Araponga-da-Amazônia quebrou o recorde de canto mais alto do mundo
- Atualizado no dia 25 de outubro de 2025 -
Em um estudo publicado no periódico Current Biology (Ref.1), pesquisadores da Universidade de Massachusets, EUA, e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Brasil, reportaram e descreveram o canto de ave mais alto do mundo. E o dono desse canto pertence a uma ave que habita a Amazônia Brasileira: o macho da espécie Procnias albus, popularmente conhecida como Araponga-da-Amazônia.
Durante expedições para uma área montanhosa da floresta Amazônica dentro do território Brasileiro, os pesquisadores mediram os cantos de acasalamento de duas espécies: o Cricrió (Lipaugus vociferans) e a mencionada araponga-da-Amazônia. Até o momento, o canto mais alto já documentado pertencia ao cririó. No entanto, para a surpresa dos pesquisadores, o canto da araponga-da-Amazônia era acima de 9 decibéis (dB) mais alto, e alcançando praticamente três vezes mais pressão acústica do que o do L. vociferans! O achado corrobora reportes anedóticos prévios nesse sentido.
Os pesquisadores focaram as análises sonoras em dois parâmetros de amplitude: Leq (nível sonoro contínuo equivalente) - uma raiz quadrada do valor médio - e o Lpeak, o qual captura valores máximos de amplitude transiente. Enquanto os L. vociferans nos locais de pesquisa compartilhavam um único tipo de canto, os P. albus compartilhavam dois tipos: um relativamente comum (Tipo 1) e um relativamente raro (Tipo 2; com frequência de 1 em cada 6 cantos).
O resultado das análises mostrou que, na amostra investigada, o L. vociferans alcançou uma amplitude vocal máxima razoavelmente equivalente aos valores previamente reportados por outros estudos: ~107 dB (Leq) e ~116 dB (Lpeak) - média para 3 espécimes. Já o P. albus mostrou ser mais barulhento do que o cricrió para os cantos do Tipo 1 (~109 dB), Leq, e ~117 dB, Lpeak) - média para 8 espécimes - e definitivamente mais barulhento para os cantos do Tipo 2 (~117 dB, Leq, e ~125 dB, Lpeak) - média para 8 espécimes.
Outro curioso achado reportado no estudo é que quando uma fêmea se aproximava do P. albus macho, este emitia apenas o canto Tipo 2, de maior amplitude, balançando dramaticamente no meio do canto para encarar a fêmea com a cabeça erguida durante a segunda nota do canto. Fêmeas nessas interações sempre recuavam no momento - ou um pouco antes - do canto do macho, e mesmo assim experienciavam cantos a uma proximidade muito curta, às vezes dentro de quatro metros ou menos, ficando expostas a um elevado risco de danos auditivos.
Evidência científica mais recente aponta que a amplitude de canto das aves não possui relação com o porte corporal ou o tamanho territorial das espécies (Ref.2). A variação de amplitude de canto entre as espécies parece estar relacionada com diferenças em ecologia, na força da seleção sexual envolvida e aos custos da produção sonora. Por exemplo, um ambiente com muito ruído de fundo - onde vocalizações ou barulhos diversos podem dificultar a identificação de sons específicos - parece favorecer cantos mais altos nas aves. E quanto mais machos de uma mesma espécie coexistem no ambiente competindo entre si por fêmeas, canto mais alto tende a ser favorecido.
REFERÊNCIAS
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Durante expedições para uma área montanhosa da floresta Amazônica dentro do território Brasileiro, os pesquisadores mediram os cantos de acasalamento de duas espécies: o Cricrió (Lipaugus vociferans) e a mencionada araponga-da-Amazônia. Até o momento, o canto mais alto já documentado pertencia ao cririó. No entanto, para a surpresa dos pesquisadores, o canto da araponga-da-Amazônia era acima de 9 decibéis (dB) mais alto, e alcançando praticamente três vezes mais pressão acústica do que o do L. vociferans! O achado corrobora reportes anedóticos prévios nesse sentido.
Os pesquisadores focaram as análises sonoras em dois parâmetros de amplitude: Leq (nível sonoro contínuo equivalente) - uma raiz quadrada do valor médio - e o Lpeak, o qual captura valores máximos de amplitude transiente. Enquanto os L. vociferans nos locais de pesquisa compartilhavam um único tipo de canto, os P. albus compartilhavam dois tipos: um relativamente comum (Tipo 1) e um relativamente raro (Tipo 2; com frequência de 1 em cada 6 cantos).
O resultado das análises mostrou que, na amostra investigada, o L. vociferans alcançou uma amplitude vocal máxima razoavelmente equivalente aos valores previamente reportados por outros estudos: ~107 dB (Leq) e ~116 dB (Lpeak) - média para 3 espécimes. Já o P. albus mostrou ser mais barulhento do que o cricrió para os cantos do Tipo 1 (~109 dB), Leq, e ~117 dB, Lpeak) - média para 8 espécimes - e definitivamente mais barulhento para os cantos do Tipo 2 (~117 dB, Leq, e ~125 dB, Lpeak) - média para 8 espécimes.
Nesse sentido, segundo os pesquisadores, o canto do Tipo 2 da araponga-da-Amazônia é a vocalização de maior amplitude já documentada para qualquer ave, com os níveis máximos de pressão sonora excedendo aqueles do cricrió em cerca de três vezes. No vídeo abaixo, é possível ver os dois tipos de canto do P. albus.
A natureza extrema das performances vocais descrita no novo estudo implica que essas duas espécies de aves, especialmente o P. albus, estão cantando próximo ou no limite das suas capacidades máximas de performance. Essa habilidade parece ter um efeito negativo em relação à duração do canto. Segundo a hipótese dos pesquisadores, para elevar a amplitude do canto ao máximo, os pássaros regulam o fluxo de ar respiratório, esvaziando mais rapidamente os volumes inspirados, levando a curtos cantos. Essa proposta pode indicar um limite evolucionário para amplitudes ainda maiores mesmo em meio a uma forte e persistente seleção sexual.
A habilidade de algumas espécies de arapongas cantar tão alto é provavelmente não-derivado apenas das duas distintas estruturas e grande tamanho do órgão sonoro (siringe) dessas aves, mas também devido à boca anormalmente larga e com grande capacidade de abertura, característica morfológica que evoluiu originalmente como resposta adaptativa à dieta frugívora. Isso possibilita a concentração de energia acústica em certas frequências e facilita a transmissão dessa energia de modo a maximizar a amplitude do canto, e de forma similar ao observado em instrumentos musicais de sopro.
A natureza extrema das performances vocais descrita no novo estudo implica que essas duas espécies de aves, especialmente o P. albus, estão cantando próximo ou no limite das suas capacidades máximas de performance. Essa habilidade parece ter um efeito negativo em relação à duração do canto. Segundo a hipótese dos pesquisadores, para elevar a amplitude do canto ao máximo, os pássaros regulam o fluxo de ar respiratório, esvaziando mais rapidamente os volumes inspirados, levando a curtos cantos. Essa proposta pode indicar um limite evolucionário para amplitudes ainda maiores mesmo em meio a uma forte e persistente seleção sexual.
A habilidade de algumas espécies de arapongas cantar tão alto é provavelmente não-derivado apenas das duas distintas estruturas e grande tamanho do órgão sonoro (siringe) dessas aves, mas também devido à boca anormalmente larga e com grande capacidade de abertura, característica morfológica que evoluiu originalmente como resposta adaptativa à dieta frugívora. Isso possibilita a concentração de energia acústica em certas frequências e facilita a transmissão dessa energia de modo a maximizar a amplitude do canto, e de forma similar ao observado em instrumentos musicais de sopro.
Aliás, a vocalização do P. albus rivaliza com as amplitudes máximas de instrumentos sonoros humanos.
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Outro curioso achado reportado no estudo é que quando uma fêmea se aproximava do P. albus macho, este emitia apenas o canto Tipo 2, de maior amplitude, balançando dramaticamente no meio do canto para encarar a fêmea com a cabeça erguida durante a segunda nota do canto. Fêmeas nessas interações sempre recuavam no momento - ou um pouco antes - do canto do macho, e mesmo assim experienciavam cantos a uma proximidade muito curta, às vezes dentro de quatro metros ou menos, ficando expostas a um elevado risco de danos auditivos.
Considerando que um aumento de 6 dB dobra a pressão sonora associada, a amplitude média de 125 dB do canto da araponga-da-Amazônia corresponde a uma pressão sonora >5 mil vezes maior do que aquela associada ao canto produzido por tentilhões-zebra (aves do gênero Taeniopygia). Por que uma diferença tão grande no esforço de produção sonora entre os diferentes táxons de aves?
Animais geralmente reservam seus chamados mais altos para comunicação a longas distâncias, e algumas espécies são conhecidas de vocalizar mais suavemente quando os receptores estão próximos.
Animais geralmente reservam seus chamados mais altos para comunicação a longas distâncias, e algumas espécies são conhecidas de vocalizar mais suavemente quando os receptores estão próximos.
Nesse sentido, os pesquisadores ainda não entendem muito bem por que as fêmeas da araponga-da-Amazônia estão dispostas a ficarem tão próximas dos machos à medida que estes cantam. Mesmo a 4 metros de distância, as fêmeas estão ondas sonoras potencialmente danosas e com valores efetivos no ouvido de ~104 dB (Leq) e ~113 dB (Lpeak). Talvez esses riscos são compensados com benefícios associados à escolha do parceiro de acasalamento. Mais especificamente, as fêmeas podem expressar um interesse em avaliar os machos na mais curta distância possível, mas buscando limitar os danos (por isso a distância tomada em torno de 4 metros).
Evidência científica mais recente aponta que a amplitude de canto das aves não possui relação com o porte corporal ou o tamanho territorial das espécies (Ref.2). A variação de amplitude de canto entre as espécies parece estar relacionada com diferenças em ecologia, na força da seleção sexual envolvida e aos custos da produção sonora. Por exemplo, um ambiente com muito ruído de fundo - onde vocalizações ou barulhos diversos podem dificultar a identificação de sons específicos - parece favorecer cantos mais altos nas aves. E quanto mais machos de uma mesma espécie coexistem no ambiente competindo entre si por fêmeas, canto mais alto tende a ser favorecido.
REFERÊNCIAS
- Podos & Cohn-Haft (2019). Extremely loud mating songs at close range in white bellbirds. Current Biology, Volume 29, Issue 20, PR1068-R1069. https://doi.org/10.1016/j.cub.2019.09.028
- Brumm et al. (2025). A comparative analysis of song amplitude across and within bird species. Proceedings of the Royal Society B, Volume 292, Issue 2051. https://doi.org/10.1098/rspb.2025.1088
Araponga-da-Amazônia quebrou o recorde de canto mais alto do mundo
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