Isolado outro vírus de morcego muito similar ao novo coronavírus
Os coronavírus (CoVs) são patógenos respiratórios virais muito comuns que causam primariamente sintomas no trato respiratório superior e no trato gastrointestinal, e responsáveis por doenças indo desde resfriados comuns até doenças mais sérias, como a SARS, MERS e a atual COVID-19. Nesse último caso, temos como vírus causador o SARS-CoV-2, cuja origem exata ainda não foi esclarecida, mas com todas as evidências científicas até o momento acumuladas apontando para uma origem natural (1). Especificamente, sugere-se fortemente que a fonte primordial é representada por coronavírus de morcegos e a fonte de infecção direta (hospedeiro intermediário) representada por coronavírus de pangolins (2). Agora, em um estudo publicado na Cell (3), pesquisadores descreveram um coronavírus isolado de morcegos muito similar ao SARS-CoV-2 em várias partes do genoma - incluindo uma alvo de muito debate -, reforçando que esse vírus pode emergir naturalmente.
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Leitura recomendada:
- (1) Afinal, o novo coronavírus foi criado em um laboratório da China?
- (2) Isolado vírus muito similar ao novo coronavírus de pangolins
Desde a descoberta e descrição do SARS-CoV-2, tem emergido um número de sugestões sem suporte científico de que esse vírus foi criado ou manipulado em laboratório, especialmente entre o público e incluindo autoridades políticas e alguns poucos polêmicos cientistas. Em particular, já foi proposto que inserções de aminoácidos na junção das subunidades S1 e S2 da proteína spike (S) presente na estrutura do SARS-CoV-2 são altamente anômalas ("não-naturais") e talvez indicativas de manipulação laboratorial. [A proteína S está presente em todos os coronavírus].
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No novo estudo, os pesquisadores analisaram 227 amostras de morcegos coletados na província de Yunnan, China, entre maio e outubro de 2019, e pertencentes a 20 diferentes espécies, a maioria de Rhinoluphus malayanus, Hipposideros larvatus e Rhinolophus stheno. Os morcegos são amplamente conhecidos de carregarem uma grande diversidade de vírus, notavelmente de coronavírus, e de serem o reservatório original de vírus ancestrais dos patógenos causadores da severa síndrome respiratória aguda por coronavírus (SARS-CoV) e da síndrome respiratória por coronavírus do Oriente Médio (MERS-CoV).
Em seguida, os pesquisadores levaram as amostras para uma análise metagenômica de sequenciamento de próxima-geração no início de janeiro deste ano, pouco depois da descoberta do SARS-CoV-2. Na análise, os pesquisadores identificaram novamente o mais próximo parente evolutivo do SARS-CoV-2 em termos de genoma completo, o já bem estabelecido e descrito Bat-CoV RaTG13, previamente identificado em morcegos de Yunnan. Porém, os pesquisadores também identificaram um coronavírus ainda mais próximo relacionado ao SARS-CoV-2 na maior parte do genoma - chamado RmYN02 -, incluindo na mais longa sequência genômica codificante chamada 1ab, onde ambos compartilhavam 97,2% dos seus RNAs. Em várias outras sequências (3a, E, 6, 7a, N, 10, etc.) a similaridade também é bem alta, acima de 96%. No genoma completo, o RmYN02 compartilha 93,3% de identidade de nucleotídeos (sequências das letras genéticas) com o SARS-CoV-2, enquanto que o RaTG13 compartilhava 96,1% de identidade.
Criticamente, o RmYN02 também apresenta inserções de aminoácidos no ponto de junção das duas subunidades da proteína S, da mesma forma que o SARS-CoV-2, este o qual é caracterizado por uma inserção de 4 aminoácidos na junção S1/S2 (essa inserção é única ao vírus e tem estado presente em todas os SARS-CoV-2 sequenciados até o momento). As inserções no RmYN02 não são as mesmas observadas no SARS-CoV-2, o que indica que elas ocorreram através de eventos independentes de inserção. Mas um evento similar de inserção ocorrendo em um vírus naturalmente presente em morcegos - em específico na espécie Rhinolophus malayanus - fortemente sugere que esses tipos de inserções são de origem natural, adquiridas via recombinação e componentes esperados na evolução de coronavírus.
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Apesar disso, o RmYN02 compartilha apenas 62,4% de identidade genômica com o domínio do receptor ligante (RBD) do SARS-CoV-2 e provavelmente não é capaz de se ligar ao receptor proteico da enzima angiotensina convertase 2 (ACE2), a porta de entrada na célula hospedeira para a SARS-CoV-2 e o SARS-CoV em humanos e outros mamíferos. Isso torna esse novo coronavírus descrito pouco provável de infectar diretamente humanos.
(3) Publicação do estudo: Cell
Isolado outro vírus de morcego muito similar ao novo coronavírus
Reviewed by Saber Atualizado
on
maio 11, 2020
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