Doença do refluxo gastroesofágico está associada a um elevado risco de câncer no esôfago e na laringe
Estudos nos últimos anos têm sugerido que a doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) está ligada com um aumento de risco para cânceres escamosos na laringe e no esôfago. Porém, esses estudos possuem significativas limitações metodológicas e de grupos de controle. Agora, um robusto estudo prospectivo, e publicado no periódico CANCER (1) da Sociedade Americana de Câncer, trouxe forte evidência reforçando que a DRG parece estar, de fato, ligada com o risco de vários cânceres da laringe e do esôfago.
A DRGE é uma das mais prevalentes desordens gastrointestinais, sendo um fator de risco primário para o adenocarcinoma esofágico - adenocarcinoma é um tipo de câncer derivado de células glandulares epiteliais secretoras. Aqui no Brasil, a doença afeta cerca de 12% da população. Os possíveis mecanismos carcinogênicos do refluxo no esôfago inclui efeitos diretos do suco gástrico ácido e de outros conteúdos do estômago (enzimas como a pepsina, bile, fluído do intestino delgado) e das secreções pancreáticas - todos os quais podem potencialmente causar danos nas mucosa esofágica - ou efeitos indiretos sobre a formação de compostos N-nitrosos, os quais também podem ser relevantes para o tecido do trato aerodigestivo superior (ex.: laringe) exposto ao conteúdo refluxado do estômago.
No novo estudo, os pesquisadores prospectivamente - análise observacional de acompanhamento futuro - analisaram os dados médicos de 490605 adultos a partir de um banco de informações do Instituto Nacional de Câncer, parte dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA (NIH). Os adultos incluídos na análise tinham idade entre 50 e 71 anos, e estavam vivendo em diferentes estados Norte-Americanos, incluindo Califórnia, Flórida e Louisiana. Do total, estimou-se que próximo de 24% tinham um histórico de DRGE.
Os quase 491 mil adultos eram participantes de um estudo chamado de NIH-AARP Diet and Health Study, este o qual acompanhou esses indivíduos por 16 anos, com início em meados da década de 1990. Os pesquisadores no novo estudo encontraram que, durante esse período de acompanhamento, 931 dos adultos desenvolveram adenocarcinoma esofágico, 876 desenvolveram carcinoma laríngeo de células escamosas, e 301 desenvolveram carcinoma esofágico de células escamosas. Entre esses casos, pessoas com DRGE estavam associadas com um risco em torno de 2 vezes maior de desenvolver cada um desses tipos de câncer, e o elevado risco mostrou-se similar ao longo de vários grupos categorizados pelo sexo, uso de cigarro e pelo consumo alcoólico. O aumento de risco corrobora uma meta-análise recente que encontrou um risco 2,37 vezes maior para o carcinoma laríngeo de células escamosas entre indivíduos com DRGE (2).
Nesse sentido, os pesquisadores estimaram que aproximadamente 17% dos casos de cânceres de laringe e de esôfago na amostra analisada estavam associados com a DRGE.
Apesar do estudo não ser conclusivo, a nova evidência coloca mais peso de alerta para pessoas com DRE, especialmente aqueles indivíduos com outros fatores de risco para cânceres do trato gastrointestinal superior, incluindo idade avançada, obesidade, fumo e frequente consumo alcoólico. Mais recentemente, foi estabelecido também o consumo de bebidas quentes como um importante fator de risco para o desenvolvimento de câncer no esôfago (3).
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> A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) é uma das mais importantes afecções digestivas, tendo em vista as elevadas e crescentes incidências, a intensidade dos sintomas e a gravidade das complicações. É definida como sendo a condição que se desenvolve quando o refluxo do conteúdo gástrico causa sintomas e ou complicações. É uma das causas mais frequentes de consultas gastroenterológicas em pacientes ambulatoriais, comprometendo de forma significativa a qualidade de vida dos seus portadores. Os sintomas típicos relatados pela maioria dos pacientes são pirose e regurgitação ácida. A pirose é definida como sensação de queimação retroesternal que se irradia do manúbrio esternal até a base do pescoço. Ela ocorre em geral 30-60 min após a ingestão de alimentos, especialmente se a refeição for copiosa, ou rica em gordura ou ácido, podendo ser aliviada após a ingestão de antiácido, ou mesmo água. A regurgitação ácida é o retorno do conteúdo ácido até a cavidade oral.
> Para mais informações: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-67202014000300210&script=sci_arttext&tlng=pt
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(1) Publicação do estudo: https://acsjournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/cncr.33427
(2) Referência adicional: Tytgat GN, Bartelink H, Bernards R, et al. Cancer of the esophagus and gastric cardia: recent advances. Dis Esophagus. 2004; 17:10-26.
(3) Leitura recomendada: Ingerir bebidas muito quentes é um sério fator de risco para o câncer de esôfago