Essa vespa macho usa sua genitália para ferroar predadores; primeira descrição de genitália masculina de um animal usada como arma
Vespas e abelhas fêmeas possuem ovopositores - órgãos de deposição de ovos - modificados para funcionar como agulhas, injetando veneno durante a picada e causando intensa dor no atacante ou predador. Machos desses insetos, por outro lado, não são peçonhentos e são pensados de não picarem como defesa e, nesse sentido, são considerados inofensivos. Porém, durante testes laboratoriais, pesquisadores Japoneses foram acidentalmente e inesperadamente picados por vespas machos da espécie Anterhynchium gibbifrons. O acidente levou à condução de um estudo experimental comprovando o primeiro caso conhecido no Reino Animal de um animal macho que usa sua genitália como arma de defesa. Os achados foram publicados esta semana no periódico Current Biology (1).
Predadores podem causar pressão seletiva que fomenta a emergência de várias defesas antipredatórias nas presas. Algumas espécies de presas evoluíram estruturas defensivas específicas, enquanto outras simplesmente usam partes do corpo que evoluíram por razões outras que defesa para repelir predadores. Por exemplo, várias espécies de animais possuem fortes dentes caninos ou mandíbulas para matar presas e contra-atacar seus inimigos. Abelhas e vespas (ordem Hymenoptera) usam seus ovipositores como ferrões para repelir atacantes, incluindo humanos. Ferroadas desses insetos com injeção de veneno podem causar intensa dor e reações alérgicas na nossa espécie. Ao mesmo tempo, esses insetos também evoluíram padrões específicos de cor no corpo que alertam atacantes e predadores sobre o perigo associado às suas ferroadas.
Machos de abelhas e de vespas, os quais não possuem ovopositores, são pensados inofensivos, e imitam os padrões de cor e de comportamento das fêmeas para afugentar predadores. Vespas machos nas famílias Tiphiidae, Sphecidae, Mutillidae, Scoliidae e Vespidae (Eumeninae) possuem espinhas paramerais (pseudo-ferrões) na genitália ou ponta abdominal que permitem a realização do comportamento de "ferroada", este o qual é considerado uma estratégia antipredatória, apesar da falta de evidência científica de suporte.
No novo estudo, pesquisadores da Universidade de Kobe, Japão, resolveram explorar a capacidade de ferroar de vespas machos da espécie A. gibbifrons após dolorosas ferroadas acidentais em laboratório. Eles mostraram que os machos as duas estruturas espinhosas na genitália para realizar o comportamento de "ferroar", mas ao contrário das fêmeas, essas estruturas não mostraram liberar veneno. No entanto, ficou evidente em testes experimentais que a ferroada dos machos causa significativa dor. Ao mesmo tempo, os machos de A. gibbifrons não foram observados ferindo as fêmeas com esses 'ferrões' durante o acasalamento ou ao serem rejeitados - pelo menos não em condições laboratoriais. Esses achados iniciais apontaram que os pseudo-ferrões dos machos serve como um mecanismo de defesa contra predadores.
Nesse sentido, na segunda parte do estudo, os pesquisadores usaram pererecas da espécie Dryophytes japonica (17 indivíduos, comprimento corporal de 30,0-36,4 cm) como modelo de predação contra machos de A. gibbifrons (17 indivíduos, comprimento corporal de 15,8-19,7 mm) sob condições laboratoriais. Durante os experimentos, todas as pererecas atacaram e tentaram engolir as vespas machos (Fig.2D). Porém, 35,3% das pererecas ultimamente rejeitaram as vespas, após investidas das vespas usando a mandíbula e as estruturas genitais para morder e ferroar os anfíbios atacantes (Fig.2E). Para determinar se os pseudo-ferrões na genitália tinha significativo impacto na defesa das vespas machos, os pesquisadores removeram essas estruturas de outras 17 vespas, e colocaram essas últimas junto com pererecas. Nesse último cenário, nenhuma vespa foi rejeitada pelas pererecas; apenas morder a boca desses anfíbios não foi suficiente para detê-los.
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| Fig.2. Em (A), vespa macho de A. gibbifrons se alimentado de néctar na flor da espécie Cayratia japonica. (B) Pseudo-ferrões (espinhas paramerais; setas pretas) e edeago (seta vermelha) de um A. gibbifrons macho; edeago é um órgão reprodutor de artrópodes machos através do qual eles secretam esperma dos testículos durante a cópula com uma fêmea (equivalente em certa extensão ao pênis de vertebrados). (C) O ferrão (seta) de um A. gibbifrons fêmea. (D) Vespa macho ferroando e mordendo uma perereca D. japonica. (E) Uma perereca cuspindo [rejeitando] uma vespa macho. Sugiura & Tsujii, 2022 |
> No vídeo abaixo, é possível observar o comportamento de defesa de uma vespa macho (A. gibbifrons) ao ser atacada por uma perereca (D. japonica):
Durante experimentos similares com vespas fêmeas de A. gibbifrons, a taxa de rejeição das pererecas era muito maior (quase 90% dos ataques) - e frequentemente esses anfíbios as ignoravam -, reforçando que as fêmeas desses insetos possuem defesas muito mais efetivas com o uso de ferrão com veneno.
Estudos prévios investigando as funções ecológicas e evolução da genitália masculina têm focado nas interações coespecíficas entre machos e fêmeas. Apenas alguns poucos estudos têm demonstrado funções defensivas da genitália masculina; por exemplo, machos de várias espécies de mariposas da família Sphingidae produzem ultrassom através da genitália para prejudicar o sonar de morcegos insetívoros. O novo estudo é o primeiro a demonstrar o uso da genitália masculino como uma arma de ataque contra predadores, e é provável que várias espécies de vespas que possuem pseudo-ferrões (ex.: famílias Mutillidae e Eumeninae) associados à genitália masculina também exibam o mesmo mecanismo de defesa.
REFERÊNCIA CIENTÍFICA
- (1) Sugiura & Tsujii (2022). Male wasp genitalia as an anti-predator defense. Current Biology, Volume 32, Issue 24, PR1336-R1337. https://doi.org/10.1016/j.cub.2022.11.030
Reviewed by Saber Atualizado
on
dezembro 20, 2022
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