Abelhas famintas fazem buracos nas folhas para acelerar a floração das plantas
Em um interessante estudo publicado recentemente na Science (1), pesquisadores mostraram que as abelhas da espécie Bombus terrestris (conhecidas no Brasil também como mamagava-de-cauda-amarela-clara), causam danos intencionais nas folhas de plantas angiospermas para acelerar a produção de flores, um comportamento entre polinizadores antes não conhecido. E o mais curioso: os cientistas não sabem ao certo como elas fazem o truque, porque danos artificiais imitando os danos desferidos pelas abelhas não conseguiram acelerar de forma eficiente a floração.
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Manter uma sincronia fenológica com as flores é um desafio crucial para os animais polinizadores que pode ser exacerbado por mudanças anômalas nas condições ambientais. As abelhas B. terrestris dependem pesadamente da coleta de pólen para o fornecimento de nutrientes essenciais à medida que elas constroem suas colônias de verão. Evidências mostram que a disponibilidade de recursos florais dentro de 1 km das colônias em formação fortemente influenciam a sobrevivência e performance desses empreendimentos sociais. Escassez de recursos durante o período crítico de desenvolvimento inicial da colônia também possuem profundos efeitos no sucesso reprodutivo futuro. Portanto, os cientistas acreditavam que esses insetos tinham que simplesmente tolerar as diferenças de disponibilidade de pólen devido à floração sazonal irregular, através de adaptações específicas e variações de organização social.
No novo estudo, porém, os pesquisadores encontraram que essas abelhas ativamente forçam as plantas a se curvarem para as necessidades das suas colônias. Observações comportamentais em quatro espécies de plantas (Brassica oleracea, B. nigra, Solanum elaeagnifolium, e S. melongena) revelaram que as operárias da B. terrestris usam suas probóscides e mandíbulas para cortar buracos com formas bem distintas nas folhas dessas plantas, com cada evento de dano levando apenas alguns segundos (como mostrado na figura e no vídeo abaixo). No entanto, os pesquisadores não encontraram clara evidência de que essas abelhas estavam se alimentando ativamente das folhas ou transportando material das folhas cortadas de volta para a colmeia.
Através de experimentos comparativos, os pesquisadores demonstraram que os danos infligidos pelas abelhas nas folhas aceleravam a floração de forma mais do que substancial. Na espécie S. lycopersicum (tomate), o tempo médio de antecipação da floração elicitada pelas abelhas era de 30 dias em comparação com plantas da mesma espécie não-danificadas, e podendo alcançar até 33 dias. Na espécie B. nigra (mostarda-negra), o tempo médio de antecipação era de 16 dias. O mais notável é que quando os cientistas tentaram imitar mecanicamente os danos causados pelas abelhas, o tempo médio de floração era diminuído apenas um pouco (5 dias comparado com os 30 dias alcançados pelas abelhas na planta do tomate). Ou seja, as abelhas operárias realizam algum truque especial durante o desferimento dos danos ainda não esclarecido.
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No geral, os pesquisadores concluíram que:
i. As abelhas B. terrestris danificam as folhas de plantas angiospermas de um modo que acelera substancialmente o tempo de floração;
ii. A disponibilidade de pólen influencia esse comportamento, e as colônias enfrentando maior escassez de recursos danificam as plantas com mais avidez e frequência;
iii. O comportamento persiste sob condições semi-naturais onde as abelhas possuem a opção de coletar pólen em campos mais distantes;
iv. Outras espécies de abelhas também foram observadas danificando as folhas de plantas, sugerindo que essa estratégia de "jardinagem" pode ser mais amplamente disseminada entre esses insetos.
As abelhas B. terrestris possuem uma particular sede de recursos florais durante o início do verão, quando as rainhas emergindo da diapausa precisam estabelecer suas colônias. Danificar as folhas quando os recursos florais estão escassos, portanto, pode ser uma estratégia adaptativa para acelerar a produção de flores. De forma recíproca, devido ao fato dos polinizadores serem poderosos agentes da evolução das plantas, o processo pode ser adaptativo para algumas espécies de plantas ao ativamente responder aos danos infligidos pelas abelhas ou a pistas associadas visando mitigar assincronia.
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O novo achado também possui importantes implicações ecológicas em termos de análises do impacto das mudanças ambientais antropogênicas que perturbem as interações entre plantas e polinizadores. Até o momento, sabia-se apenas que estresses causados por doenças ou seca eram capazes de incentivar uma floração mais precoce.
(1) Publicação do estudo: Science
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Abelhas famintas fazem buracos nas folhas para acelerar a floração das plantas
Reviewed by Saber Atualizado
on
maio 25, 2020
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