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Estudo Francês não encontra eficácia no uso de hidroxicloroquina para o tratamento da COVID-19


Com mais de 2 milhões de casos confirmados e quase 131 mil mortes, a pandemia global do novo coronavírus (SARS-CoV-2), está colocando forte pressão em médicos e agências de saúde ao redor do mundo na busca por medicamentos já disponíveis para o tratamento de pacientes com COVID-19 - doença causada pelo SARS-CoV-2 -, especialmente os casos mais graves. Infelizmente, isso fez com que alguns fármacos - ou uma combinação deles - fossem testados a esmo em pacientes diversos mesmo com suporte científico muito limitado, geralmente com base em testes in vitro e evidências anedóticas.

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Para piorar, os presidentes do Brasil e dos EUA - Jair Bolsonaro e Donald Trump - começaram a promover dois medicamentos anti-malárico e de baixíssimo custo de produção como a 'solução milagrosa' contra o SARS-CoV-2: hidroxicloroquina e cloroquina. Ambos os fármacos - usados para o tratamento de malária, artrite reumatoide, lúpus, entre outros - emergiram como uma possível arma contra o SARS-CoV-2 após estudos clínicos in vitro e um controverso estudo Francês sugerirem alta eficácia no tratamento da COVID-19 (1). A principal aposta é na hidroxicloroquina, a qual é bem menos tóxica do que a cloroquina e associada a um maior potencial terapêutico.

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(1) Para mais informações, acesse: Cloroquina e hidroxicloroquina são efetivos contra o novo coronavírus?

No entanto, apesar do atrativo financeiro - gasto minimizado para o governo - e evidências preliminares, não existe sólida evidência científica defendendo o uso da hidroxicloroquina ou da cloroquina para o tratamento de pacientes para o COVID-19. Pelo contrário, as evidências disponíveis até o momento são conflitantes e provenientes de estudos limitados. Dois estudos clínicos  - usando hidroxicloroquina + azitromicina - não encontraram eficácia terapêutica, reportando um aumento de eventos adversos. O controverso estudo Francês mostrou-se totalmente falho após revisão e o próprio periódico de publicação publicou um editorial de retratação. Já um estudo clínico randomizado na China envolvendo 62 pacientes, apesar de encontrar resultados positivos modestos com o uso de hidrocloroquina (400 mg/d por 5 dias), testou o medicamento apenas em pacientes que não estavam em quadro severo da doença, não realizou estratificação para comorbidades e os prognósticos não foram bem definidos, algo que torna o estudo de baixa qualidade - já somado ao pequeno grupo de pacientes. Já um estudo observacional cohort fazendo um paralelo entre a gripe e o COVID-19, inferiu uma teórica falta de eficácia da hidroxicloroquina (2). Até o momento, o uso de hidroxicloroquina ou de cloroquina não pode ser diferenciado de um placebo.

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IMPORTANTE: Reforçando, é a hidroxicloroquina - geralmente associada com o antibiótico azitromicina - que tem demonstrado maior potencial terapêutico (3X mais ação anti-viral in vitro) e sendo mais avaliada em estudos clínicos e administrada nos hospitais. Essa substância é um derivado da cloroquina, possuindo uma hidroxila a mais em sua estrutura molecular. O polêmico estudo Francês e os outros citados avaliaram a hidroxicloroquina.

(2) Para mais informações, acesse: Como o COVID-19 mata? Incerteza traz grave alerta para tratamentos utilizados a esmo
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Para adicionar mais dúvida na eficácia desses medicamentos contra o novo coronavírus, dois estudos mais robustos foram publicados esta semana na bioRxiv - como preprint (ainda sem revisão por pares) - avaliando a eficácia da hidroxicloroquina no tratamento de COVID-19. E os resultados obtidos não deram suporte ao uso desse medicamento para o tratamento da doença e/ou não corroboraram os resultados observados in vitro .

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No primeiro estudo (3), realizado por cientistas Franceses, foram analisados os registros médicos de todos os pacientes hospitalizados entre os dias 17 e 31 de março, em quatro centros terciários de saúde fornecendo tratamento a pacientes com pneumonia associada à COVID-19. Os pesquisadores englobaram na análise pacientes adultos testados positivos para a infecção com SARS-CoV-2 (teste PCR) com idades entre 18 e 80 anos, e que necessitaram de oxigenação via máscara ou via tubos nasais (progressão nível 5).

Para reduzir ao máximo a interferência de co-fatores, os pesquisadores excluíram também os pacientes que i) tinham contra-indicação para o uso de hidroxicloroquina a 600 mg/d (incluindo pacientes sob diálise); ii) tinham iniciado o uso de hidroxicloroquina antes da admissão ao hospital; iii) estavam sendo tratados com outros medicamentos experimentais visando o COVID-19 (tocilizumab, lopinavir-ritonavir, ou remdesivir) dentro de 48 horas após admissão; iv) tinham falhas em órgãos requerendo imediata admissão à UTI ou à unidade de tratamento contínuo; v) tinham síndrome respiratória aguda grave na admissão (implicando em necessidade de ventilação não-invasiva com provisão de pressão aérea positiva ou ventilação mecânica invasiva); vi) tinham sido liberados de uma UTI para um tratamento padrão; vii) tinham decidido limitar e parar terapias ativas feitas na admissão; e viii) tinham se oposto à coleta de dados (ou seus representantes legais tinham se oposto).

Dos pacientes selecionados - total de 181 pacientes -, os pesquisadores compararam duas estratégias de tratamento: iniciação do uso de hidroxicloroquina a uma dose diária de 600 mg nas primeiras 48 horas após hospitalização (grupo HCQ, constituído de 84 pacientes) e a ausência de iniciação do uso de hidroxicloroquina durante esse período de dois dias (grupo de controle, constituído de 97 pacientes). A idade média foi de 60 anos, 71,1% homens. O tempo de acompanhamento dos pacientes foi iniciado na admissão ao hospital até o fim do tratamento, seja resultando em morte, recuperação ou sétimo dia após hospitalização. Fatores como comorbidades prévias (hipertensão, diabetes, obesidade, etc.), idade, medicamentos usados de forma concomitante e variações no tratamento foram levados em conta para as análises estatísticas. Dos pacientes no grupo HCQ, 20% receberam também azitromicina, e 76% receberam concomitantemente amoxicilina e ácido clavulânico.

Os resultados das análises mostraram que 20,5% dos pacientes no grupo HCQ foram transferidos para a UTI - piora do quadro - ou morreram dentro de 7 dias, comparado com 22,1% no grupo de controle. No grupo de controle, 27,7% no grupo HCQ desenvolveram síndrome respiratória aguda grave, comparado com 24,1%  no grupo de controle. Ou seja, estatisticamente, não houve eficácia significativa da hidroxicloroquina - com ou sem azitromicina - no tratamento dos pacientes. Durante os sete dias de tratamento, os pesquisadores também não encontraram significativas reduções na carga viral em comparação com o grupo de controle, e, portanto, não puderam corroborar sugestões prévias de eficácia antiviral desse medicamento.

Entre os 84 pacientes recebendo hidroxicloroquina dentro das primeiras 48 horas, 8 deles experienciaram anormalidades cardíacas que requereram a descontinuação do medicamento após uma média de 4 dias contados do início do tratamento. E um desses pacientes sofrendo com os efeitos colaterais da hidroxicloroquina apresentou um bloqueio atrioventricular de primeiro-grau após 2 dias de tratamento com a hidroxicloroquina.

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No segundo estudo (4), cientistas Chineses buscaram analisar a eficácia e a segurança do uso de hidroxicloroquina (HCQ) + tratamento padrão (SOC) comparado com a aplicação apenas de tratamento padrão (SOC) em pacientes adultos com COVID-19. Para isso, eles examinaram dados médicos obtidos de 19 centros de tratamento na China de 11 até 29 de fevereiro. No total, foram analisados - de forma randomizada - 150 pacientes hospitalizados com COVID-19, 75 incluídos no grupo HCQ + SOC e 75 no grupo SOC (grupo de controle). Os pacientes receberam 1200 mg diárias de hidroxicloroquina no grupo HCQ + SOC nos primeiros três dias seguido de 800 mg/dia para o restante dos dias (duração total do tratamento: 2 ou 3 semanas para pacientes com quadro leve/moderado ou quadro severo, respectivamente).

Os resultados das análises mostraram que a administração de hidroxicloroquina não teve eficácia superior ao tratamento padrão isolado em termos de replicação viral, como vinha sendo amplamente sugerido por estudos in vitro e pelo tão polêmico estudo Francês. Por outro lado,  foi observado um maior alívio nos sintomas daqueles no grupo HCQ + SOC, possivelmente devido aos efeitos anti-inflamatórios do medicamento (apesar disso também poder ser alcançado com o uso de outros anti-inflamatórios, como ibuprofeno, sem necessariamente envolver tratamento efetivo da doença). De fato, foi observado também uma redução significativa de proteína c-reativa (CRP) com o uso de hidroxicloroquina; o CRP é um indicador extremamente sensível de inflamação. Como processos inflamatórios - na forma de uma 'tempestade de citocinas' - são considerados um potencial fator de progressão da doença e de morte nos pacientes com COVID-19, as doses maiores de hidroxicloroquina usadas nos pacientes podem demonstrar algum efeito terapêutico contra a doença.

No grupo HCQ + SOC, eventos adversos atingiram 30% dos pacientes, comparado com apenas 8,8% no grupo SOC. O mais comum evento adverso com o uso de hidroxicloroquina foi diarreia (10%). Anormalidades cardíacas não foram observadas provavelmente devido ao relativo quadro leve/moderado da maior parte dos pacientes analisados.

Os pesquisadores concluíram que o uso clínico de hidroxicloroquina não suprimiu a replicação viral nos pacientes analisados. Mesmo após retirar pacientes do grupo de controle que estavam usando anti-virais comuns, a hidroxicloroquina não expressou ação anti-viral, o que corrobora o estudo Francês acima descrito. Por outro lado, o medicamento demonstrou substancial atividade anti-inflamatória e um relativo bom perfil de segurança. Uma grande limitação do estudo foi não fazer uma comparação entre as taxas de recuperação, mortalidade e agravamento do quadro dos pacientes, o que torna incerta a real eficácia terapêutica da droga no grupo clínico analisado.

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Os dois estudos trazem resultados conflitantes com aqueles observados em estudos in vitro (limitados a culturas celulares), e um deles não encontrou eficácia terapêutica no uso de hidroxicloroquina. Essa nova evidência reforça o alerta para o uso de medicamentos sem sólida evidência científica de suporte, e antes mesmo de estudos in vivo em animais não-humanos, como ratos. Estudos clínicos de alta qualidade, envolvendo grande número de participantes, randomizados e duplo-cegos, são necessários para a recomendação enfática de qualquer estratégia terapêutica.

Recentemente, outra notável promessa de tratamento - combinação dos medicamentos lopinavir e ritonavir -, com excelentes resultados in vitro - , não mostrou valor terapêutico no primeiro grande estudo clínico randomizado e revisado por pares (publicado no The New England Journal of Medicine) englobando pacientes na China (199 participantes) com COVID-19 (5). Em breve, estudos do tipo serão publicados para conclusões mais claras sobre o uso da hidroxicloroquina.


(3) Publicação do estudo: bioRxiv

(4) Publicação do estudo: bioRxiv

(5) Publicação do estudo: NEJM

Estudo Francês não encontra eficácia no uso de hidroxicloroquina para o tratamento da COVID-19 Estudo Francês não encontra eficácia no uso de hidroxicloroquina para o tratamento da COVID-19 Reviewed by Saber Atualizado on abril 15, 2020 Rating: 5

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