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Mutação no novo coronavírus o tornou mais infeccioso, sugere estudo


A pandemia do novo coronavírus (SARS-CoV-2) continua avançando, e já acumula mais de 8 milhões de casos confirmados ao redor do mundo. Sua doença associada (COVID-19) é responsável por quase 438 mil mortes. E esses números provavelmente estão muito subestimados. Tratamentos específicos efetivos e vacinas ainda não existem, e por isso a importância de frear ao máximo a disseminação do vírus através de intervenções não-farmacológicas, como isolamento social, uso universal de máscaras, distanciamento social, aplicação de testes em massa e rastreamento dos casos. Outra preocupação nesse sentido é a contínua taxa de variação genômica do SARS-CoV-2 à medida que o vírus vai se disseminando entre a população, processo que pode potencialmente modificar sua virulência e patogenicidade.  

Nesse último ponto, um estudo de alerta publicado recentemente como preprint (sem revisão por pares) na bioRxiv (1) encontrou que uma mutação na principal proteína do SARS-CoV-2 (a coroa ou proteína Spike) pode ter aumentando sua eficiência de transmissão entre hospedeiros.

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O SARS-CoV-2 é o sétimo membro de beta-coronavírus envelopados de RNA (subgênero Sarbecovirus) e um dos três - junto com o SARS-CoV e o MERS-CoV - que pode levar a doenças de grave progressão, no caso, a COVID-19. O genoma viral do SARS-CoV-2 é constituído de RNA e é o maior entre os coronavírus conhecidos: 26-32 kb de comprimento. A mais notável característica desse e de outros coronavírus é a presença da glicoproteína Spike (S).


A glicoproteína S da transmembrana age como mediadora para a entrada do SARS-CoV-2 dentro da célula hospedeira, e inclui dois domínios: S1 para a interação com o receptor da célula hospedeira e S2 para a fusão das membranas viral e celular, respectivamente. Tanto o SARS-CoV-2 quanto o SARS-CoV usam a enzima angiotensina convertase 2 (ACE2) para entrar nas células. Em humanos, o ACE2 é expresso nas células endoteliais de artérias e veias, músculo liso arterial, epitélio do trato respiratório, epitélio do intestino delgado, epitélio do trato respiratório, e em células imunes. Em um pulmão adulto normal, o ACE2 é expresso primariamente nas células alveolares epiteliais do tipo II, as quais podem servir como um reservatório viral. O tecido com o maior número de receptores ACE2 se encontra na região do nariz e é onde os cientistas acreditam ser a porta de entrada da COVID-19 (I).

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O domínio de ligação do receptor (RBD) na proteína S é a parte genômica mais variável no grupo dos betacoronavírus e alguns locais da proteína SA podem ser sujeitas a seleção positiva (processo evolutivo adaptativo). Devido ao modo particular de replicação através do maquinário genético da célula hospedeira, várias mutações são naturalmente acumuladas nas populações de vírus como o SARS-CoV-2, e processos evolutivos de deriva genética potencializam a diversificação viral em um curto período de tempo. Apesar da abundante variabilidade genética do SARS-CoV-2 - com inúmeras variantes nucleotídicas únicas já identificadas em várias regiões genômicas - ainda é incerto se as mutações acumuladas até o momento tiveram algum impacto funcional da patogenicidade desse vírus. Rastrear essas possíveis mudanças fenotípicas é muito importante para o desenvolvimento de vacinas e de novos medicamentos e também para a preparação para a próxima fase da pandemia.

Uma das variações identificadas codifica uma mutação da proteína S, D614G, na região carboxila(C)-terminal do domínio S1. Essa região do domínio S1 está diretamente associada com a subunidade S2. Essa mutação com glicina no resíduo 614 (G614) tinha sido previamente detectada de ter aumentado em prevalência com alarmante velocidade e correlacionada com maiores cargas virais nos pacientes com COVID-19, sugerindo mudanças na virulência do SARS-CoV-2.

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No novo estudo, pesquisadores Norte-Americanos resolveram analisar mais a fundo as sequências da proteína-S disponíveis no banco de dados genômicos do GenBank isoladas de diferentes populações ao redor do mundo. Na análise preliminar, eles encontraram um resultado similar aos estudos prévios: o genótipo G614 não tinha sido detectado em fevereiro (entre 33 sequências), foi observado em baixa frequência em março (26%), mas aumentou rapidamente de prevalência em abril (65%) e maio (70%), indicando uma vantagem de transmissão em relação a outros vírus com o genótipo sem mutação (D614). 

No próximo passo do estudo, para determinar se a mutação D614G alterou de fato as propriedades da proteína-S de um modo que poderia impactar sua transmissão ou replicação, os pesquisadores conduziram experimentos em culturas celulares (in vitro). Inicialmente, eles usaram um pseudo-vírus modificado para expressar proteína fluorescente e carregando a proteína-S do SARS-CoV-2 ou com o genótipo G614 ou com o genótipo D614 - um 'controle' também foi usado com uma variante FKO da proteína-S. Esses três grupos de pseudo-vírus (SD614, SG14 e SFKO) foram então colocados para infectar células HEK293T modificadas capazes de expressar o receptor humano ACE2 (hACE2-293T) e células HEK29T sem ACE2 (Mock-293T). Foram usados sempre os mesmos números de partículas virais para infectar cada cultura celular.

Os pesquisadores observaram que as os pseudo-vírus-G614 infectaram as células hACE2-293T com uma eficiência aproximadamente 9 vezes maior do que os pseudo-vírus-D614.

Experimentos subsequentes visando elucidar o mecanismo pelo qual a mutação G614 aumentava a infectividade dos pseudo-vírus modificados indicaram que a glicina no resíduo 614 estabilizava a interação entre os domínios S1 e S2, limitando a clivagem da estrutura proteica em S1 pela furina. Além disso, a razão S1:S2 e o total de proteína S mostraram-se bem maiores nos pseudo-vírus G614 em relação aos D614.

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Para confirmar os achados, os pesquisadores usaram partículas similares a vírus (particules) compostas apenas das proteínas nativas do SARS-CoV-2: a nucleoproteína (N), a proteína da membrana (M), o envelope proteico (E), e a proteína S. Esses particules carregavam a proteína S D614 ou a mutação G614. Novamente, os particules G614 mostraram ter uma razão S1:S2 e uma proteína S total bem maiores - 3,4x e e 5x, respectivamente - do aqueles carregando a proteína S D614.

Nesse sentido, os pesquisadores concluíram que a mutação G614 otimiza a infecção viral através de dois mecanismos: reduz a clivagem do domínio S1 e aumenta a quantidade total de proteína S incorporada no vírion (partícula viral). No entanto, os pesquisadores também encontraram que a quantidade total de proteína S não parece influenciar a suscetibilidade viral ao ataque de anticorpos. É incerto também como a introdução de uma glicina no domínio S1 - à primeira vista prejudicial por causa da perda de uma ligação de hidrogênio na estrutura proteica - consegue estabilizar melhor essa região na proteína S (mas um número de hipóteses plausíveis foram propostas pelos autores do estudo).

Outra interessante questão levantada pelos pesquisadores é o porquê dos vírus carregando a mutação G614 parecem ser mais transmissíveis porém sem resultar em diferenças observáveis de severidade da doença. Nesse sentido, é possível que altos níveis de proteína S funcional aumentam as chances de transmissão hospedeiro-para-hospedeiro, mas que outros fatores limitam a taxa e a eficiência de replicação intra-hospedeiro. Pode ser também que a perda quantitativa de proteína S seja compensada por uma mais eficiente fusão com o receptor ACE2 nas células do hospedeiro. É também possível que uma maior patogenicidade esteja ocorrendo com os vírus carregando a mutação G614, mas ainda não estamos conseguindo perceber com os atuais métodos analíticos sendo empregados.

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De qualquer forma, é importante reforçar que o trabalho apresentado pelos pesquisadores é ainda especulativo e mais estudos precisam ser feitos para corroborar os achados. Os experimentos não envolveram vírus SARS-CoV-2 inteiros, apenas parte deles (particules), e foram conduzidos in vitro, ou seja, nenhum teste em animais (in vivo) foi realizado, muito menos em humanos. O que torna um pouco mais sólido o estudo foram as tendências observadas na pandemia entre aqueles infectados com vírus carregando a mutação ou não, mas outros co-fatores causais podem ter sido ignorados nessas observações. Além disso, é um estudo ainda não revisado por pares.


(1) Publicação do estudo: bioRxiv

Mutação no novo coronavírus o tornou mais infeccioso, sugere estudo Mutação no novo coronavírus o tornou mais infeccioso, sugere estudo Reviewed by Saber Atualizado on junho 16, 2020 Rating: 5

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