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Cientistas conseguem entrar no sonho das pessoas e estabelecer diálogo simples

 


- Atualizado no dia 23 de outubro de 2023 -


Sonhos nos levam a diferentes realidades, um mundo alucinatório que parece tão real quanto qualquer experiência acordada. Apesar de ser uma marcante característica do sono humano, os sonhos permanecem ainda pouco explicados em termos científicos. Além disso, é ainda motivo de debate acadêmico se existe efetiva comunicação com o mundo externo durante o sono profundo. O maior desafio de estudos neurocientíficos nesse sentido é a dependência de dados retrospectivos e sujeitos a sérias distorções do indivíduo relatando sonhos e outras experiências durante o sono profundo. Nesse sentido, um estudo publicado 2021 no periódico Current Biology (Ref.1) reportou de forma inédita uma comunicação efetiva em tempo real com pessoas sonhando, durante momentos de autoconsciência dos sonhos (sonhos lúcidos). E um estudo mais recente, publicado no periódico Nature Neuroscience (Ref.2), reforçou a evidência de que parecem existir períodos durante o sono profundo onde o cérebro está diretamente conectado com estímulos do mundo externo. 


"Historicamente, a definição de sono é que a consciência ao ambiente pausa, significando que você não reage ao mundo externo," disse em entrevista a Dra. Delphine Oudiette, uma cientista cognitiva no Instituto do Cérebro de Paris, França e autora nos dois estudos (Ref.3). "O que esses estudos mostram é que nós temos alguns estados fisiológicos [no sono] que são mais favoráveis à abertura ao mundo externo." 


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SONHOS LÚCIDOS


Por que nós temos sonhos? Como os cenários de sonhos são criados? Sonhar confere qualquer benefício para as funções cerebrais? Essas e outras questões têm permanecido em aberto, em parte por causa das opções limitadas disponíveis para investigar as experiências durante os sonhos e o sono profundo. Reportes de sonhos dados depois do indivíduo acordar tendem a ser distorcidos ou fragmentados devido à baixa habilidade de formação de memórias no estado de sono e a capacidade limitada de retenção de informações recentes na mente após o sonho ter sido finalizado. Essas limitações reduzem a aplicabilidade de técnicas como a eletroencefalografia (EEG) para rastrear a atividade neural durante os diferentes estágios do sono e relacionar os sinais com eventos experienciados nos sonhos.


Sonhos lúcidos foram primeiro mencionados em registros escritos conhecidos pelo filósofo Grego Aristóteles no século IV a.C., e cientistas têm observado esse fenômeno desde a década de 1970 em experimentos sobre o estágio do sono chamado de movimento rápido dos olhos (REM), quando a maior parte dos sonhos ocorrem. Cerca de 1 em cada 2 pessoas já teve pelo menos um sonho lúcido - ou seja, sabe que está sonhando -, e cerca de 10% das pessoas experienciam sonhos lúcidos uma vez ou mais por mês. Apesar de rara, essa habilidade de perceber o sonho durante o sonho - e até mesmo controlar alguns aspectos do sonho - pode ser melhorada com treino (um conceito similar ao do filme Inception, de 2010).


Alguns poucos estudos têm tentado uma comunicação com sonhadores lúcidos usando estímulos como luz, choques e sons para "entrar" no sonho dessas pessoas. Mas essas tentativas têm obtido apenas respostas mínimas desses indivíduos, mesmo sem o envolvimento de transmissões complexas de informação.


Leitura complementar:


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ESTUDO DE 2021


No estudo de 2021, quatro grupos independentes de cientistas na França, Alemanha, Holanda e nos EUA tentaram - através de diferentes estratégias - estabelecer uma complexa comunicação de duas vias (diálogo) durante o sonho de 36 voluntários, usando falas e perguntas que os sonhadores não haviam ouvido nos treinamentos. Alguns dos voluntários tinham mínima experiência prévia com sonhos lúcidos, outros eram sonhadores lúcidos mais frequentes, e um era um paciente com narcolepsia que tinha frequentes sonhos lúcidos.


Os pesquisadores primeiro treinaram os voluntários a reconhecerem quando eles estavam sonhando, explicando como os sonhos lúcidos funcionam e demonstrando pistas - sons, luz ou toques com dedos - que seriam apresentadas enquanto estivessem sonhando. A ideia é que essas pistas sinalizariam aos participantes que eles estão sonhando.


Durante os experimentos, à medida que os participantes caíam no sono, os cientistas monitoravam a atividade cerebral, movimento dos olhos e contrações dos músculos faciais - indicadores comuns de sono REM - com capacetes-tocas integrados com eletrodos. De um total de 57 sessões de sono, 6 voluntários sinalizaram que eles estavam tendo sonhos lúcidos em 15 delas. Nesses testes, pesquisadores perguntaram aos sonhadores questões que deveriam ser respondidas com um simples 'sim' ou 'não', ou problemas simples de matemática como '8 menos 6'. Para responder, os voluntários-sonhadores usaram sinais que eles tinham aprendido antes de dormirem, os quais incluíam sorrisos ou franzimento das sobrancelhas, movimento dos olhos múltiplas vezes para indicar uma soma, ou, no laboratório da Alemanha, movimentar os olhos em padrões correspondentes ao código Morse (1).


No total, os pesquisadores realizaram 158 perguntas aos sonhadores lúcidos, os quais responderam corretamente 18,6% das vezes. Os voluntários deram respostas incorretas a apenas 3,2% das perguntas; 17,7% das respostas não foram claras e 60,8% das perguntas não receberam resposta. Esses resultados mostram que, apesar de difícil, é possível para as pessoas seguir instruções, realizar matemática simples, responder perguntas de sim-ou-não, ou dizer a diferença entre diferentes estímulos sensoriais durante o sonho ou sono profundo. Um dos participantes relatou que a pergunta dos pesquisadores entrou no seu sonho como se fosse um narrador de um filme. Isso derruba a ideia comum de que o cérebro durante o sono está desconectado e sem ciência do mundo externo.



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(1) Músculos faciais (ex.: músculos zigomáticos) são menos afetados pela atonia muscular do que os membros durante o sono. Por exemplo, movimentos oculares persistem durante o REM e podem ser usado para sinalizar lucidez em pessoas que estão cientes do sonho enquanto dormem. 
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ESTUDO DE 2023


No estudo mais recente, um grupo de pesquisadores, incluindo como coautor a autora principal do estudo de 2021 (Dra. Delphine Oudiette),  recrutou 49 voluntários: 27 com narcolepsia - condição caracterizada por sonolência diurna e alta frequência de sonhos lúcidos - 22 saudáveis (sem a condição). Enquanto estavam dormindo, participantes foram repetidamente pedidos para franzir as sobrancelhas ou sorrir dependendo do estímulo externo estabelecido. Novamente, os pesquisadores rastrearam a atividade cerebral dos participantes durante os experimentos via EEG.


Todos os voluntários responderam acuradamente os pedidos em pelo menos 70% dos casos. No geral, as taxas de respostas foram maiores para todos os participantes durante o estágio REM, quando o sono mais profundo ocorre mas o cérebro permanece muito ativo (incluindo estados altamente cognitivos), do que durante outros estágios de sono. Aliás, respostas comportamentais acuradas ocorreram na maior parte dos estágios de sono em ambos os grupos, exceto sono de ondas lentas em voluntários saudáveis.


Os resultados do estudo trouxeram convincente evidência de que humanos adormecidos apresentam janelas transientes de conexão sensorial com o mundo externo durante as quais podem processar informação externa em um nível altamente cognitivo e fisicamente respondê-la. Até o momento, responsividade comportamental havia sido demonstrada apenas durante os períodos de início do sono (2) - ou seja, fora de um contexto de sono profundo. Além disso, essas janelas transientes de conexão cognitiva e comportamental mostraram estar associadas com dinâmicas cerebrais específicas (atividade oscilatória mais rápida e sinalização de maior complexidade).


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(2)  Leitura recomendada: Edison e Dalí estavam certos: Acordar logo após cochilar anaboliza a criatividade

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"INCEPTION" TERAPÊUTICO?


Somados, os achados desses estudos fortemente argumentam em favor de processamento consciente de informação externa durante o sono profundo, incluindo a presença de uma assinatura neural de acesso consciente. Os achados também derrubam o dogma de que o sono seria um estado de desconexão comportamental do ambiente, sem reatividade consciente a estímulos externos.


Os métodos usados nos estudos para o estabelecimento de diálogo durante o sonho podem ser usados em experimentos científicos futuros comparando habilidades cognitivas durante o sono e durante o estado despertado, para o melhor entendimento da relação entre sono e processamento de memórias, e também na avaliação da acuracidade de reportes de sonhos após o despertar. Além disso, fora do ambiente laboratorial, esses métodos podem ser usados para ajudar pessoas de várias formas, como na resolução de problemas durante o ou associados ao sono (ex.: insônia e sonambulismo) ou ajudar indivíduos que sofrem com pesadelos frequentes.


A descoberta das "janelas transientes" no sono de comunicação com o mundo externo também pode ajudar a identificar as partes do cérebro que estão ativas durante o sono e relacionadas à consciência.


REFERÊNCIAS

  1. Paller et al. (2021). Real-time dialogue between experimenters and dreamers during REM sleep, Volume 31, Issue 7, P1417-1427.E6. https://doi.org/10.1016/j.cub.2021.01.026
  2. Türker, B., Musat, E.M., Chabani, E. et al. Behavioral and brain responses to verbal stimuli reveal transient periods of cognitive integration of the external world during sleep. Nat Neurosci (2023). https://doi.org/10.1038/s41593-023-01449-7
  3. https://www.nature.com/articles/d41586-023-03252-7

Cientistas conseguem entrar no sonho das pessoas e estabelecer diálogo simples Cientistas conseguem entrar no sonho das pessoas e estabelecer diálogo simples Reviewed by Saber Atualizado on fevereiro 19, 2021 Rating: 5

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