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Cientistas argumentam que essa larva é o nosso alimento do futuro


- Atualizado no dia 1 de novembro de 2020 -

Em um estudo de revisão publicado em 2020 no periódico Comprehensive Reviews in Food and Food Safety (Ref.1), pesquisadores argumentaram pela maior aceitação de larvas da mosca da espécie Hermetia illucens como uma importante fonte alimentar humana, especialmente no contexto de mudanças climáticas e de contínuo crescimento populacional. As evidências acadêmicas na literatura acadêmica suportam cada vez mais que o futuro sustentável e limpo da alimentação humana reside nos insetos.


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Como alternativa ao modo tradicional de agricultura e de criação de animais visando a alimentação humana - o qual está sendo um dos principais fatores de fomento do aquecimento global antropogênico - muitos cientistas vêm argumentando pelo maior investimento na criação de insetos como fonte de alimento para a população humana, especialmente no Ocidente.


Entomofagia (consumo de insetos) é uma antiga prática predominante em países não-Ocidentais, e hoje são registradas 2037 espécies de insetos sendo consumidas por humanos ao redor do mundo. Insetos comestíveis são uma fonte alimentar ideal devido ao alto conteúdo proteico desses animais - incluindo todos os aminoácidos essenciais requeridos pelos humanos -, e altos níveis de micronutrientes como zinco e ferro. Além disso, os insetos são altamente eficientes no consumo e aproveitamento de nutrientes (inclusive matéria orgânica considerada lixo ou dejeto), possuem alta taxa de crescimento e alta fecundidade. De fato, um estudo publicado no periódico Journal of Cleaner Production (Ref.2), mostrou que proteína de insetos - como grilos e larvas de mosca - visando a alimentação humana e de animais de criação possui o maior potencial para reduzir as emissões de carbono, significativamente superior à proteína de soja.


Por fatores culturais, em países Ocidentais, como o Brasil, o consumo de insetos e de outros invertebrados terrestres é considerado repulsivo. No geral, os insetos mais comumente aceitos no Ocidente são grilos (Gryllidae), gafanhotos (Locusta migratoria), larvas do besouro Tenebrio molitor, e bicho-da-seda (Bombyx mori). Embora as larvas da mosca H. ilucens - popularmente conhecidas como moscas-soldadas-negras e pertencentes à família Stratiomyidae - estarem sendo investigadas nos últimos anos como fonte nutricional para o consumo humano e como fonte de matéria-prima (gordura) para a produção de biocombustíveis, esses insetos são ainda amplamente limitados à alimentação de animais de criação.


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As larvas da mosca-soldado-negra, como alternativas proteicas, têm demonstrado várias vantagens em relação a numerosos outras espécies de insetos comestíveis, sendo alvos principalmente de estudos que exploram a capacidade desses animais de converterem uma ampla variedade de 'lixo' em proteínas de qualidade, gorduras e minerais. Essas larvas possuem uma seleção de enzimas no intestino que permite o consumo de um amplo espectro de substratos, incluindo fezes humanas e de outros animais, restos de matadouros, grãos descartados e resíduos orgânicos diversos de plantações.



A fêmea da mosca-soldado-negra deposita aproximadamente 500 ovos em matéria orgânica e dentro de 4 dias os ovos eclodem , e, ao longo de um período de ~14 dias, as larvas em desenvolvimento rapidamente consomem a matéria orgânica em volta. Durante esses 14 dias, as larvas passam por seis fases antes de finalmente entrarem na fase de pupa. Quando estão prontas para se transformarem em pupas, as larvas param de se alimentar e se tornam pouco móveis, praticamente "colhendo" a si mesmas e facilitando o trabalho manual dos trabalhadores envolvidos na criação desses insetos. E outra importante vantagem: os adultos dessa mosca não se alimentam, reduzindo os riscos de carregarem e espalharem doenças - algo associado a outros insetos decompositores similares, como a mosca-doméstica (Musca domestica). E mesmo quando se alimentam de 'lixo', as larvas são naturalmente antimicrobianas, e ao decomporem a matéria orgânica associada acabam reduzindo dramaticamente várias colônias microbianas, incluindo populações de bactérias nocivas como a Salmonella spp. O intestino altamente alcalino (alto pH) e poderosas enzimas são devastadores para as bactérias. 


Somando-se com a reciclagem natural e limpa realizada por esses insetos e à não-associação com doenças, o potencial de produção proteica por área é enorme. É estimado que menos do que metade de um hectare de larvas H. illucens pode produzir mais proteína do que a criação de gado em 1200 hectares ou 52 hectares de soja - algo mais do que relevante em termos de estratégias de mitigação do aquecimento global e preservação do meio ambiente.


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A densidade nutricional dessas larvas é bem alta. O conteúdo proteico varia de 30 g a 53 g para cada 100 g de matéria seca; o conteúdo lipídico varia de 20 a 41 g/100 g; e de quitina (basicamente fibra alimentar) varia de 2 g a 9 g/100 g. O conteúdo nutricional varia com a idade da larva. Por exemplo, a concentração de proteína vai de 61% aos 5 dias de vida para 44% aos 15 dias, e com a concentração de gordura aumentando de 13% aos 5 dias para 19% e 23% nos dias 15 e 20, respectivamente. O conhecimento dessas variações nutricionais possibilita estratégias de colheita para vários fins considerando as fases de crescimento (ex.: biocombustíveis para períodos de alta produção lipídica e consumo alimentar para períodos de alta produção proteica).



As proteínas das larvas possuem todos os aminoácidos essenciais para o corpo humano. Além disso, são ricas fontes de micronutrientes diversos, principalmente ferro (2,1-3 mg/100 g), zinco (6,8-15 mg/100 g) e cálcio (840-934 mg/100 g). Para comparação, uma carne magra, a qual é tipicamente considerada uma das mais ricas fontes de zinco e de ferro, contém ferro variando de 1,1 mg até 1,8 mg/100 g e de zinco variando de 4,2 mg até 4,6 mg/100 g. Já o conteúdo de cálcio é similar àquele observado no leite (119-2900 mg/100 g). 


Talvez a única preocupação com a criação das larvas de H. illucens é a alta capacidade de acúmulo de metais pesados desses insetos, incluindo mercúrio, cobre, cádmio e chumbo, estes os quais são muito nocivos à saúde humana. Nesse sentido, é necessário sempre monitorar os níveis desses metais na matéria orgânica sendo dada de alimento para as larvas, para evitar perigosas bioacumulações. Seria um problema similar aos agrotóxicos, porém bem mais fácil de ser resolvido. De fato, essas larvas já estão sendo amplamente utilizadas com sucesso para a alimentação de galinhas, porcos e peixes com excelentes resultados (Ref.3). No campo da aquacultura, o interesse e estudos investigando as larvas de Hermetia illucens como alternativa de ração têm crescido exponencialmente nos últimos anos (Ref.4).


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Os pesquisadores concluíram que as larvas da mosca-soldado-negra possuem um grande potencial de fornecer uma rica fonte de proteínas, gorduras, quitina e de micronutrientes e com um elevado custo-benefício, especialmente devido à alta capacidade dessas larvas para a bioconversão de resíduos orgânicos em biomassa. Segundo a Organização da Agricultura e de Alimentos das Nações Unidas, é estimado que 2 bilhões de pessoas ao redor do mundo já consomem insetos. Está na hora do Ocidente ampliar o seu cardápio e dos vegetarianos e veganos apoiarem também essa causa. 


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VOCÊ SABIA? A maior e mais massiva larva de inseto já registrada pertence ao besouro-rinoceronte (Megasoma actaeon), a qual ultrapassou 200 gramas no seu pico de massa! Para mais informações e foto da larva, acesse: Qual é o maior inseto do mundo?

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REFERÊNCIAS

  1. Hoffman et al. (2020). Why for feed and not for human consumption? The black soldier fly larvae. Volume19, Issue5, Pages 2747-2763. https://doi.org/10.1111/1541-4337.12609
  2. Vauterin et al. (2021). The potential of insect protein to reduce food-based carbon footprints in Europe: The case of broiler meat production, Journal of Cleaner Production, Volume 320, 128799, ISSN 0959-6526. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2021.128799
  3. Kaya et al. (2021). Global population genetic structure and demographic trajectories of the black soldier fly, Hermetia illucens. BMC Biol 19, 94. https://doi.org/10.1186/s12915-021-01029-w
  4. Randazzo et al. (2021). Physiological response of rainbow trout (Oncorhynchus mykiss) to graded levels of Hermetia illucens or poultry by-product meals as single or combined substitute ingredients to dietary plant proteins. Aquaculture, Volume 538, 736550. https://doi.org/10.1016/j.aquaculture.2021.736550

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