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Mamíferos, incluindo humanos, podem usar o intestino para respirar e isso pode salvar vidas

 

Em um inesperado estudo publicado hoje no periódico Med (1), pesquisadores demonstraram que porcos e ratos são capazes de absorverem oxigênio molecular (gás oxigênio, O2) através do intestino, uma habilidade antes observada apenas em organismos aquáticos e em invertebrados terrestres. Além disso, os pesquisadores mostraram que a injeção de gás oxigênio e de líquido altamente oxigenado pelo ânus desses animais fornece substancial aporte de oxigênio para a circulação sanguínea, descoberta essa que pode revolucionar a prática clínica, especialmente no cenário da atual pandemia do novo coronavírus (SARS-CoV-2).


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Melhora da hipóxia (ausência de oxigênio suficiente nos tecidos para manter as funções corporais) é o mais importante elemento para amenizar quadros de falha respiratória. Notavelmente, várias espécies não-mamíferas evoluíram para se adaptar e sobreviver sob ambientes hipóxicos (pobres em oxigênio gasoso) ao estabelecer mecanismos acessórios de respiração em órgãos além dos pulmões e das guelras. Por exemplo, o peixe dojô (Misgumus anguillicandatus), peixes coridoras (família Corydoradinae), pepinos-do-mar (classe Holothuroidea) e aranhas da espécie Tetragnatha praedonia são todos animais que usam a parte posterior do intestino para a respiração. 



Nesse sentido, fica sugerido que, através de ancestralidade comum, outros grupos de animais podem ter conservado essa habilidade, incluindo mamíferos. Estudos nas décadas de 1950 e de 1960 explorando essa questão em humanos e outros animais geraram resultados questionáveis sobre as capacidades de respiração do trato digestivo nos mamíferos principalmente através de órgãos gastrointestinais superiores, ou seja, ainda deixando pouco investigado o intestino.


O reto de mamíferos representa uma cavidade corporal coberta por uma camada mucosa relativamente fina, particularmente ao redor do canal anal, na qual drenagem vascular abundante é feita possível através de plexos hemorroidais conectados ambos com as circulações portal e sistêmica. De fato, administração intra-anal de medicamentos pode ser facilmente realizada, com rápida absorção dos fármacos introduzidos. Devido a tais características anatômicas, fica sugerido que a porção distal do intestino mamário possibilita eficiente acesso luminal aos vasos sanguíneos submucosos para potencial troca gasosa.


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Para testar a hipótese de que mamíferos também são capazes de respirar através do intestino, os pesquisadores no novo estudo testaram vários métodos de ventilação intestinal através do ânus de ratos e de porcos que foram privados brevemente de oxigênio. Em um grupo de 11 ratos, quatro tiveram a parede intestinal raspada para afinar o revestimento mucoso e melhorar a difusão gasosa e a absorção de oxigênio. Esse procedimento foi feito para melhor aproximar o intestino mamário do intestino respiratório de peixes dojôs, onde o intestino posterior é composto por uma camada epitelial muito fina, abundante em vasos capilares e eritrócitos, e o qual permite acesso luminal a oxigênio mesmo em ambientes de extensiva hipóxia.


Em seguida, os pesquisadores injetaram oxigênio (O2) puro e pressurizado no reto dos ratos raspados e quatro dos sete ratos que não foram raspados. Então, os pesquisadores removeram oxigênio do ambiente fechado onde os ratos se encontravam, tornando-os hipóxicos. Os três ratos não-raspados que não receberam oxigênio intestinal sobreviveram por uma média de 11 minutos. Ratos com intestinos não-raspados que receberam oxigênio através do ânus persistiram vivos por 18 minutos. Apenas os ratos ventilados com intestinos raspados persistiram vivos por pelo menos 50 minutos em condições ambientais  de hipoxia normalmente letais, e com uma taxa de sobrevivência de 75% ao longo do período experimental.


Para contornar o deletério e perigoso processo de raspagem intestinal, os pesquisadores substituíram o oxigênio pressurizado por perfluorocarbono, um fluído que consegue dissolver grandes quantidade de gás oxigênio e que é inclusive usado como substituto de sangue durante cirurgias. Devido ao fato de serem líquidos muito densos, os perfluorocarbonos também acabam ajudando a remover o muco intestinal. Os pesquisadores, então, injetaram perfluorocarbono altamente oxigenado (borbulhado por um fluxo de 1 L de O2 por minuto por 45 minutos) no ânus de três ratos hipóxicos e de cinco porcos hipóxicos - mas mantidos em um ambiente com níveis baixos mas não-letais de oxigênio.


Enquanto que nos grupo de controle (injeção salina pelo ânus) os níveis de oxigênio caíram de forma substancial, nos ratos que receberam o fluído oxigenado pelo ânus (1 mL para cada) os níveis permaneceram estáveis a normais - e significativamente maiores no coração em relação aos controles -  e foram capazes de andar no ambiente por uma distância 10% maior. Já nos porcos que receberam o fluído oxigenado (400 mL para cada), a saturação de oxigênio aumentou em cerca de 15%, aliviando-os sintomas de hipoxia, incluindo o retorno de cor e de calor para a pele e as extremidades em questão de minutos. Nenhum efeito colateral adverso do procedimento foi observado. Porém, naturalmente é esperado morte no intestino da microbiota anaeróbica durante o procedimento.


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Nos experimentos com clorofluorocarbono oxigenado, a solubilidade de O2 no fluído foi de 50 mL/L. De acordo com os pesquisadores, injeção de 600-1200 mL desse fluído em humanos pode fornecer oxigenação crucial para pacientes com baixa saturação de oxigênio no sangue (ex.: problemas cardiorrespiratórios). Se provado seguro e efetivo para humanos, a técnica de ventilação enteral (intestinal) pode revolucionar o tratamento de pacientes, por exemplo, com COVID-19 necessitando de terapia de oxigênio ou de ventilação. Benefícios se estendem para quadros de ataques bronquiais de asma, estenose aérea, asfixia neonatal e falha aguda respiratória.


Suporte respiratório artificial é fundamental no manejo clínico de falha respiratória devido doenças severas como pneumonia ou síndrome respiratória aguda grave (SRAG). Ventilação mecânica é a técnica de suporte respiratório mais comumente usada. Pulmão artificial, chamado de membrana extracorpórea de oxigenação, é uma alternativa para pacientes em estado crítico, e usado como terapia paliativa temporária. No entanto, além de preocupação para complicações iatrogênicas como lesão pulmonar, sangramento e trombose ventilador-induzidos, a recente pandemia de COVID-19 tem levado ao colapso dos centros hospitalares, incluindo escassez de ventiladores mecânicos. 


O uso de fluídos clorofluorocarbonos oxigenados e injetados pela via anal pode representar mais uma opção de suporte respiratório artificial seguro e muito prático para complementar terapias de oxigênio e técnicas de ventilação já bem estabelecidas, com o potencial de salvar muitas vidas em cenários de sobrecargas hospitalares. Mais estudos são agora necessários para investigar o real potencial clínico da ventilação enteral em humanos.


(1) Publicação do estudo: https://www.cell.com/med/fulltext/S2666-6340(21)00153-7

Mamíferos, incluindo humanos, podem usar o intestino para respirar e isso pode salvar vidas Mamíferos, incluindo humanos, podem usar o intestino para respirar e isso pode salvar vidas Reviewed by Saber Atualizado on maio 14, 2021 Rating: 5

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