ecology, Volume 102, Issue 9, e03373. https://doi.org/10.1002/ecy.3373  
  2. http://blog.pnas.org/2021/06/a-popular-household-fern-may-be-the-first-known-eusocial-plant/
  3. Wu & Brock (2023). The invasion of non-native epiphyte Platycerium bifurcatum in Auckland’s urban forest canopy. New Zealand Journal of Ecology, 47(1): 3542.
  4. Burns, K. C. (2021). On the selective advantage of coloniality in staghorn ferns (Platycerium bifurcatum, Polypodiaceae). Plant Signaling & Behavior, Volume 16, Issue 11. https://doi.org/10.1080/15592324.2021.1961063
Cientistas argumentam que encontraram a primeira planta eussocial, vivendo como formigas e cupins Cientistas argumentam que encontraram a primeira planta eussocial, vivendo como formigas e cupins Reviewed by Saber Atualizado on junho 19, 2021 Rating: 5

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