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Flagrada transição evolutiva caracterizando um novo tipo de simbiose


Os peixes da subordem Ceratioidei (Teleostei: Lophiiformes) são representados por uma grande diversidade de espécies que vivem tipicamente em ambientes marinhos com profundidades acima dos 1000 metros. Vivendo a maior parte da vida na escuridão dos mares, a maioria desses peixes não ultrapassa os 30 cm de comprimento, mas algumas espécies podem alcançar até 1 metro de comprimento. Mas a característica mais notável desses animais é a presença de uma protuberância alongada na cabeça de muitas fêmeas com uma ponta (bulbo) iluminada. Essa iluminação é gerada por bactérias bioluminescentes que vivem ali em simbiose, fornecendo luz que atrai presas para o peixe e ganhando, em troca, nutrientes do seu parceiro. O bulbo iluminado também atua atraindo potenciais parceiros sexuais.

Até o momento, pouco era conhecido sobre a relação simbiótica desses peixes com as bactérias bioluminescentes, pelo fato da dificuldade de se conseguir espécimes bem conservados para estudo. Nesse sentido, pela primeira vez, os cientistas conseguiram sequenciar e analisar os genomas das bactérias que vivem nos bulbos, a partir de espécimes coletados do Golfo do México. Os achados do sequenciamento genômico foram descritos em um estudo publicado no periódico mBio (1).



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As análises do estudo mostraram que as bactérias simbiontes convivendo com esses peixes perderam alguns dos genes necessários para uma vida independente na água, algo já esperado pelos pesquisadores - já que o estilo de vida simbiótico torna alguns processos metabólicos e mecanismos biológicos não mais essenciais. No entanto, um curioso cenário foi revelado: as bactérias ali parecem estar passando por um processo incompleto de evolução em relação à parceria simbiótica, mesmo esses peixes - e seus órgãos de luz - estando bem estabelecidos em termos evolutivos há cerca de 100 milhões de anos. As bactérias ainda estão perdendo genes, e as causas desse fenômeno evolutivo são desconhecidas.

Existem essencialmente dois tipos de processos de simbiose conhecidos entre bactérias e seus hospedeiros, e um terceiro que é uma raríssima exceção:

1. Simbiose entre um organismo hospedeiro e uma bactéria de vida livre que não evolui para manter a relação simbiótica. Nossa espécie (Homo sapiens) e boa parte dos vertebrados convive em simbiose com diversas bactérias no intestino, e várias espécies de peixes e lulas marinhas convivem nesse tipo de relação com bactérias extracelulares bioluminescentes.

2. Simbiose entre um hospedeiro e uma bactéria intracelular que vive dentro das células hospedeiras e passam por um robusto processo de perda de genes, como ocorreu com as mitocôndrias e os cloroplastos dos eucariontes (2). Essa relação ecológica é bastante comum entre insetos, envolvendo bactérias além das organelas mitocondriais.

3. Simbiontes bioluminescentes no gênero "Candidatus Photodescmus" são dependentes obrigatórios dos seus hospedeiros - peixes-lanternas (Anomalopidae) - para o crescimento. Essas bactérias são extracelulares, transmitidas entre hospedeiros de forma horizontal (por intermédio do ambiente) e possuem um genoma 80% reduzido em comparação com parentes evolutivos próximos de vida livre.

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(2) Leitura recomendada: A mitocôndria não é um presente exclusivo da mãe
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As bactérias dentro do bulbo dos peixes analisados no novo estudo - englobadas no gênero Enterovibrio - representam um terceiro tipo de simbiose, onde os dados genômicos até o momento analisados mostraram que esses microrganismos, além de serem extracelulares, são capazes de se mover para fora do bulbo em direção ao ambiente marinho, porém estão passando por um profundo processo de redução genômica. Em outras palavras, é uma relação simbiótica envolvendo uma bactéria extracelular em transição evolutiva marcada por massiva redução genômica. Realizando uma análise comparativa, os genomas dessas bactérias bioluminescentes são 50% reduzidos - para cerca de 2,6 Mb - comparados com seus parentes evolutivos de vida livre dentro do gênero Enterovibrio - cerca de 5-5,5 Mb. As perdas englobaram a maior parte dos genes associados com a síntese de aminoácidos e com a quebra metabólica de nutrientes que não sejam a glicose, sugerindo que o peixe está suprindo esses nutrientes para seus parceiros procariontes.

É possível, portanto, que essas bactérias estejam seguindo um caminho em direção ao terceiro tipo de relação simbiótica anteriormente descrito. Nesse cenário, estamos testemunhando como uma rara relação simbiótica extracelular obrigatória - envolvendo massiva redução genômica - é formada.

Por outro lado, as bactérias retiveram, por algum motivo ao longo dessas dezenas de milhões de anos de co-evolução com os peixes, alguns genes que são úteis para uma vida na água marinha fora dos bulbos hospedeiros. Elas conseguem expressar, por exemplo, flagelos e uma cauda especial usados para o nado. Ao mesmo tempo, houve perda da maioria dos genes envolvidos com o sistema sensorial de pistas químicas do ambiente importantes para a busca de alimentos e outros compostos úteis, apesar de alguns terem sido conservados.

Como os peixes ceratioides colocam ovos próximos da superfície oceânica - longe dos adultos - e as larvas crescem de forma independente, pode ser que essas bactérias precisem persistir no ambiente até colonizarem novos hospedeiros em crescimento, especialmente considerando que os órgãos luminosos se desenvolvem gradualmente até ficarem completos na fase adulta.

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As reduções genômicas observadas parecem ter sido mediadas pela proliferação de transposons (3). Os elementos transponíveis no genoma dessas bactérias simbiontes respondendo por 28-31% das sequências codificantes. A proliferação dos transposons pode facilitar o processo de redução genômica via inserção e disrupção dentro de genes alvos desses elementos. Esses elementos são, então, eventualmente perdidos dos genomas via deleção. A expansão genômica associada aos transposons parece ter ocorrido em diferentes épocas em cada linhagem simbiótica do gênero Enterovibrio, o que pode indicar processos independentes de redução genômica entre as diferentes bactérias.

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(3) Leitura recomendada: Como nova informação genética é gerada durante o processo evolutivo?
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O extremo alto número de enzimas transposases remanescentes observado nas duas espécies de simbiontes analisados reforça que o processo de redução genômica ainda está ocorrendo nessas linhagens.


Publicação do estudo: mBio

Flagrada transição evolutiva caracterizando um novo tipo de simbiose Flagrada transição evolutiva caracterizando um novo tipo de simbiose Reviewed by Saber Atualizado on maio 01, 2019 Rating: 5

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